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Fevereiro 2010               Índice Geral do BLOCO

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18/02/10

• José Smolka e Rubens Alves comentam o "post": "Regulamento "denorex" do backhaul" + Resposta de Flávia Lefèvre

de J. R. Smolka <smolka@terra.com.br>
para wirelessbr <wirelessbr@yahoogrupos.com.br>, Celld-group <Celld-group@yahoogrupos.com.br>
data 18 de fevereiro de 2010 02:21
assunto [wireless.br] Ainda o backhaul

Pessoal,

Queria apresentar a minha resposta para a pergunta colocada no final da mensagem da Flávia Lefévre repassada pelo Hélio. A pergunta foi:

"Será que esse backhaul privado não é a rede de troncos prevista no art. 207, da LGT, cujo contrato de concessão não ocorreu até hoje e que as concessionárias se apropriaram na mão grande, com anuência da ANATEL e do MINICOM?"

A resposta tem que ser feita por etapas. Até onde eu sei, inicialmente a tal "rede de troncos" só tinha um operador: a Embratel. Esta terminologia trai o viés dos redatores em ver o conjunto da infra-estrutura de transmissão (o que chamaríamos hoje de backhaul + backbone) como um apêndice do STFC. Com o passar do tempo, ainda durante o período de controle estatal, as operadoras estaduais começaram a construir suas próprias "redes de troncos" de âmbito estadual, e passaram a competir com a Embratel dentro deste escopo limitado.

Ocorre que, quando da promulgação da LGT, todas estas "redes de troncos" já tinham uma fatia significativa da sua capacidade alocada para o atendimento a serviços que não tinham nada a ver com o STFC. Exemplos significativos: interconexão dos nós de comutação de pacotes X.25 e Frame-Relay (RENPAC, BAHIAPAC, MINASPAC, etcPAC), distribuição de sinal de TV para afiliadas das grandes redes de broadcasting, circuitos ponto a ponto para transmissão de dados de alta capacidade (naquele tempo isto significava, geralmente, canais E1 a 2 Mbps) e entroncamento dos roteadores que formaram o núcleo inicial da Internet no Brasil.

Ou seja, já naquela época não dava para dizer que a "rede de troncos", ou backhaul, ou que nome queira-se dar a ela, fosse exclusiva para atendimento ao STFC, e já não dava para etiquetar os MUXes PDH e SDH e os enlaces de rádio e de fibra ótica, identificando-os: "este aqui é do STFC"; "este aqui não". Portanto esta não é uma questão nova! Apenas agora, quando apareceram outros serviços para competir com e, insh'Allah, um dia ofuscar o STFC, esta questão tornou-se crítica - pelo menos para aqueles (entre os quais eu não me incluo) que acreditam que o "patrimônio público" esteja sob ameaça.

Minha opinião é que, enquanto esta visão patrimonialista for dominante, e enquanto não se tenha uma definição decente do que seja o STFC (a atual - e a antiga também - expressa no parágrafo 1° do art. 1 do PGO é uma tautologia) o problema da reversibilidade do backhaul não terá solução satisfatória.

Seguindo adiante com a resposta à pergunta, quem disse (exceto o Rogério Gonçalves) que o art. 207 da LGT "prevê" a continuidade do "serviço de troncos"? Eu não sou advogado nem jurista, mas para mim a letra e o espírito do caput e do parágrafo primeiro do art. 207 da LGT são claríssimos. Vejamos (novamente...) o texto da lei:

Art. 207. No prazo máximo de sessenta dias a contar da publicação desta Lei, as atuais prestadoras do serviço telefônico fixo comutado destinado ao uso do público em geral, inclusive as referidas no art. 187 desta Lei, bem como do serviço dos troncos e suas conexões internacionais, deverão pleitear a celebração de contrato de concessão, que será efetivada em até vinte e quatro meses a contar da publicação desta Lei.

§ 1° A concessão, cujo objeto será determinado em função do plano geral de outorgas, será feita a título gratuito, com termo final fixado para o dia 31 de dezembro de 2005, assegurado o direito à prorrogação única por vinte anos, a título oneroso, desde que observado o disposto no Título II do Livro III desta Lei.

