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20/07/09

• 1ª Confecom (19) - Outro comentário de José Smolka: Novo marco regulatório... E nós com isso? [2]

----- Original Message -----
From: J. R. Smolka
To: wirelessbr ; Celld-group
Sent: Sunday, July 19, 2009 10:43 PM
Subject: [Celld-group] Novo marco regulatório... E nós com isso? [2]


Boa noite pessoal,

O Hélio costuma comentar sobre o "estrondoso silêncio" que alguns temas costumam provocar. E esta questão do novo marco regulatório, IMHO, é um destes casos.

Vou assumir que o silêncio, após minha provocação sobre a possibilidade dos nossos grupos desenvolverem uma discussão mais ampla sobre este tema, é sinal de que, pelo menos, não existe rejeição geral à idéia, e existe alguma curiosidade latente, que eventualmente pode vira a tornar-se participação efetiva. Veremos.

Mantendo coerência com a posição que assumi no post anterior, vou oferecer ao debate de vocês os meus comentários sobre os 14 pontos do novo marco regulatório que o Márcio Patusco elencou. As citações do post do Márcio estão em vermelho, e meus comentários em preto. Andiamo subito...

O novo marco regulatório deverá :

1. Ser um único arcabouço de leis para a área de comunicações, que englobe telecomunicações, radiodifusão, tv por assinatura e produção e distribuição de conteúdo em qualquer tipo de mídia;

Tenho uma séria objeção aqui. Concordo que devemos perseguir uma legislação única para telecomunicações, englobando aí tudo: telefonia fixa e móvel, transmissão de dados, satélites, TV aberta e por assinatura - cabo e DTH, rádio, trunking, MMDS... esqueci alguém? Mas não vejo como os assuntos de comunicações escritas (jornais e revistas) e produção audiovisual (cinema, DVDs, etc.) possam ser tratados na mesma lei básica.

Eu enxergo como possível (talvez desejável), um conjunto de três leis básicas: uma para regular redes e meios de transmissão em geral; outra para regular a forma de prestação dos serviços; e uma terceira para definir os aspectos de produção de conteúdo.

Se isto desagrada aos defensores do status quo, paciência. Cara feia pra mim é fome.

2. Conter regras para prestação de serviços julgados de interesse pela sociedade. Estas regras deverão conter requisitos de universalização, desempenho, qualidade, continuidade e tarifas. A relevância da existência de novos serviços públicos deverá ser colocada, bem como discutida a forma de obtenção das licenças dos atuais e dos novos serviços;

No meu modo de ver, isto seria parte do objeto da segunda lei que mencionei no item (1). Sobre licenciamento falarei no próximo item.

3. Estabelecer claramente as funções e obrigações dos órgãos reguladores e sua relação com o Executivo e o Legislativo. Questões de soberania nacional e de propriedade dos meios de comunicação;

Estes aspectos estariam divididos entre a primeira e a segunda leis mencionadas no item (1). Mas, como o ente regulador estaria envolvido tanto nos aspectos de rede como nos aspectos de serviços (e, muito provavelmentee, não teria nada a ver com os aspectos de produção de conteúdo), é possível que a sua caracterização seja mais bem feita em um diploma legal separado dos outros três.

Fundamental, no meu ponto de vista, é definir claramente a separação entre o que é função de estado (e, portanto, pertinente ao ente regulador) e o que é função de governo (e exercido pelo Ministério competente). Bem como estabelecer mecanismos claros que impeçam o "aparelhamento" político do ente regulador, seja lá qual for a ideologia do governo em exercício.

Havendo confiança no julgamento estritamente técnico e legal do ente regulador, não vejo porque todos (não estou dizendo alguns, ou quase todos... estou dizendo TODOS) os processos de concessão de licenças, outorgas ou seja lá qual for o termo legal adequado a cada situação, sejam tratados como atos administrativos inerentes ao ente regulador. Esta é uma área onde, historicamente, a presença do Poder Legislativo causou mais mal do que bem.

Por fim, até hoje não vi nenhum argumentação, que eu achasse convincente, baseada em argumentos de soberania nacional. Para mim eles apenas formam o raciocínio simétrico das argumentações baseadas em argumentos de segurança nacional, tão valorizados à época do regime militar.

4. Estabelecer formas de atuação dos órgãos reguladores que permitam supervisionar os parâmetros de competição nos diversos segmentos de interesse, promovendo assimetria regulatória pelo controle do poder de mercado significativo por algum provedor de serviço ou rede;

Acho "assimetria regulatória" um termo perigoso, porque está muito próximo de "dois pesos e duas medidas". Só que com sinal invertido em relação ao que normalmente se reclama hoje em dia. Não acredito que a melhor forma de corrigir injustiças históricas seja impor ações opostas sob a denominação de "ações afirmativas".

