1a Parte - Capítulo V
OS CRIMES DO PCB

3. "Elza Fernandes"

Desde menina, Elvira Cupelo Colônio acostumara-se a ver, em sua casa, os numerosos amigos de seu irmão, Luiz Cupelo Colônio. Nas. reuniões de comunistas, fascinava-se com os discursos e com a linguagem complexa daqueles que diziam ser a salvação do Brasil. Em especial, admirava aquele que parecia ser o chefe e que, de vez em. quando, lançava-lhe olhares gulosos, devorando o seu corpo de adolescente. Era o próprio secretário-geral do PCB, Antonio Maciel Bonfim, o "Miranda".

Em 1934, então com 16 anos, Elvira Cupelo tomou-se a amante de Miranda e passou a ser conhecida, no Partido, como "Elza Fernandes" ou, simplesmente, a "garota". Para Luiz Cupelo ter sua irmã como amante do secretário-geral era uma "honra". Quando ela saiu de casa e foi morar com o amante, Cupelo viu que a chance de subir no Partido havia aumentado.

Entretanto, o fracasso da Intentona, com as prisões e os d6cumentos apreendidos, fizeram com que os comunistas ficassem acuados e isolados em seus próprios "aparelhos". Nos primeiros dias de janeiro de 1936, Miranda e Elza foram presos em sua residência, na Av. Paulo de Frontin, 606, Apt. 11, no Rio de Janeiro. Mantidos separados e incomunicáveis, a polícia logo concluiu que a "garota" pouco ou nada poderia acrescentar aos depoimentos de "Miranda" e ao volumoso arquivo apreendido no apartamento do casal. Acrescendo os fatos de ser menor de idade e não poder ser processada, Elza foi liberada. À saída, conversou com seu amante que lhe disse para ficar na casa de seu amigo, Francisco Furtado Meireles, em Pedra de Guaratiba, subúrbio do Rio de Janeiro. Recebeu, também, da polícia, autorização para visitá-lo, o que fez por duas vezes.

Em 15 de janeiro, Honório de Freitas Guimarães, um dos dirigentes do PCB, ao telefonar para "Miranda" surpreendeu-se ao ouvir, do outro lado do aparelho, uma voz estranha. Nesse momento, o Partido soubera que Miranda havia caído. Alguns dias depois, a prisão de outros dirigentes aumentou o pânico.

Segundo o PCB, havia um traidor. E o maior suspeito era "Miranda". As investigações do "Tribunal Vermelho" começaram.

Honório descobriu que Elza estava hospedada na casa do Meireles, em Pedra de Guaratiba. Soube, também, que ela estava de posse de um bilhete, assinado por "Miranda no qual ele pedia aos amigos que auxiliassem a "garota". Na visão estreita do PCB, o bilhete era forjado pela polícia, com quem Elza estaria colaborando. As suspeitas transferiram-se de"Miranda" para a "garota".

Reuniu-se o "Tribunal Vermelho", composto por Honório de Freitas Guimarães, Lauro Reginaldo da Rocha, Adelino Deycola dos Santos e José Lage Morales. Prestes, escondido em sua casa da rua Honório, no Méier, já havia decidido pela eliminação sumária da acusada. O "Tribunal" seguiu o parecer do chefe e a "garota" foi condenada à morte.

Não houve, porém, a desejada unanimidade: Morales, com dúvidas, opôs-se à condenação, fazendo com que os demais dirigentes vacilassem em cumprir a sentença. Honório, em 18 de fevereiro, escreveu a Prestes, relatando que o delator poderia ser, na verdade, o "Miranda". A reação do "Cavaleiro da Esperança" foi imediata. No dia seguinte escreveu uma carta aos membros do "Tribunal", tachando-os de medrosos e exigindo o cumprimento da sentença.

Os trechos dessa carta de Prestes, a seguir transcritos, constituem-se num exemplo candente da frieza e da cínica determinação com que os comunistas jogam com a vida humana:

"Fui dolorosamente surpreendido pela falta de resolução e vacilação de vocês. Assim não se pode dirigir o Partido do Proletariado, da classe revolucionária".
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"Por que modificar a decisão a respeito da "garota"? Há ou não há traição por arte dela? É ou não é ela perigosíssima ao Partido...?" ........................................................................................................................
"Com plena consciência de minha responsabilidade, desde os primeiros instantes tenho dado a vocês minha opinião quanto ao que fazer com ela. em minha casta de 16, sou categórico e nada mais tenho a acrescentar..."
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"Uma tal linguagem não é digna dos chefes de nosso Partido, por que é a linguagem dos medrosos, incapazes de uma decisão, temerosos ante a a responsabilidade. Ou bem que vocês concordam com medidas extremas, e neste caso, já as deviam ter resolutamente posto em prática, ou então discordam mas não defendem como devem ter tal opinião".

Ante tal intimação e reprimenda, acabaram-se as dúvidas. Lauro Reginaldo da Rocha, um dos "tribunos vermelhos", respondeu a Prestes: "Agora, não tenha cuidado que a coisa será feita direitinho, pois a questão do sentimentalismo não existe por aqui. Acima de tudo colcoamos os interesses do P."

Decidida a execução, Elza foi levada, por Eduardo Ribeiro Xavier, para uma casa da Rua Mauá Bastos, n9 48-A na 'Estrada do Camboatá, onde já se encontravam Honório de Freitas Guimarães, Adelino Deycola dos Santos, Francisco Natividade Lira e Manoel Severino Cavalcanti. Ela, que gostava dos serviços caseiros, foi fazer café. Ao retornar, Honório pediu-lhe que "sentasse a seu lado. Era o sinal convencionado. Os outros quatro comunistas adentraram à sala e Lira passou-lhe uma corda de 50cm pelo pescoço, iniciando o estrangulamento. Os demais seguravam a "garota" que, mesmo jovem, tentava. salvar-se. Poucos minutos depois, com os pés junto à cabeça, o corpo de Elza fo enfiado num saco e enterrado nos fundos da casa. Perpetrara-se o hediondo crime, em nome do Partido Comunista.

Logo após este fato, em 5 de março, Prestes foi preso em esconderijo no Méier. Ironicamente, iria passar pelas mesmas angústias quando sua mulher, Olga Benário, foi deportada para a a Alemanha nazista.

Alguns anos depois, em 194O, Luiz Cupelo Colônio, o mesmo que auxiliara o secretário-geral na tentativa de assassinato do "Dino Padeiro", participou da exumação do cadáver de sua irmã. O bilhete que escreveu a "Miranda, o amante de Elza, retrata alguém que, na própria dor, percebeu a virulência comunista:

"Rio, 17-4-40
Meu caro Bonfim
Acabo de assistir à exemação do cadáver de minha irmã Elvira.
Reconheci ainda a sua dentadura e seus cabelos. Soube também da confissão que elementos de responsabilidade do PCB fizeram na polícia de que havaim assassinado minha irmã Elvira.

Diante disso, renego meu passado revolucionário e encero as minhas atividades comunistas.
Do teu sempre amigo
Luiz Cupelo Colônio
".