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Leia na Fonte: Teletime
[20/11/13]  Nota técnica da Câmara diz que neutralidade pode encarecer serviços - por Helton Posseti [Íntegra da Nota]

Na semana em que o Marco Civil da Internet foi novamente adiado, surge mais uma voz a comentar o projeto. Trata-se da consultoria legislativa da Câmara dos Deputados, um órgão técnico responsável por subsidiar o trabalho dos parlamentares, sem vínculo com nenhuma posição partidária ou de bancada. Em nota técnica, o consultor legislativo Claudio Nazareno ratifica um dos principais argumentos das teles e dos opositores ao substitutivo do deputado Alessandro Molon (PT-RJ). Segundo a análise do consultor legislativo, uma rede neutra que atenda a todos os serviços com a mesma velocidade será "mais cara ou de pior qualidade para os usuários".

O consultor explica que fez uma análise "desapaixonada" do substitutivo e concluiu que o projeto deveria permitir o gerenciamento justo e razoável da rede. Para ele, é preciso que se coíba abusos como a degradação do tráfego de serviços de VoIP pelos provedores que também atuam no mercado de telefonia, por exemplo, mas a neutralidade absoluta inviabilizaria modelos de negócios que trazem benefícios para o usuário, segundo essa análise técnica.

Para exemplificar, ele cita os pacotes de banda larga móvel que dão acesso gratuito ao Facebook, que estariam proibidos caso seja aprovado o relatório do deputado Molon. "Mais importante que falar em neutralidade absoluta é falar em critérios justos e razoáveis", diz ele.

Para o consultor, para que o acesso à Internet não se torne uma espécie de TV por assinatura (em que o cliente paga por canais adicionais), como argumentam aqueles que defendem o projeto como está e criticam a posição das teles, é preciso haver regras de transparência e competição. Conhecendo exatamente as características dos planos, os consumidores poderão optar, por exemplo, entre um plano com limites provavelmente mais barato e um plano sem limites, argumenta ele.

Em relação à guarda dos registros de conexão, ele comenta o pedido das teles – que segundo recentes declarações de Molon, deverá ser atendido – para que lhes seja permitido guardar os registros de aplicações, de modo a igualar o tratamento dado aos provedores de conteúdo. Para o consultor, "o atendimento a essa demanda pode se revelar prejudicial, por oferecer aos provedores de acesso todas as informações de navegação do internauta".

A nota técnica foi produzida com base no antigo relatório de Molon, por isso não trata dos novos temas que foram incluídos como a guarda de dados no Brasil. Mas como já se falava na possibilidade desse assunto ser tratado pelo projeto, Claudio Nazareno observa que a guarda dos dados no Brasil não impede que eles sejam replicados no exterior e, por isso, a medida é inócua em relação à espionagem, embora possa ser benéfica para as empresas de telecom e TI, já que estimula a instalação de data centers no Brasil.

Segundo o consultor, em entrevista a este noticiário, nos próximos dias deve ser publicada uma nova nota técnica analisando o relatório atual de Molon, segundo o qual, a guarda de dados no Brasil poderá ser determinada por decreto e os dados dos brasileiros, independentemente de onde estiverem hospedados, estão sujeitos à legislação brasileira.

 

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Leia na Fonte: Câmara Federal
[Out 2013]  Comentários acerca do Projeto de Lei nº 2.126/11, que “estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil”, o chamado Marco Civil da Internet

Autor: CLAUDIO NAZARENO - Consultor Legislativo da Área XIV - Comunicação Social, Informática, Telecomunicações, Sistema Postal, Ciência e Tecnologia

A - DA TRAMITAÇÃO

A matéria institui princípios, garantias, direitos e deveres para usuários, provedores de serviço e demais agentes envolvidos com o uso da Internet. É conhecida na imprensa como Marco Civil da Internet.

A proposição principal encaminhada pelo Poder Executivo possui 37 projetos apensos, entre os quais o 5.403/01, do Senado Federal.

A Comissão Especial instituída em 26/09/11 encarregada de apreciar a matéria realizou diversos seminários e Audiências Públicas regionais, sem, contudo, votar o parecer do relator, Deputado Alessandro Molon. Em 12/09/13, o Poder Executivo solicitou urgência para a matéria e, em Plenário, o Substitutivo do relator recebeu 34 emendas.

B – DOS PONTOS POLÊMICOS

Os temas polêmicos para a aprovação do texto dizem respeito a:

1) Neutralidade de redes – de acordo com o Substitutivo, o tráfego não pode ser discriminado em desacordo com as recomendações do Comitê Gestor da Internet no Brasil.

2) Monitoramento dos usuários – os provedores de conexão (empresas de telecomunicações) não poderão bloquear, analisar ou fiscalizar os conteúdos trafegados.