Acredito em regras claras que valem para todos. Entre elas as regras que dizem como deve ser punido quem abusar indevidamente de sua posição dominante no mercado para prejudicar a concorrência legítima. O que eu não acredito é em punição prévia, via "assimetria regulatória", para aqueles cuja maior criatividade, eficiência e/ou competência técnica e comercial (usadas de forma legítima) os tenha colocado em destaque no mercado.

5. Estabelecer formas de acompanhamento dos provedores de serviço ou rede em suas relações bilaterais quanto às interconexões e interoperabilidades. Os aspectos de segurança, qualidade e desempenho merecem atenção especial;

Assunto para a primeira (no caso das redes) e segunda (no caso dos serviços) leis propostas no item (1).

6. Estabelecer responsabilidades quanto à emissão sistematizada de normas e padrões nacionais a serem cumpridos nas diversas modalidades de serviços e capacitações de redes. Criar mecanismos de visibilidade de índices que possam ser controlados pelos próprios usuários;

Isto é, IMHO, atribuição inalienável do ente regulador.

7. Estabelecer regras de abertura de redes que criem um ambiente propício ao desenvolvimento nacional de aplicações e novos serviços, que facilitem a utilização de capacitações de um provedor de serviço pelo outro. Estabelecer a remuneração de redes adequada a cada caso;

Opa... Aqui temos um claro caso de mistura de unbundling de redes e serviços, que é assunto das duas primeiras leis do item (1), com fomento da indústria nacional, que é atribuição de governo, via política industrial.

8. Estabelecer regras para a prestação de serviços de conteúdo ao usuário final. Produção nacional independente, cotas de programação nacional. Formas de distribuição e empacotamento. Regionalização de programação;

Assunto da terceira lei proposta no item (1). Só acho que aqui - assim como no tal PL 29 - tem que existir cuidado com a tal "assimetria", ou com pura e simples xenofobia movida por preconceitos ideológicos.

9. Estabelecer regras de controle social sobre os veículos de informação. Limites de ingerência versus questões de segurança. Liberdade de expressão e direitos de reposta;

Interessante... Isto me parece muito com a discussão sobre se precisamos ou não (eu acho que não) de uma nova Lei de Imprensa.

10. Estabelecer caminhos por onde o cidadão comum possa exercer defesa e controle de seus interesses em reclamações contra os provedores de serviços e redes. Criar e divulgar sistemática com auxílio dos Procons e Ministério Público;

Para mim isto é claramente atribuição do ente regulador. Nosso novo marco regulatório deve gerar, também, uma minuta do regimento interno e do regulamento do ente regulador? Eu não trataria disto aqui e agora.

11. Estabelecer formas de atuação conjunta com outras áreas (ciência e tecnologia, industrial, educação, etc) no sentido de desenvolver políticas industriais e de pesquisa e desenvolvimento que fomentem a competência nacional na área, com possibilidade de utilização do Fistel;

Como já disse antes, isto não é marco regulatório. É política industrial, que é atribuição natural de governo, e naturalmente flutuante conforme a alternância no poder traga esta ou aquela corrente ideológica ao comando do Executivo.

12. Atribuir responsabilidades e dar efetividade ao cumprimento de normas e padrões nacionais. Criar mecanismos de aferição bem conhecidos por todos os envolvidos e aplicar penalidades ao seu não cumprimento;

Para mim as responsabilidades são claras: pertencem ao ente regulador. Mas não existe como definir, via marco regulatório, a obrigatoriedade disto tudo ser efetivo. Só a execução fiel dos diversos textos legais trará, no devido tempo, a confiança que o espírito do modelo será preservado, independente das alternâncias normais da política. Já aconteceu com a política de estabilidade econômica após o plano Real. Porque não poderia acontecer de novo no contexto telecom?

13. Criar formas de envolver provedores de serviço, fabricantes, órgãos governamentais, academia, institutos de pesquisa na definição dos caminhos de evolução das redes e serviços , sem interferir nas decisões tecnológicas de cada provedor;

Novamente temos uma mistura - indevida, a meu ver - entre marco regulatório e política industrial.

14. Estabelecer um mecanismo de revisão e atualização periódica da própria regulamentação de modo a acomodar os ciclos tecnológicos e os anseios da sociedade.

Este é um assunto complicado. Precisamos cuidar que aspectos fundamentais do espírito do novo marco regulatório não possam ser desvirtuados com facilidade (algo parecido com as cláusulas pétreas que existem na Constituição Federal de 1988), sem podar a liberdade de futuros governantes e/ou legisladores proporem modificações, dentro do processo legislativo normal.

Ufa... Por enquanto é isso. Continuo provocando vocês: opiniões a respeito?

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J. R. Smolka
 


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