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[03/09/12]   Manipulação de Cotações na Bolsa de Valores por parte do Banco Cruzeiro do Sul e Morgan com “o Mico” - por Fernando Nogueira da Costa

Fernando Torres (Valor, 23/08/12) informa a respeito de manipulação de cotações na Bolsa de Valores por parte do Banco Cruzeiro do Sul. Ele vinha “sustentando” as cotações da Telebrás desde meados do ano passado, aparentemente na tentativa de melhorar os resultados divulgados pelo banco, sob intervenção desde o início de junho, após sofrer acusação de ter inflado o balanço com operações de crédito inexistentes.

Dono de 6% do total de ações ordinárias da Telebrás, o banco teve ganhos contábeis de R$ 105 milhões com seu investimento nos papéis da antiga holding estatal de telecomunicações entre junho do ano passado e março de 2012. A corretora do banco dominava a ponta de compra dos papéis da estatal, de baixíssima liquidez, nos dias que antecediam o fim dos trimestres – época de fechamento dos balanços. Nos últimos cinco dias dos meses de setembro e dezembro de 2011 e do mês de março deste ano, a corretora do Cruzeiro do Sul foi responsável por executar, respectivamente, 76%, 94% e 86% das ordens de compras de ações ordinárias da Telebrás. Nesses dias de fim de trimestre, o volume de negócios era maior, assim como a valorização das ações da estatal. Com isso, o valor da participação acionária detida aumentava e melhorava os resultados apresentados nas demonstrações contábeis divulgadas trimestralmente, o que é obrigatório para empresas com ações em bolsa, caso do Cruzeiro do Sul.

Em entrevista concedida ao Valor no início de 2010, o ex-controlador do Cruzeiro do Sul, Luis Octavio Indio da Costa, contou que o banco começou a comprar ações da Telebrás em 1997 e 1998, quando fez um investimento de R$ 3 milhões, pagando o equivalente hoje a R$ 0,10 por ação. O investimento tinha como base a expectativa de liquidação da empresa pelo valor patrimonial, que era de R$ 1,40, mas que nunca ocorreu de fato.

Em meados do ano passado, reforçaram-se as apostas de que sairia o prometido aumento de capital na estatal, como parte da estratégia do governo de ressuscitar a Telebrás e incluí-la no plano nacional de banda larga. Desde o fim de junho de 2011, embora com giro diário de apenas R$ 88 mil, as ações da ex-blue chip do mercado acionário acumularam alta de 72% até o fim de março, quando atingiram o pico pós-privatização (antes de devolver os ganhos mais recentemente).

No fim de setembro de 2011, pouco antes do fato relevante publicado em 13 de outubro, que confirmou oficialmente o aporte de R$ 300 milhões do governo, os papéis subiram 20%. Mas nos últimos dias de dezembro as ações ON da Telebrás também acumularam forte alta, de 8,5%, o que se repetiu no fim de março, com um salto de pouco mais de 12% – sem que houvesse novas notícias relevantes sobre a companhia.

Até o dia 25 dos meses citados, a participação da corretora do Cruzeiro do Sul no total de compras de ações ON da Telebrás também foi relevante, mas bem menor, de 53%, 67% e 33%, respectivamente. E os papéis não mostraram nenhuma tendência de alta ou baixa. Até o dia 25 de cada um dos três meses, eles acumularam variação de -2,4%, -1,7% e +1,4%.

Os dados públicos relativos ao fundo Tamisa, veículo por meio do qual o banco detém sua participação na Telebrás, são mensais, o que não permite saber em que dia do mês as ações foram negociadas. Mas é possível calcular que, entre julho do ano passado e março deste ano, o Tamisa aplicou pouco mais de R$ 7 milhões na compras de novas ações ordinárias da estatal. A maior parte das compras, no valor de R$ 2,5 milhões, ocorreu em agosto, quando as ações deram a primeira forte guinada para cima. Em setembro, o volume chegou a R$ 1,4 milhão e nos meses seguintes ficou em torno de R$ 450 mil.

Ao mesmo tempo, a alta dos papéis nesse período teve um impacto mais de 10 vezes maior no estoque de ações que já estava no fundo de investimento. A variação positiva do saldo investido foi de R$ 105 milhões, saindo de R$ 131 milhões em junho de 2011 para R$ 236 milhões no encerramento do primeiro trimestre.

Esse ganho não entrou no caixa do banco, mas como o investimento era registrado pelo valor de mercado no balanço do Cruzeiro do Sul ao fim de cada trimestre – como determinam as regras contábeis para instrumentos financeiros com liquidez -, o impacto ocorreu diretamente no resultado líquido da instituição.

No período acumulado de julho a março, mesmo com o impacto positivo líquido de impostos de R$ 63 milhões das ações ON da Telebrás, o banco ficou no zero a zero em termos de lucro. O ganho que apurou entre junho e dezembro foi consumido pelo prejuízo do primeiro trimestre.

Sem o efeito positivo das ações da Telebrás, portanto, o banco teria acumulado prejuízo.

A corretora Cruzeiro do Sul pode intermediar negócios para quaisquer de seus clientes, e não apenas para o próprio banco ou para o fundo Tamisa. Também o fundo pode usar outras corretoras para negociar os papéis.

