WirelessBRASIL - Bloco TECNOLOGIA

Fevereiro 2012             


10/02/12

• "J'Accuse" - Prossegue o debate entre Rubens e Smolka

de J. R. Smolka smolka@terra.com.br por yahoogrupos.com.br
para wirelessbr@yahoogrupos.com.br
data 9 de fevereiro de 2012

Obs:
Sobre uma mensagem anterior (cor vermelha), Rubens escreveu (em azul) e Smolka responde (cor preta):

Em inglês este tipo de raciocínio é chamado hindsight. Algo como "olhando para trás", ou "olhando em retrospectiva". O que é sempre muito mais cômodo. Como se costuma dizer, o papel mais fácil é o do auditor, que chega depois da batalha terminada para enfiar a baioneta nos sobreviventes.

Em parte... em uma empresa que trabalhei havia um lema "o passado é imprevisível" exatamente para alertar de como um evento pode ser lido de muitas maneiras diferente.

Sem dúvida que sim. O ponto fundamental do meu raciocínio é que é sempre simples apontar, do ponto de vista presente, quais opções erradas foram adotadas no passado, as quais conduziram a uma situação presente muito diferente da originalmente projetada/desejada.
 
Claro que o objetivo da privatização do então Sistema Telebrás era arrecadar o máximo para o Tesouro. Se você for vender um patrimônio seu (um carro, ou uma casa, por exemplo) você não vai tomar medidas para maximizar a sua arrecadação? E existia um modelo, que na época parecia sensato, de promover a competição pela outorga de licenças "espelho" e "espelhinhos" do STFC (em regime privado?). Dessa época, se não me falha a memória, a única sobrevivente foi a GVT.

O governo não é uma pessoa física, ele representa os interesses dos cidadãos do país. Ele deveria ter utilizado o modelo que gerasse melhor resultado para o país, não especificamente para seus cofres.


Decididamente não é pessoa física. O Código Civil é definitivo ao definir a União, os Estados, os Municípios o Distrito Federal e os territórios (se houverem) como pessoas jurídicas de domínio público.

E o que faz o governo em qualquer destas esferas? Executa um projeto político, cuja legitimidade deriva da eleição dos seus proponentes, e que, supostamente, tem como alvo o maior benefício possível para a população. Na época da privatização do sistema Telebrás o plano político que era perseguido no nível do governo federal era de procurar transformar a União em um Estado quase-mínimo (digo isso porque não se radicalizou o suficiente nesta área), com regulação dos mercados onde o governo saísse da posição monopolista ou significativa.

Isto implicava na alienação de ativos da União que não fossem compatíveis com as responsabilidades básicas do Estado. Entre estes ativos estava o Sistema Telebrás. Ao executar esta decisão política, o objetivo fundamental não é apenas vender os ativos, mas vendê-los bem, de forma a render o máximo possível de recursos para aplicação nas áreas que são inegavelmente responsabilidade do Estado.

Então, ao final, acaba sendo o mesmo objetivo de uma pessoa física ao alienar ativos. No es lo mismo, pero es igual  :-)

E, claro, sempre se pode fazer análises destes planos políticos na base do hindsight. Como as discussões aqui nos grupos evidenciam, existe muita gente que acha que aquele plano político estava errado, e deveria ser revertido. Eu, respeitosamente, discordo deles. O que vejo de erro naquele plano foi não ter sido radical o suficiente.
 
Taí um bom case para os acadêmicos de administração: a GVT sobreviveu e cresceu por suas próprias virtudes ou por inépcia da BrT em aplicar os mesmos mecanismos "passivos agressivos" usados pela Telefónica e pela Oi? Ela é apenas um acaso feliz ou a prova que o famigerado PMS pode, sim, ser enfrentado e vencido?

Ela o fez porque não apostou exclusivamente numa tecnologia que depois se mostrou inviável economicamente, o WLL. A Vésper, espelho nas regiões I e III, teve que manter sua fé em WLL devido à presença da Qualcomm, inicialmente como acionista significativo e depois como controlador, enquanto a GVT acreditou em prestar serviços com a tecnologia que estivesse à mão e atendesse o cliente.