3) Guarda dos registros – a) os provedores de conexão deverão guardar os registros de conexão à internet e lhes é vedada a guarda de dados acerca dos aplicativos acessados pelos internautas, e b) os provedores de aplicação de internet (responsáveis pelos sítios de internet) podem guardar o registro das atividades dos usuários desde que garantida a privacidade dos internautas, e devem guardar os dados quando houver pedido judicial.

4) Guarda dos dados no país – Na versão analisada, o projeto e o Substitutivo não tratam da guarda dos dados de internautas brasileiros no país, isto é não há previsão de obrigatoriedade da existência de datacenter no Brasil.

C – PRINCIPAIS INTERESSES EM JOGO

Há diversos segmentos da sociedade e grupos econômicos que possuem interesses antagônicos com relação aos pontos polêmicos. De maneira resumida, os usuários, as empresas de provimento de banda larga (as operadoras de telecomunicações), as provedoras internacionais de conteúdo (como Facebook e Google), as provedoras nacionais de conteúdo (por exemplo, a Globo) e o governo têm interesses por vezes conflitantes que dificultam a aprovação da matéria.

A neutralidade de redes, à primeira vista, favoreceria os usuários, pois todos os dados trafegariam com a mesma prioridade. No entanto, há diferenças entre os serviços que justificam o seu monitoramento e o tratamento diferenciado dos pacotes (por exemplo, e-mail não precisa do mesmo tratamento dado a um vídeo). Certamente, uma rede neutra que atenda a todos os serviços com a mesma velocidade será mais cara ou senão de pior qualidade. Para os provedores de banda larga, a neutralidade e o não monitoramento implicarão perda de otimização da rede, aumento de custo e impossibilidade de gerar novos negócios, como venda de qualidade de serviço para determinados provedores de internet (por exemplo Netflix). Poderão também implicar a proibição da venda de pacotes de banda larga baseados em franquia de dados, alterando o modelo de negócios hoje praticado pelas operadoras de telecomunicações e, possivelmente, encarecendo os serviços ofertados. Já os provedores de aplicação seriam os mais beneficiados com a neutralidade, pois possibilitaria que seus dados trafegassem de maneira indiscriminada e sem a possibilidade de imposição de “pedágios” ou gargalos gerenciados pelas operadoras de banda larga. Para os provedores nacionais (a Globo, o maior expoente), a neutralidade implica que grandes grupos internacionais (por exemplo, o Google, proprietário do Youtube) não poderiam utilizar-se de seu maior poder econômico para obter vantagens junto à provedoras de banda larga.

Com relação à guarda dos registros, a maior justificativa para o seu regramento seria a garantia da privacidade e intimidade para os usuários. Ao mesmo tempo, porém, reconhecendo o acometimento de crimes e contravenções mediante o uso das redes, o projeto determina que os provedores de banda larga guardem os registros de conexão, a serem fornecidos em caso de ordem judicial, e que os provedores de aplicação guardem os dados dos acessos dos internautas, caso instados por autoridade competente. Dessa maneira, a guarda dos dados é do interesse de usuários, preocupados com a ocorrência de crimes cibernéticos, e do Poder Público, responsável por investigá-los, assim como de detentores de direitos autorais, radiodifusores nacionais ou outros agentes econômicos, que poderiam identificar o indivíduo que “subiu” ou “baixou” conteúdos protegidos, tais como filmes, novelas, músicas, etc. As operadoras de telecomunicações argumentam que o projeto deveria estender a elas o
direito de acesso e armazenamento dos registros de aplicação, sob a alegação de tratamento isonômico em relação aos provedores de aplicação. Para os usuários, no entanto, o atendimento a essa demanda pode se revelar prejudicial, por oferecer aos provedores de acesso todas as informações de navegação do internauta na rede mundial.

O último ponto, a guarda dos dados no país, ganhou importância ao longo de 2013 com as revelações das quebras de sigilo na internet por parte das agências norte-americanas de informação (o chamado caso Snowden). Para o Poder Público, a guarda possibilita às autoridades judiciais o enquadramento mais fácil das empresas de internet às regras da legislação brasileira (são vários os relatos em que empresas como Google e Facebook se negaram a retirar conteúdos do ar sob a alegação de que estes são armazenados no exterior). Apesar de tratar-se de um caso de soberania, do ponto de vista prático, a guarda no país não impede que as informações, mesmo que guardadas no Brasil, possam ser replicadas em outros países, sendo, portanto, ainda passíveis de quebra de sigilo. Para o usuário há ainda o risco dos serviços perderem em qualidade por conta da infraestrutura ineficiente. A guarda no país certamente é benéfica para as empresas de telecomunicações e de informática brasileiras ou instaladas no país, pois gera a necessidade de instalação de datacenters no Brasil.