Os grifos são meus. O que eu entendo do que leio aqui? Entendo que:

a) Todas as operadoras do antigo Sistema Telebrás que prestavam o STFC ao público em geral tiveram que assinar novos contratos de concessão, em substituição aos temos de concessão válidos antes da promulgação da LGT;

b) O redator preocupou-se em abranger tanto as operadoras do STFC quanto as empresas do sistema Telebrás, listadas no art. 187. Isto eu até entendo, uma vez que haviam empresas (como a CRT do Rio Grande do Sul) onde o controle acionário não era da Telebrás. O que eu não entendo é a menção às prestadoras do serviço de troncos, porque, até onde eu sei, não havia nenhuma destas operadoras que já não estivesse abrangida pelas duas categorias anteriores. Para mim esta redundância era totalmente desnecessária;

c) O parágrafo primeiro é taxativo em definir que o objeto da nova concessão tinha que estar em conformidade com o PGO.

E o PGO (tanto o antigo como o novo) não faz nenhuma previsão para um "serviço de troncos". Portanto não existe "previsão" alguma amparada no art. 207 da LGT. O que existe é a obrigação das operadoras enquadrarem seus contratos de concessão aos objetos possíveis dentro da moldura do PGO, e este define (nos incisos I, II e III do parágrafo 2° do art. 1°) três modalidades para a prestação do STFC: local (origem e destino dentro da mesma área de registro - AR), longa distância nacional (LDN, origem e destino em ARs distintas) e longa distância internacional (LDI, origem em uma AR e destino no exterior).

É interessante notar que não houve incoerência, porque o art. 207 da LGT obrigava que as operadoras pleiteassem a celebração do novo contrato de concessão no prazo de 60 dias, mas deu prazo de até 2 anos para que o contrato fosse efetivado. Isto deu tempo para a elaboração e promulgação do PGO, que tinha que orientar o objeto dos novos contratos de concessão mas ainda não existia no momento da promulgação da LGT.

Com a sequência acelerada dos eventos de 1998, o status quo ante da prestação do STFC foi alterado: as operadoras resultantes da privatização ganharam a concessão de operar o STFC nas três modalidades dentro das respectivas regiões, definidas pelo art. 4°, seus parágrafos e pelos anexos I e II do PGO antigo. Não sei se a Embratel ganhou a concessão da modalidade local neste momento ou se isto foi posterior.

E, com esta liberação - necessária para que, logo após, fosse possível que os assinantes do STFC pudessem optar pelo prestador das modalidades LDN e LDI via código de seleção de prestadora (CSP) - veio também a necessidade que cada operadora integrasse, ampliasse e modernizasse as estruturas de transmissão (vá lá, os backhauls) herdados das operadoras estaduais do velho sistema Telebrás. Assim sendo, onde foi que, precisamente, houve "apropriação na mão grande" por parte das concessionárias?

Só que esta integração, ampliação e modernização não foi (nem podia ser) feita para atender apenas à demanda do STFC. Os serviços ditos "periféricos" são, hoje em dia, os que mais exigem expansão da capacidade e modernização tecnológica do backhaul e do backbone das redes de transmissão. As operadoras móveis do mundo todo tem sentido isto de forma muito aguda com a explosão do consumo de dados nas redes 3G HSxPA, e esta é uma situação que veio para ficar, e vai piorar com o passar do tempo. Se ainda houver por aí alguém com o sonho que seja possível segregar os recursos de transmissão usados no suporte do STFC e no suporte de outros serviços (ex.: acesso de banda larga à Internet), esqueça. Ain't gonna happen. Não é uma questão de gosto ou ideologia, é a realidade técnica e do negócio. Não faz sentido ser de outra forma. Mas, infelizmente, ainda há quem creia que, se houver "vontade política" suficiente, é possível obter a quadratura do círculo e revogar a lei da gravidade. Curioso, mas a maioria das pessoas que eu encontro e que pensam desta forma tendem a achar que o ângulo reto ferve a 90 graus :-) .

