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Leia na Fonte: Teletime
[26/02/15]
FCC aprova reclassificação da banda larga nos EUA - por Bruno do Amaral
Como esperado, a agência reguladora norte-americana Federal Communications
Comission (FCC) aprovou nesta quinta-feira, 26, por três votos a dois, a
reclassificação da banda larga como serviço de telecomunicações (em vez de
serviço de informação, como era até então) sob o arcabouço legal da Title II,
que regula os serviços de telecom. Não apenas isso se aplica à Internet fixa,
mas também a conexões móveis, fato que deverá desagradar ainda mais as
operadoras, ainda que a FCC esteja sinalizando com uma flexibilização do Title
II.
Com isso, a comissão consegue uma importante vitória para o presidente Barack
Obama, mas que ainda não deve ser o fim da batalha, já que o Partido
Republicano, apoiado pelos maiores provedores de infraestrutura de Internet dos
Estados Unidos, deverá tentar barrar a medida na Justiça.
O resultado na reunião desta quinta era esperado porque três dos cinco
conselheiros da FCC são democratas, incluindo o próprio chairman da entidade,
Tom Wheeler, que encerrou o debate comparando a reclassificação da banda larga
com o direito à liberdade de expressão garantido na primeira emenda da
constituição norte-americana. "A Internet é importante demais para ser deixada
sem regras e sem um juiz no campo. A Internet é muito importante para deixar que
os provedores de banda larga sejam os que ditam as regras", declarou.
Wheeler contou com o apoio não apenas dos colegas democratas, mas também da
opinião pública. Ele destacou as 4 milhões de contribuições submetidas durante o
período de consulta pública da agência. "Esses 4 milhões de comentários ilustram
a importância de uma rede aberta e irrestrita, e o papel da Internet de ser
núcleo de expressão livre e de princípios democráticos", afirmou.
O chairman destacou ainda que, na prática, a reclassificação e a garantia de
neutralidade não deverão mudar o mercado. "O fluxo de receita de ISPs será o
mesmo amanhã em relação ao que era ontem. Nada do que façamos hoje muda a
equação de receita de consumidores", argumentou ele. Houve pouca argumentação a
respeito da troca de tráfego, justamente o ponto de polêmica entre a Netflix e
os provedores de Internet no ano passado. Mas o diretor da FCC garantiu: "A
Internet deve continuar aberta, tanto na última milha como na interconexão".
Apoio
A conselheira Mignon Clyburn ressaltou a importância da inclusão da banda larga
móvel na regulação. "Usuários de mobile não devem ser relegados a uma Internet
de segunda categoria, muitos com baixa renda precisam e merecem uma experiência
robusta comparável a da fixa", disse. "O item contém regras claras e fortes para
que todo conteúdo, aplicação e todo bit sejam tratados da mesma forma." A
conselheira Jessica Rosenworcel apoiou também, ressaltando que a abertura da
Internet permitiu aos EUA uma economia online, incluindo a de aplicativos,
"invejada pelo mundo".
Os democratas conseguiram apoio amplo para rebater as críticas. Entre os
convidados estavam a produtora executiva da série The Killing, Veena Sud. Ela
argumentou que a rede norte-americana AMC atuou como gatekeeper e cancelou o
programa na TV mesmo com uma demanda do público, mas o serviço de streaming
over-the-top (OTT) Netflix resgatou a série e exibiu os capítulos finais (bem
como as demais temporadas). "Por causa da Open Internet, podemos ver como ela
aumenta a competição", declarou. Considerado o "pai da World Wide Web", Tim
Berners-Lee também argumentou a favor. "Não tive que pedir permissão a ninguém,
não tive de pagar taxas especiais aos ISPs e nem precisei convencer ninguém de
que a novidade (a WWW) deveria ser usada", disse, por meio de videoconferência.
