3ª Parte - Capítulo I
1964

6. A prorrogação do mandato presidencial

Na fase inicial e repressiva da Revolução, Castelo já dera provas de sua habilidade como mediador. Apesar de compreender que todo processo revolucionário pressupunha medidas de natureza repressiva transformadas em atos políticos, desejava reduzi-las ao mínimo, sempre com rigorosa apuração de responsabilidades. Não queria que a Revolução fosse utilizada como instrumento de vinganças e de perseguições, e zelou pessoalmente por isso. Como repisaria em sua derradeira mensagem ao Congresso relativa à suspensão dos direitos políticos, "em muito poucos processos revolucionários agiu-se com a justeza e a moderação do movimento de março de 1964".

Entendendo que a Revolução deveria institucionalizar na Constituição, no Ato Constitucional e nas leis, Castelo Branco procurou estabelecer uma base política que desse sustentação ao seu plano de governo. Inopinadamente, porém, tudo ruiu com a cassação de Juscelino e a retirada do apoio de seus correligionários ao bloco parlamentar do Governo, que congregava mais de 250 parlamentares.

Já havia, por parte dos revolucionários, um consenso em torno da exiguidade do mandato presidencial. O programa de estabilização econômica exigia mais do que o ano e meio que lhe restava do período anterior e não teria logrado seus objetivos na época da eleição presidencial. A quebra da base parlamentar acentuou o problema, dificultando a aprovação de medidas indispensáveis a seu curso normal. O "Jornal do Brasil", de 20, de maio de 1964, assim afirmava em seu editorial:
"Não queiramos perder a Revolução pela incapacidade de consolidá-la. A matéria-prima dessa consolidação chama-se tempo... Se quisermos ser suficientemente realistas e sensatos, transferindo o pleito para 3 de outubro de 1966, obteremos muito mais do que a coincidência de mandatos."

As maiores resistências à prorrogação, entretanto, partiam do próprio Presidente da República e de alguns setores das hostes revolucionárias, como Carlos Lacerda, que via, no adiamento das eleições e no critério de maioria absoluta proposto pelo Governo, ameaças às suas pretensões pessoais à Presidência.

Ante à relutância de Castelo, o "Jornal do Brasil" voltou a comentar:
"Por isso, nunca entendemos a atitude do Presidente Castelo Branco que, no fundo mistura o seu dever de chefe de uma revolução, com os seus escrúpulos de cidadão, colocando-se contra a prorrogação ou coincidência de mandatos".

No final de julho, o Congresso aprovou a emenda constitucional que prorrogava o mandato até 15 de março de 1967, marcando, ao mesmo tempo, a eleição presidencial para novembro de 1966.

Essa medida, decorrente de uma subemenda montada no· Congresso à emenda que previa a maioria absoluta para a eleição do Presidente da República, foi aprovada com o voto de todos os partidos. A subemenda traduzia indisfarçável aspiração das correntes revolucionárias que a tinham como indispensável para a consolidação do movimento revolucionário.

Castelo, praticamente, foi obrigado a conformar-se. Quem não o fez, porém, foi o Governador Carlos Lacerda, que, se julgando prejudicado, abriu campanha contra o Governo revolucionário. Surgia, dessa forma, uma primeira oposição definida e atuante nas próprias hostes revolucionárias. Receptiva a essa pregação estariam setores que sofreram restrições impostas pela necessidade de contenção da anarquia e da desordem nas relações sociais e na economia.