Vou me repetir. Enquanto ficarmos presos a uma visão patrimonialista e a definições tautológicas de serviço não vamos conseguir avanço real na questão de como garantir que os serviços (todos eles, não apenas o STFC) sejam prestados aos assinantes por tarifas módicas, com qualidade e de forma universal.

[ ]'s

J. R. Smolka

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de Rubens <rublst@mandic.com.br>
para wirelessbr@yahoogrupos.com.br
data 18 de fevereiro de 2010 06:38
assunto RE: [wireless.br] Ainda o backhaul

...
JR| Vou me repetir. Enquanto ficarmos presos a uma visão
| patrimonialista e a definições tautológicas de serviço
| não vamos conseguir avanço real na questão de como
| garantir que os serviços (todos eles, não apenas o STFC)
| sejam prestados aos assinantes por tarifas módicas, com
| qualidade e de forma universal.

Simplesmente SENSACIONAL o seu texto, JR!!!

Mesmo sem tanto conhecimento do processo, é exatamente essa a sensação que eu tenho hoje: que a visão patrimonialista de alguns (ao meu ver, arcaica e dissassociada da realidade) está nos levando a uma perda de tempo com discussoes etéreas, e servindo apenas para atrapalhar a necessária evolucao dos servicos.

Que consumidor estaria realmente preocupado com quem é dono do que (para que porta-vozes se arvorem no direito de usar expressoes como "a sociedade está farta..."?).
O único interesse real do consumidor é ter os serviços funcionando e a preço justo. Toda esta discussao sobre quem é dono do backhaul sequer interessa ao consumidor, e soa mais como uma mera disputa politica e ideologica, sem qualquer compromisso com a qualidade do serviço.

Ao menos essa é a sensação que eu tenho.

[ ] Rubens Alves

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de flavialefevre <flavialefevre@yahoo.com.br>
para wirelessbr@yahoogrupos.com.br
data 18 de fevereiro de 2010 12:30
assunto Re: [wireless.br] Ainda o backhaul

Prezados Rubens e Smolka

Respeito as interpretações legais e opiniões de vocês sobre como conduzir políticas públicas de telecomunicações.

Gostaria apenas de comentar o seguinte, Rubens:

"Que consumidor estaria realmente preocupado com quem é
dono do que (para que porta-vozes se arvorem no direito
de usar expressoes como "a sociedade está farta..."?).
O único interesse real do consumidor é ter os serviços
funcionando e a preço justo. Toda esta discussao sobre
quem é dono do backhaul sequer interessa ao consumidor,
e soa mais como uma mera disputa politica e ideologica,
sem qualquer compromisso com a qualidade do serviço".

Eu sou consumidora e, apesar de ter dinheiro para pagar as contas, estou preocupada com o subsídio cruzado que empurra os cidadãos mais pobres para a telefonia móvel, operada no sistema pré-pago, que tem a segunda tarifa maior do planeta e, consequentemente, um dos menores tráfegos de voz (segundo pesquisa da Merril Lynch, só o Marrocos fala menos no celular do que o Brasil).

Gostaria ainda de esclarecer que não há nem um resquício de ideologia no meu trabalho relativo a alteração das metas de universalização. Apenas o compromisso de mais de 10 anos com a defesa do consumidor de serviços públicos (atuo também intensamente no setor de energia elétrica).

E, como cidadã brasileira, tenho preocupações patrimonialistas, aí sim, pois as redes ora em questão foram implantadas com recursos públicos e devem estar a favor do interesse público e não exploradas exclusivamente em favor das concessionárias, responsáveis hoje, junto com a ANATEL e MINICOM, pela concentração do mercado em suas mãos e pelas tarifas abusivas que pagamos e que afastam milhões de cidadãos da condição de consumidores.

É nisso que acredito e é por isso que tenho atuado. Aliás, essa não é uma disputa pessoal. Há dezenas de associações civis engajadas com esse entendimento que, aliás, foi acolhido pelo Poder Judiciário, a ponto de a ANATEL e concessionárias virem-se obrigadas a reincluir a cláusula da reversibilidade do backhaul nos aditivos aos contratos de concessão.

Viva a diversidade e obrigada pelos comentários!

Abraço a todos.

Flávia Lefèvre Guimarães


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