2a Parte - Capítulo I
AS DIVERGÊNCIAS DO MOVIMENTO COMUNISTA

4. O V Congresso do PCB

As denúncias do sistema do culto à personalidade e dos crimes do "camarada" Stalin, feitas no XX Congresso do PCUS, acarretaram a paralisação do PCB. A sua direção nacional buscou adiar o quanto pôde a discussão em torno desses fatos.

Em julho de 1956, houve uma Conferência Nacional do Partido, a V, mas o assunto simplesmente não foi abordado. Segundo Peralva, o PCB "estava atordoado e não sabia ou não podia discutir um tema, para o qual não existiam ainda as muletas d projeto de frase feita e das fórmulas consagradas. Porque era a isso, a um repetidor de frases feitas, que se havia reduzido o antigo Cavaleiro da Esperança" (2).

Em agosto, é realizada uma reunião do CC, na qual a direção do Partido é duramente criticada, mas a discussão envolvendo o PCB como um todo ou o fulcro do problema continuou, na prática, proibida. O crítico mais contundente fora Agildo Barata. Desde o inicio dessa reunião, constatou-se que as divergências com o trabalho de direção do Partido eram irreconciliáveis.

Em fins de setembro, é convocada uma nova reunião do CC, onde, muito mais nítidas do que o rumo que o PCR tomaria, começam a delinear-se correntes, que iriam, dali para frente, digladiar-se pelo poder.

Em novembro, a Comissão Executiva, através da "Carta Aberta" de Luiz Carlos Prestes aos Comunistas", que se tornou conhecida como "carta-rolha", estabeleceu o fim da discussão. Estavam proibidos, entre outras coisas, "quaisquer ataques a União Soviética e ao Partido Comunista da União Soviética".

Eram cada vez mais nítidas as tendências dentro do partido: de um lado, Agildo Barata e boa parte dos intelectuais, desejando que fosse feita uma autocrítica radical, exigindo mesmo o afastamento dos membros da direção partidária; de outro lado, a maioria da Comissão Executiva, extremamente comprometida com o "status quo", resistindo às mudanças a qualquer preço. Havia, ainda, os conciliadores, que, num primeiro momento, reforçam a "esquerda" para derrotar a'"direita" e, uma vez liquidada esta, dão o golpe de misericórdia naquela.

Vinhas assim retrata essa situação e a posição do secretário-geral do Partido: "A crise política aparece, assim, como crise de direção. A posição de Prestes não foi unívoca nem retilínea. Inicialmente perplexo e sem saber o que fazer, foi sendo aos poucos ganho para a autocrítica".

A seguir, Agildo Barata é afastado do PCB e com ele saem inúmeros militantes, inclusive Bruzzi Mendonça, o seu único deputado federal.

Prestes, saindo da clandestinidade a que se impusera com o auxílio do núcleo dirigente, depois de 10 anos, em agosto de 1957, comparece à reunião do CC. Nessa reunião, são destituídos da Executiva: Arruda Câmara, João Amazonas, Sérgio Holmos e Maurício Grabois. É aprovada uma resolução contra a "atividade antipartidária de Agildo Barata" e seu grupo e nomeada uma comissão que deveria preparar um documento analisando os reflexos do XX Congresso do PCUS no PCB, o qual deveria ser discutido na plenária marcada para março de 1958.

Esse documento, entretanto, nasceu morto. Na reunião de março de 1958, o CC não o Coloca nem na ordem do dia e aprova outro documento, que ficou conhecido como a "Declaração de Março". Essa declaração representou, na realidade, um ponto de inflexão na linha política do PCB, modificando as resoluções do IV Congresso e aprovando a tese da coexistência pacífica.

Delinearam-se os grupos. De um lado, Prestes comandava o I CC, de acordo com a nova linha de Kruschev. Do outro, Diógenes Arruda, João Amazonas, Maurício Grabois, Pedro Pomar e outros, ainda stalinistas, defendiam as resoluções do IV Congresso e, nas divergências sino-soviéticas, posicionavam-se pró-China.

Em setembro de 1960, em pleno centro do Rio de Janeiro, usufruindo de uma situação de "legalidade de fato"" o PCB realizou o seu V Congresso Nacional. A "Resolução Política" aprovada nesse Congresso foi estabelecida tendo por base a concepção do XX Congresso do PCUS.

Para o "novo" PCB, no País não havia mais "condições para transformações socialistas imediatas e a "atual etapa histórica" não exigia soluções radicais. Era viável a obtenção de continuas reformas econômicas e políticas, que poderiam ser alcançadas através da luta de massas e da política de frente única. O caráter da revolução brasileira era "nacional-democrático" e deveria ser buscada uma sólida aliança entre o proletariado e o campesinato. As tendências dogmáticas e sectárias teriam que ser combatidas e a luta ideológica intensificada. O caminho da revolução seria "pacífico", sem que, entretanto, fosse absolutizado. A luta armada foi colocada em segundo plano e nao mais considerada como um "princípio".

O Congresso aprovou um novo Estatuto e deveriam ser tomadas providências jurídicas a fim de legalizar o Partido: Foi eleito um novo CC e ,os principais stalinistas, como Diógenes Arruda, João Amazonas, Maurício Grabois e Orlando Pioto, foram afastados. Esta corrente, entretanto, ainda continuava representada no CC através de Pedro Pomar, Ângelo Arroio, Carlos Danielli. e Henrique Cordeiro Oest, eleitos suplentes. Dos sete membros da comissão Executiva, dois deles, Mário Alves e Carlos Marighela, trariam, no futuro, novas divergências ideológicas.


(2) Peralva, O.: " O Retrato" E. Itatiaia Ltda, BII., 1960, pág 255.