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Leia na fonte: Insight - Laboratório de Ideias
[12/02/10]  Telebrás - entre o fato não-relevante e o não-revelante - por Leonardo Araujo

*Leonardo Araujo é analista de TI.

Conforme se previa, o governo demorou o tempo político que necessitava para responder ao questionamento da CVM, o qual, aliás, não lhe fora dirigido, mas sim à empresa de capital aberto com ações em bolsa de valores que atende pelo nome de Telebrás. Como esta tem um dirigente máximo, na figura de seu presidente Jorge da Motta e Silva, resta saber os motivos de este não ter respondido. Afinal, o administrador maior da empresa - e responsável perante seus acionistas - é ele ou é o ministro das Comunicações? Mais uma vez, parece que alguém gritou "Brasil"... e, nesse tupiniquim país-do-tudo-pode, cumpriu-se a velha norma que conduz os nosso destinos desde que a família real aportou na Bahia.

Tirante esse "pequeno detalhe", as grandes operadoras de telefonia comemoraram, não só a resposta do ministro, mas também o fato de ele ter sido escalado para ser o porta-voz do governo após a inconclusa reunião do dia 10 sobre o PNBL. Além disso, o mercado se alvoroçou e jogou para baixo o valor das ações da Telebrás. A leitura parecia ser uma só: não há nenhuma certeza sobre a reativação da estatal de telecomunicações e, em consequência, o governo poderá decidir tocar o PNBL com as operadoras privadas, prestigiando o ministro Hélio Costa e a "sua" versão do Plano.

Alguns analistas chegam a ver apenas a colocação de um "bode na sala", onde a reativação seria apenas o mote para que as operadoras aderissem "por livre e espontânea opressão" ao PNBL, tal como já teria ocorrido no passado em circunstâncias diversas. Há outros, ainda, que estão enxergando grandes divergências entre os ministérios ou órgãos envolvidos direta ou indiretamente, já concluindo que a complexidade do Plano poderá fazer com que seja deixado para o próximo governo, tal qual outros planos em outros governos.

Mas o que se esperava, afinal?

Que, em um assunto diretamente relacionado ao MiniCom, não fosse o seu titular a falar?

Que o Presidente, que precisa do apoio do PMDB nas próximas eleições, desprestigiasse tão descaradamente o seu ministro e aliado, quando todos as atenções para ali convergiam?

Que anunciasse a reativação da Telebrás, com o PNBL ainda inconcluso, e comprasse uma enorme briga jurídica com a CVM, dando munição aos adversários políticos e tendo que ser advertido por um órgão subordinado?

Que um assunto tão politicamente importante fosse anunciado após o Presidente "conhecê-lo" em apenas duas horas e sem que todos os envolvidos pudessem "melhor analisá-lo e melhorá-lo"?

Que o anúncio acontecesse em uma data sem expressão política nenhuma e justo antes do Carnaval, quando tudo mais é esquecido?

Que o Presidente não ouvisse antes o "clamor" do PT, repercutido em seu Congresso Nacional, a acontecer no dia 18 de fevereiro?

Que a candidata Dilma Rousseff não pudesse extrair dividendos político-eleitorais do Plano por ainda não ter sua candidatura oficializada?

Certamente, ingenuidade política não está entre as características que catapultaram Lula, da condição de torneiro-mecânico-retirante-nordestino, à de presidente do país que se alçou a uma das economias mais promissoras do mundo e que, de quebra, detém cerca de 80% de apoio popular.

Duas das características dos povos de origem latina, enquanto massa populacional, são a atitude emocional apaixonada e a memória curta. São elas que, apenas dois dias após a reunião com o Presidente, fazem com que boa parte do povo e do mercado tenha passado a descrer, de maneira pueril e emocional, de tudo aquilo em que acreditava antes, e que era baseado em fatos reais divulgados por importantes membros do governo (incluindo o Presidente).

Assim, mesmo correndo o risco da chatice da repetição, parece justo recordar alguns destes fatos, haja vista que o período de Carnaval, para quem não se esbalda na folia, pode servir para uma longa e racional reflexão:

1) O PNBL e a reativação da Telebrás estão umbilicalmente ligados e foram gestados no núcleo central do governo, tanto na Casa Civil como no Ministério do Planejamento. Todas as notícias veiculadas desde 2007 tiveram, como fonte, dirigentes do primeiro e segundo escalões, como Dilma Rousseff, Paulo Bernardo, Rogério Santanna, César Alvarez e Erenice Guerra, todos com acesso direto ao presidente.

2) Desde 2007, quando Rogério Santanna, efetiva e publicamente, passou a defender e a trabalhar pela reativação da Telebrás, teve em Dilma Roussef uma constante aliada. Tanto, que o outro pilar dessa luta, César Alvarez, é assessor direto da ministra e do Presidente. Além disso, boa parte do trabalho foi planejado, costurado e desenvolvido nas salas da Casa Civil. Por outro lado, em nenhum momento a ministra Dilma se posicionou contra esse intento; pelo contrário, sempre o estimulou, pois até em seu blog foram postadas matérias sobre isso.

3) A proposta do PNBL (ou o "Plano já pronto", conforme Alvarez) que foi levada à apreciação do Presidente no dia 10, nada tem a ver com o plano do ministro Hélio Costa, tendo o mesmo esqueleto da que foi apresentada a Lula em dezembro de 2009 e que contempla a reativação da Telebrás, podendo esta estar incluída em dos três cenários montados quando da "melhoria" do Plano.

