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Leia na Fonte: O Globo
[07/02/14]
Mudança no Marco Civil agrada operadoras, mas preocupa ativistas da
Web
A mudança no texto do Marco Civil da Internet proposta em dezembro que inclui
garantia de “liberdade de modelos de negócios” agradou as operadoras e abriu
caminho para aprovação na Câmara, mas ativistas da liberdade na Web preocupam-se
com a descaracterização do projeto.
A principal resistência das operadoras referia-se ao princípio da neutralidade
da rede, que prevê que as operadoras de telecomunicações devem tratar todos os
dados de forma igualitária, não podendo haver distinção entre serviços online.
O princípio tem como objetivo impedir que as teles transformem a Internet em
algo parecido com a TV a cabo, oferecendo, por exemplo, um pacote mais barato
somente para acessar emails – sem a possibilidade de acessar quaisquer outros
sites – e outro mais caro para utilização de vídeo e serviços de telefonia (VoIP),
por exemplo, que exigem mais de suas redes.
Ao criticar o projeto, as teles disseram que, sendo o mercado regulado pela
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), não haveria razões para impedir
as prestadoras de oferecer produtos diferenciados, adequados aos diversos perfis
de consumo. Algumas fontes do setor também interpretaram que o texto impedia a
venda de pacotes por diferentes velocidades.
O novo inciso, proposto pelo relator, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), atendeu
à demanda das operadoras para que o texto do Marco Civil da Internet garantisse
a liberdade de negócios. As empresas, representadas pelo Sinditelebrasil, não se
pronunciaram sobre as mudanças no projeto, mas especialistas afirmaram que as
companhias ficaram satisfeitas.
– Sem dúvida, as mudanças abrem caminho para a aprovação do projeto na semana
que vem – disse o advogado especialista em direito digital Renato Opice Blum.
Segundo ele, a inclusão do inciso foi essencial para impedir que a nova lei
desse margem a interpretações que levassem a “impeditivos de negócio”.
Além da diferenciação de pacotes por velocidade, Blum vê a chance de operadoras
passarem a oferecer pacotes específicos dependendo do uso que o cliente fará da
Web.
– Se podem cobrar por fluxo, seria interessante para a operadora cobrar por
conteúdo – disse. – Não limitaria a internet.
Retrocesso?
A avaliação de Blum não é compartilhada por Luiz Moncau, vice-coordenador do
Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ), para quem
a nova versão do projeto é um retrocesso em relação ao original.
– O texto ficou um pouco pior, porque alargou a margem interpretativa sobre o
que é neutralidade – disse. – Um modelo de negócios que eventualmente afete a
neutralidade estaria prestigiado dentro desse princípio (da liberdade
de negócio).
Para o consultor e ativista da liberdade na Web João Carlos Caribé, o fim da
neutralidade da rede seria também o fim da internet como conhecemos hoje. “Para
as operadoras, interessa segmentar a internet, o que para gente significa o fim
da internet”, declarou.
Segundo Caribé, a quebra da neutralidade impedirá a inovação na rede, na medida
em que as operadoras decidiriam quais empresas de conteúdo poderiam ser
acessadas, por meio de parcerias comerciais.
– Não adiantaria mais ter ideias inovadoras, pois não haveria crescimento
orgânico sem dinheiro. As teles gerenciarão o tráfego de forma que só liberarão
o acesso para quem pagar mais – declarou.
Para Moncau, da FGV, essa tendência já está se desenhando, como mostram as
parcerias que as operadoras brasileiras têm firmado com redes sociais, como
Facebook e Twitter, que permitem acesso aos aplicativos desses sites de forma
gratuita.
– Isso já é quebra da neutralidade, porque o usuário não tem acesso à internet,
mas somente àquilo que a operadora decidiu – declarou, completando que, caso
esse modelo se dissemine, na hipótese do surgimento de uma nova rede social no
Brasil, esta não terá acesso ao mesmo público que as redes já consolidadas.
Na segunda-feira [3/2], a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti,
disse que o governo trabalha com a perspectiva de iniciar na semana que vem a
votação do Marco Civil da Internet. O projeto, considerado prioritário pelo
Planalto, está trancando a pauta da Câmara dos Deputados.
A previsão é que, caso aprovado, o novo texto não sofra questionamento judicial
por parte das operadoras, segundo Guilherme Ieno, sócio da área de
telecomunicações do Koury Lopes Advogados.
– Mas vamos ver o que sai da cartola de cada uma delas lá na frente – declarou.