Oposição
O discurso passional de Tom Wheeler foi precedido de severas críticas. Um dos
opositores, o conselheiro da FCC Ajit Pai, já avisou: "Se (a ação da comissão)
sobreviver a brigas judiciais e passar no Congresso, teremos grandes preços,
menores velocidades, menos implantação, menos inovação e menos opções para
consumidor." Para o republicano, a nova regulação "não é apenas uma solução em
busca de problema, é uma solução do governo que cria um problema no mundo real",
alegando interesses políticos de Obama e seus aliados com o assunto. Ele cita
uma reportagem do The Wall Street Journal que afirmara que a construção da
regulação não teria sido transparente, mas realizada a portas fechadas na Casa
Branca.
Pai alegou que a Title II não é uma regulação leve e dá margem a interferências
em preços no futuro, incluindo a implantação de uma taxa de universalização na
banda larga da mesma forma como já existe na telefonia nos EUA. Ele chegou a
pleitear um adiamento, dizendo não haver necessidade de resolver a questão no
momento porque "não há crise imediata". Na visão dele, situações de priorização
paga e estrangulamento de tráfego não têm evidências de que sejam ameaças
contínuas. "Não há evidências; são anedotas, hipóteses e histeria."
Outro opositor republicano, o conselheiro Michael O'Reily, corroborou ao chamar
a decisão da FCC de "captura monumental e ilegal de poder", dizendo que a
comissão estaria abdicando do papel de agência especializada ao reclassificar o
serviço. "A Title II é sobre regulação de preço, seria ingenuidade acreditar que
a imposição de uma regra fundamentalmente sobre preço não introduziria risco",
alegou.
Reação
Também como era de se esperar, a votação da FCC causou mal estar na indústria.
Uma das quatro maiores operadoras norte-americanas, a Verizon, reagiu com ironia
e postou em seu blog de política regulatória uma crítica ao que chama de "regras
dos anos 1930", colocando uma imagem em código Morse com um link para a
tradução. A empresa diz que a história irá julgar as ações da comissão como
"desvirtuadas". O comunicado, emitido em um PDF com um design de fonte como uma
máquina de escrever antiga, é datada de 26 de fevereiro. "A movimentação da FCC
é especialmente imperdoável porque é totalmente desnecessária", alega.
A associação de operadoras móveis CTIA afirmou que "a decisão de neutralidade de
rede da FCC foi desapontadora e desnecessária: consumidores pelos EUA têm - e
sempre terão - acesso a uma Internet móvel aberta". Ela alega que a agência
ignorou as diferenças técnicas entre redes móveis e fixas, bem como o
ecossistema de competição. "A Title II desnecessariamente coloca em risco o
futuro do 5G na nossa nação e a promessa de uma vida mais conectada." A
associação reforça o argumento de que a decisão foi ilegal e que vai resultar em
incerteza econômica e legal no setor, mas não confirma se tentará barrar a
reclassificação na justiça.
O quarto maior provedor de cabo dos Estados Unidos, a Charter, declarou apoio à
neutralidade de rede, mas alegou que as regras "vão adicionar taxas às contas
dos clientes, criar incerteza regulatórias e levarão a anos de litígio que,
juntos, vão diminuir o progresso e o desenvolvimento de uma banda larga mais
rápida para nossos assinantes". O ISP diz ainda que a regulação da Title II é
datada e genérica, e que irá "trabalhar com o Congresso para passar uma nova lei
de Internet aberta que proteja consumidores e proporcione certeza para
investidores e liberdade para os inovadores".
Por outro lado, há algumas companhias de Internet que enxergaram com bons olhos,
como a operadora over-the-top Vonage, que declarou apoio para as regras.
"Aplaudimos a FCC e o chairman Wheeler por adotar novas regras de neutralidade
de rede que vão garantir que a Internet permaneça uma plataforma aberta e
desinibida para todos", diz o comunicado. Por sua vez, o departamento legal do
setor privado e público da associação da indústria de TI (CompTIA), a
TechAmerica, aplaudiu a decisão da agência, mas alegou ter "algumas preocupação
com o caminho que a FCC tem tomado para chegar a essas novas regras", declarando
que as regras serão estabelecidas agora em tribunais, o que levará "três ou
quatro anos".