Minha avaliação pessoal é que a Vésper naufragou por dois motivos principais: um é o que você mencionou. Amarrou-se à tecnologia WLL, sem nem mesmo a possibilidade de uso do enlace para chamadas de dados - o que até poderia ocorrer se os enlaces fossem progredidos para o CDMA2000 1xRTT e EV-DO. O segundo, que em parte explica o primeiro, foi a avaliação (errada) de que seria possível sustentar a operação totalmente na suposta demanda reprimida da telefonia fixa. Esta demanda reprimida acabou preferindo a solução do celular pré-pago, e a Vésper foi para o buraco.

A GVT, obviamente, seguiu outro caminho. Mas meu ponto não é esse. A própria sobrevivência e expansão da GVT prova, no meu entender, que o PMS não é determinante para o sucesso ou o insucesso dos concorrentes. Se, por acaso, a Vésper não tivesse sido tão infeliz nas suas escolhas de negócio, então hoje estaríamos discutindo outras coisas. IMHO, a postura regulatória adequada seria no sentido de propiciar o nascimento e o desenvolvimento de "espelhos" e "espelhinhos", e não ficar colocando amarras nas operadoras com PMS e ficar esperando que, assim, a concorrência se manifeste e desenvolva. Wishful thinking.
 
Se a implantação da GVT aqui na Bahia servir de exemplo geral, então é muito interessante notar que ela entrou no mercado construindo rede de acesso própria, sem depender de unbundling da Oi. Ainda, usando como exemplo o meu caso particular, mudei de provedor de STFC e de banda larga fixa para a GVT não por falta de qualidade da rede da Oi. isso nunca foi problema, pelo menos para mim. Mudei para uma empresa que oferece qualidade de rede similar ou melhor, que aparentemente tem menos tumulto administrativo interno (que se reflete no atendimento, no billing, etc.), por um preço mais agressivo. E estou satisfeito.

É uma pena que o unbundling não tenha permitido à GVT fazer isso em mais cidades e em mais bairros.

Este não é o ponto. O importante é que ela demonstrou que concorrência efetiva com as operadoras com PMS é possível, mesmo sem unbundling. Então, talvez o melhor caminho para gerar competitividade seja facilitar e estimular quem queira criar sua própria rede de acesso, em vez de ficar esperando pelo unbundling.
 
Para o SCM creio que minha exposição do caso GVT serve de contra-exemplo da sua afirmativa. Para o SMP o buraco e beeem, bem mais embaixo.

A GVT só está presente em algumas poucas capitais. E de fato eu me pensei apenas no SCM.

Ela está apenas em algumas capitais porque esse é o caminho natural de expansão da rede. Se houvesse estímulo e facilidade para a criação de rede de acesso então ela poderia se expandir mais rápido. E, eventualmente, outras empresas poderiam entrar no jogo.
 
Acho que, aqui, vale comentar sobre uma percepção generalizada, que também é estimulada pela mídia (especializada ou não). O argumento básico é mais ou menos assim: "se em São Paulo, ou Rio, ou Brasília, está esta m****, então imagine só como deve ser no resto do Brasil".

Esses lugares estão ótimos nos bairros onde há competição. Se a antiga Telerj e a antiga Telesp não conseguem atender a velocidade prometida, os clientes contratam NET... meu  condomínio tem 82 unidades e ZERO assinantes de Speedy, mesmo a Telefônica tendo uma vez instalado um Speedy Condomínio com cabeamento em todas as unidades.

Primeiro: você confirmou a tese inicial - nada como uma boa concorrência. Segundo: você não objetou nem contestou sobre o viés de observação do mercado que eu mencionei.

Agora a questão da banda larga móvel... Esta sim, começa pela burrice de marketing das operadoras em anunciar uma velocidade que não tem como ser consistentemente experimentada pelo usuário, a menos que ele fique sempre em locais pouco carregados da rede. Não é má vontade, não é maquiavelismo. É física. E não dá para revogar as leis da física por decreto.


