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Fonte: Ciranda Internacional de Informação Independente
[23/03/07]   Documento final do II Encontro da Frente Nacional por um Sistema Democrático de Rádio e TV Digital é uma carta aberta ao governo Lula e ao povo brasileiro
 
A Frente Nacional por um Sistema Democrático de Rádio e TV Digital, reunida no Clube de Engenharia do Rio de Janeiro nos últimos dias 15 e 16 de março, vem a público reafirmar o compromisso expresso em sua fundação e questionar a política estabelecida pelo governo Lula para o setor de Comunicações, especialmente no que se refere à implantação da tecnologia digital no País.
 
Constituída em abril de 2006, a Frente Nacional por um Sistema Democrático de Rádio e TV Digital agrega diversas entidades e iniciativas que, até então, atuavam isoladas, para fazer valer o potencial transformador deste processo e sua importância na definição do futuro da TV e do rádio, meios de comunicação com maior alcance junto à população brasileira. A avaliação naquele momento, ainda válida, era que a digitalização da radiodifusão trazia consigo a possibilidade de dar novas soluções a velhos problemas, permitindo alterar a concentração de propriedade dos meios de comunicação bem como a pouca diversidade no conteúdo transmitido, construindo um sistema mais plural e diverso voltado às demandas informativas e culturais da população. Passado um ano, reafirmamos serem estes os objetivos para a digitalização das comunicações brasileiras.
 
Política de comunicação governamental contra a democratização da mídia
Nos preocupa seriamente a condução do processo por parte do Governo Federal, em especial pelo Ministério das Comunicações. Diferente dos objetivos democratizantes expressos no Decreto 4.901/03, que criou o Sistema Brasileiro de TV Digital, o Executivo Federal optou por outro caminho ao editar o Decreto 5820/06.
 
Este último, publicado em junho do ano passado, estabeleceu a adoção da tecnologia japonesa (o padrão de modulação ISDB-T), a despeito dos avanços nas pesquisas desenvolvidas por instituições brasileiras, e instituiu um cronograma de transição que favorece a manutenção da concentração da televisão nas mãos de poucos e limita as possibilidades de ampliação do número de programações no espectro de freqüências (por onde trafegam os sinais de TV e Rádio). Às emissoras foi dado o mesmo espaço que hoje dispõem os concessionários, embora seu sinal possa ser transmitido em menos espaço.
 
A desconsideraçã o dos objetivos do Decreto 4901, o atropelo nos procedimentos previamente estabelecidos e as questões acima citadas tornam o Decreto 5820, em nossa avaliação, um grave erro político. A crítica ao decreto deve ser feita inclusive no plano legal, já que a ação impetrada pelo Ministério Público Federal questionando o Decreto não teve seu mérito completamente julgado. Estas fragilidades evidenciam ser errôneo iniciar a transição sem vinculá-la a uma revisão do marco regulatório das comunicações brasileiras, que data da década de 60.
 
Não bastassem as decisões equivocadas do governo, os órgãos envolvidos na condução do SBTVD cercearam a participação da sociedade no processo ao esvaziar o Conselho Consultivo existente e inviabilizar o diálogo com a sociedade civil e o Congresso Nacional, caracterizando uma postura antidemocrática que não condiz com o discurso de participação social apresentado pelo governo.
 
No caso do Rádio Digital a situação é ainda mais grave. Testes foram autorizados sem qualquer debate público a respeito do modelo desejado para o País. Diversas emissoras já realizam estudos com o padrão proprietário estadunidense IBOC, que caso seja adotado pode criar um cenário ainda maior de concentração, por ocupar uma fatia maior do espectro de freqüência e pelos custos de suas licenças.
 
Digitalização deve servir ao povo brasileiro e não ao oligopólio da mídia
Frente a este quadro, questionamos o descolamento da prática apresentada pelo Governo Federal com o seu discurso a favor da democratização das comunicações do país expresso no programa da candidatura Lula à Presidência da República em 2006. Em relação específica à implantação da tecnologia digital no Rádio e na TV, isso significa retomar os objetivos do Decreto 4.901 assinados pelo presidente em 2003, entre eles a democratização da comunicação e a ampliação da pluralidade e diversidade nestes meios. Para isso, é fundamental que a digitalização da radiodifusão seja o ponto de partida da renovação do marco institucional da comunicação social eletrônica de massa, tal como está expressa no programa de governo do presidente Lula e como vem sendo defendido por importantes representantes da sociedade e do governo.
 
Defendemos que este novo marco legal revise a consignação de canais feita às atuais concessionárias, evitando tanto o desperdício do espectro quanto a cessão automática de um bem público, escasso e limitado, sem a devida contrapartida por parte das entidades que irão explorá-lo. Queremos a otimização do espectro. Este, deve servir ao interesse da sociedade, garantindo de forma democrática a presença de diversas fontes de informação. Para isso, a definição do plano de canais (a distribuição do espaço no espectro) deve primar por este objetivo e não pela simples acomodação das emissoras hoje existentes. Esta visão passa por (1) uma "limpeza" na forma como o espectro é usado atualmente, retirando canais que infringem a legislação e aqueles que perdem sentido face à modernização introduzida com a tecnologia digital, tais como as que servem para repetição de sinais e as outorgas para serviços de TV paga; e (2) uma ampliação do espetro utilizado, com o uso da faixa que inclui  os canais 60 a 69 e da faixa hoje conhecida como VHF baixo (canais 7 a 13) exclusivamente para emissoras de natureza pública.
 
Este espaço disponibilizado deve servir para equilibrar a presença dos três sistemas previstos pela Constituição Federal (privado, público e estatal) dando preferência aos dois últimos, hoje responsáveis por apenas 20% das Rádios e TVs existentes no País. Neste sentido, faz-se necessária a criação de canais públicos com independência editorial, gestão participativa e democrática, financiamento público estável e programação que reflita a diversidade cultural e informativa do país e dê voz aos setores oprimidos da população. Para isso, defendemos a revisão dos quatro canais da União previstos no Decreto 5820 (Executivo, Cultura, Educação e Cidadania), que mantêm a lógica da comunicação estatal em detrimento da pública. Por isso, reconhecemos no Fórum de TVs Públicas importante espaço de debate sobre este tema.
 
No caso do Rádio, a criação de um grupo consultivo por parte do Ministério das Comunicações só poderá marcar uma mudança de rumo na política atual se incorporar os atores representativos da sociedade civil hoje excluídos do processo para além dos radiodifusores e empresários de equipamentos. Esta instância, assim como no caso da TV, não pode ser uma iniciativa isolada, devendo estar no âmbito de um Sistema Brasileiro de Rádio Digital que invista em pesquisas sobre alternativas tecnológicas brasileiras e permita discutir o modelo de rádio necessário, não apenas chancelando os testes atualmente em curso. As "novas soluções para velhos problemas", no caso do rádio, passam pela valorização das emissoras comunitárias, em detrimento da repressão por que passam estas iniciativas hoje, e pela criação de iniciativas públicas baseadas nos mesmos princípios presentes no Decreto 4.901.
 
Só a sociedade organizada pode vencer esta luta
A Frente Nacional por um Sistema Democrático de Rádio e TV Digital entende que os meios de comunicação devem servir e serem feitos pelo conjunto da população, não apenas por uma pequena minoria que têm os meios de comunicação apenas como um instrumento comercial. É neste sentido que reafirmamos o chamado para que a população e os movimentos sociais se engajem nesta discussão e reivindicamos que o governo reconheça esta contribuição para a definição do futuro deste processo.
 
Entidades integrantes da Frente por um Sistema Democrático de Rádio e TV Digital: consultar aqui