Mas chama atenção a queda expressiva nas cotações da Telebrás desde a intervenção no Cruzeiro do Sul, quando a corretora ligada ao banco e o fundo Tamisa deixaram de atuar na ponta compradora. Do fim de junho até a semana passada, a baixa das ações ON foi de 57%.

O Cruzeiro do Sul chegou a deter 10% das ações ordinárias da Telebrás em fevereiro de 2009, quando um aumento de capital promovido pela União para cobrir um passivo a descoberto diluiu sua posição para 4%. Quando começou a comprar os papéis ON, no fim da década de 1990, o banco também tinha adquirido ações preferenciais, que vendeu no início de 2008, embolsando R$ 16 milhões.

O banco voltou a se interessar pelas ações PN em agosto do ano passado, quando saíram as notícias sobre o plano de banda larga, momento em que se iniciou também uma forte trajetória de alta desses papéis, que acumularam valorização de 150% entre o início daquele mês e março deste ano.

Nesse caso, entretanto, como não havia um estoque relevante de papéis adquiridos previamente, o ganho do banco foi menor.

O Tamisa gastou R$ 77 milhões comprando 25% do capital preferencial da Telebrás entre agosto e março, quando a aplicação foi avaliada em R$ 80 milhões.

Mas desde a intervenção no Cruzeiro do Sul em junho, quando as compras do Tamisa cessaram, a cotação do papel PN acumulou queda de 38%.

Na série de ajustes feita pela Fundo Garantidor de Créditos (FGC) no balanço do Cruzeiro do Sul, uma baixa de R$ 125 milhões se refere à participação do banco nas ações da Telebrás, que no balanço de março era avaliada em R$ 316 milhões, sendo R$ 236 milhões em ações ON e R$ 80 milhões em papéis PN.

Questionado sobre o assunto, o banco não quis se pronunciar. O ex-controladores também foram procurados em diversos telefones, mas não retornaram.

Em resposta à pergunta sobre a existência de investigação sobre o caso, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) enviou nota por e-mail dizendo que “não comenta casos específicos”.
Vanessa Adachi (Valor 23/08/12) informa que o banco americano Morgan Stanley carrega uma perda, um arranhão em sua imagem e muita dor de cabeça por conta da operação que fez com ações do Banco Cruzeiro do Sul duas semanas antes da intervenção do Banco Central na instituição, em 4 de junho.

Em 18 de maio, os controladores do Cruzeiro, Luis Felippe e Luis Octavio Indio da Costa, pai e filho, venderam em leilão na bolsa quase 9 milhões de ações do banco, a um valor de R$ 115 milhões. A operação foi feita, segundo comunicado ao mercado, para que o Cruzeiro se adequasse ao percentual mínimo de 25% das ações preferenciais disponíveis para negociação no mercado (“free float”). Na ponta compradora estava o fundo Caieiras, com patrimônio de R$ 1,5 bilhão e que gere recursos da tesouraria do Morgan Stanley no Brasil.

Acontece que o Morgan não tinha intenção de investir no papel. O banco americano havia fechado um contrato com os controladores que ajudaria o banco a cumprir a exigência de “free float” da bolsa. Ao mesmo tempo em que seu fundo comprou os papéis, o Morgan fez um contrato de venda a termo dos mesmos com os então controladores. Por esse contrato, os Indio da Costa se comprometiam a recomprar as ações no futuro. O risco de variação do valor dos papéis também ficava por conta deles. Para garantir a execução do contrato, a família Indio da Costa investiu num certificado de depósito bancário (CDB) do Morgan recursos provenientes da venda das ações.

O Morgan não comenta a transação. Executivos do banco têm repetido desde então que, se tivessem ideia da intervenção que estava por ocorrer, jamais teriam fechado tal contrato. O episódio expôs a reputação do banco desnecessariamente, envolvendo-o no noticiário da intervenção.

O banco liquidou a operação, ficou com os recursos aplicados no CDB e também com os quase 9 milhões de ações. Carrega um prejuízo porque o valor da garantia não cobria 100% dos R$ 115 milhões gastos na compra dos papéis.

Quanto às ações, hoje elas queimam na mão do banco. Primeiramente, o Morgan tentou convencer o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), responsável pela administração do banco sob intervenção, a recomprar os papéis. O FGC negou o pedido, argumentando que, se até os credores tinham que esperar um desfecho da intervenção, detentores de ações não tinham qualquer direito adicional. Procurado, o FGC não comentou.

A possibilidade de vender essas ações em mercado foi descartada por duas razões: primeiro, porque a liquidez diária é pequena e vender tal lote no pregão seria impossível; segundo, porque a venda das ações exporia ainda mais o banco, que ficaria sujeito a questionamentos sobre sua intenção de auferir algum lucro. Pela cotação de ontem em bolsa, os quase 9 milhões de ações do banco valiam pouco mais de um décimo do valor da transação feita em 18 de maio: R$ 15,7 milhões.

De qualquer forma, com o patrimônio do Cruzeiro negativo em R$ 2,236 bilhões, essas ações só devem ter algum valor daqui em diante na hipótese de o banco ser salvo, ou seja, os credores do Cruzeiro aceitarem a proposta de desconto em suas dívidas e o FGC encontrar um comprador para o banco. Nesse cenário, o Morgan ainda pode enfrentar disputas sobre o direito de propriedade das ações. Pessoas a par do tema consideram que tanto credores quanto os antigos controladores podem reclamar o direito sobre os papéis.