No SMP a distância entre o marketing e as leis de Maxwell e Nyquist é brutal, o produto "acesso banda-larga de x Mbps" nem deveria existir. No máximo um pacote "normal" e um "rápido".

Pois é. Só que qualquer um que tenha um neurônio e meio entende que o que ocorreu foi uma tremenda "ca**da" de marketing. Isto pode ser resolvido de duas formas: (a) punam-se, eventualmente, as operadoras SMP por induzirem os assinantes a crer em algo que não pode ser cumprido, ajustem-se as denominações das ofertas ao que é realisticamente possível de ser entregue, e vamos em frente (aprendendo com os erros para não cometê-los novamente no futuro); ou (b) manter a postura intransigente que "o código de defesa do consumidor obriga..." e agora não quero nem saber, vão ter que cumprir com o que anunciaram custe o que custar, e pouco me importa se isso vier a ter reflexos sobre a continuidade e/ou a qualidade da prestação do serviço SMP para os assinantes.

Aqui em Salvador temos um bom exemplo de como a interpretação literal da Lei, sem considerar as implicações sociais, pode gerar um resultado final que não agrada a ninguém.

Provavelmente a visão idílica que todo mundo tem das praias nordestinas é: mar quentinho e barracas com mesinhas, servido bebidas e petiscos à beira d'água (e, na maré alta, até mesmo dentro d'água :-) ). E Salvador não era exceção. Só que, com a evolução do gosto dos clientes, as barracas de praia começaram a organizar-se para oferecer serviços de melhor qualidade, com chuveiros de água doce, banheiros, cozinhas melhor organizadas e higiênicas, etc.

Como as reformas eram bancadas, em grande parte, pelas cervejarias (que ganhavam o direito de padronizar as barracas com suas cores e logotipo). Isto ouriçou certas pessoas, que enxergam no capitalismo o "granse satã" laico. E eles fizeram representações ao MP alegando problemas ecológicos (por causa dos banheiros) e, principalmente, invasão da faixa de domínio da União (que tem 33 metros, contados da linha média da preamar de 1831). O juiz não quis saber de nenhuma espécie de ajuste, e mandou demolir sumariamente todas as barracas de praia da orla de Salvador. A lei foi cumprida à risca. Mas o que a União ganhou com isso? E os barraqueiros, com certeza, tiveram que arcar com o prejuízo. A orla de Salvador já tem 3 anos que parece uma favela. E frequentar a praia voltou ao estado que era há 30 anos atrás. Qual a vantagem? Para mim foi um espetáulo de ideologia, intransigência e purismo legal sem sentido.

E, para terminar, porque as regras de qualidade devem ser impostas somente sobre as operadoras STFC e SMP? Os usuários de acesso em banda larga via rádio, ou de provedores fixos condominiais, por exemplo, não terão direito a saber nada sobre a qualidade da rede que os atende? Porque o tratamento de "brocoterapia" (v. dicionário de baianês: brocar, v.i., bater, dar porrada...) só se aplica às operadoras? Só por causa da percepção generalizada de que "elas tem dinheiro, podem pagar"? Isto não é regulação. É preconceito.


Não operadoras STFC, são sobre SCM de 50 mil assinantes ou mais. A NET e a Cabo Telecom de Natal operam redes HFC e vem de antigas operações SCMa (atual SeAC). Vários mecanismos de gestão de competitividade em mercados se aplicam apenas aos maiores players, esse não é diferente.

Pois é... esta inovação começou, inclusive, na discussão do SeAC. No item 4.2.3.7 da Análise 870/2011 da Anatel é apresentada uma tabela das operadoras atingidas pelo limite de 50.000 assinantes proposto para o RGQ-SCM. Só os suspeitos de praxe, com a inclusão (para efeito) da Cabo Telecom. Minha suspeita é que, caso algum dos players desejados tivesse ficado de fora, então o número seria ajustado de acordo, até obter-se o efeito desejado.

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J. R. Smolka