4) O PT precisa de uma fato político denso que catapulte a candidatura de Dilma em 2010, pois o PAC-1 já está se extinguindo, todas as "bolsas" de impacto já foram implementadas e a grande popularidade de Lula não está se transmitindo a sua candidata.

5) A candidata segue uma nova filosofia político-econômica chamada de "Novo Desenvolvimentismo", a qual propõe um Estado forte onde ou quando o setor privado não quiser ou não puder investir, estabelecendo as parcerias que forem desejáveis, mas se mostrando inflexível no atingimento dos objetivos propostos. Para sair da teoria e levar ao povo a sua idéia, não bastam discursos e explicações teóricas que as pessoas comuns não entendem. É preciso criar um caso prático que exemplifique, de maneira simples e inequívoca, o que a candidata propõe. Caso contrário, sua teoria poderá ir para o index librorum prohibitorum, ou seja, será condenada ao esquecimento do povo, juntamente com sua candidatura.

6) É dentro do contexto explanado no item acima - também defendido pelo Presidente Lula - que a Telebrás virá a se constituir na primeira concretização da nova filosofia "dilmista", a qual poderá ser assim assimilada facilmente pelo povo. Além disso, a Telebrás está prevista para se constituir no órgão líder do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), o qual é o principal programa do PAC-2, carro-chefe e maior cartada política para alavancar a candidatura de Dilma.

7) Hélio Costa não é, sabidamente, um dos ministros mais prestigiados por Lula, pelo contrário. Este o atura por ser do PMDB, importante e decisivo aliado político para 2010. O ministro, em nenhum momento foi chamado a contribuir efetivamente para o esqueleto inicial ou para a composição final do PNBL. Mesmo assim, fez questão de entregar seu plano ao Presidente, que sequer o discutiu na reunião para isso convocada. Assim, se o plano já havia sido entregue em 2009 ao presidente, por que entregá-lo outra vez na reunião com os representantes da sociedade civil? Se o PNBL "já estava pronto" - segundo declarou César Álvarez - e o ministro novamente mandou entregar a sua versão, parece óbvio que esta foi publicamente deixada de lado durante o planejamento, sendo mais uma atitude pró-forma, ou uma afirmação política perante a sociedade (e às operadoras) ou, ainda, uma última tentativa para emplacar alguma coisa de seu interesse.

8) A reunião do dia 10 foi conduzida por César Alvarez e por Erenice Guerra (dois dos três grandes pais da reativação; o outro é Rogério Santanna), os quais apresentaram ao Presidente um melhoramento da mesma proposta que, em 12/12/2009, Lula pediu que fosse mais detalhada.

9) O que será discutido até março no âmbito de cada ministério é a proposta-base do Grupo de Trabalho formado para formatar o Plano Nacional de Banda Larga (Santanna, Alvarez, Erenice, Barbosa, etc.). As sugestões de melhorias ou de alterações deverão ser feitas sobre essa proposta, e não sobre o plano de Hélio Costa - e isso faz toda a diferença.

10) Em nenhum momento foi descartada a reativação da Telebrás, pelo contrário. "A reativação da Telebrás é uma das opções", afirmaram César Alvarez e também Hélio Costa, este no ofício dirigido à CVM. Aliás, em tal documento o próprio ministro - que após a reunião declarou que o assunto "Telebrás" não havia sido discutido - escreveu que a "referida empresa no âmbito do PNBL continua sendo objeto de estudos, não se podendo afirmar com segurança, neste momento, que, efetivamente, a companhia será parte do programa. Também não é possível determinar, por ora, quais seriam as atribuições da Telebrás e o escopo de sua atuação na hipótese de sua eventual participação no PNBL".

11) Hélio Costa garantiu que não houve posições ministeriais discordantes na citada reunião. Como se sabe que a reativação era uma discordância só com ele, pode-se entender que ela já é consenso.

Os fatos acima foram extraídos de fontes de amplo conhecimento público. A organização temporal e as conclusões parciais foram feitas com o intuito de facilitar o raciocínio de quem se baseia em análises racionais para a tomada de decisões.

Nesta sexta-feira começa a maior festa brasileira, quando o Presidente poderá cair na folia, continuar trabalhando ou ir descansar em algum local tranquilo. Em qualquer das hipóteses terá a sensação do dever político cumprido.

Afinal, não teve que enfrentar o desprestígio de ser acusado pela CVM - um órgão subordinado (observe-se o detalhe do ofício: "Comunico a..." - termo burocratês usado quando um superior se dirige a um subalterno). O documento oficial fez com que as ações despencassem, mostrando à população e ao mercado que o governo não é responsável e nem compactua com aquilo que chama de "especulação capitalista".

Agora que já "ouviu" a sociedade civil, as operadoras e as lan houses, "ouvirá" todos os ministérios e órgãos envolvidos, assim como também o seu próprio partido, reunido no congresso do dia 18, mesmo dia em que, com toda a pompa e repercussão possíveis, será lançada a pré-candidatura de Dilma Rousseff. Enquanto isso, dará prazo para que alguns pontos "vazem" e para que a oposição e todos os contrários abram suas baterias contra eles ou contra a proposta toda, pois assim conhecerá os argumentos do "inimigo" (não teria sido esse o caso do affaire "Folha de São Paulo"?). Com isso, não parecerá prepotente, pois todos os interessados já terão opinado e contribuído. Poderá aí "tomar sua decisão" com tranquilidade, contando com os apoios políticos que lhe interessam e rebatendo cada um dos argumentos contrários.

Mas tudo isso no tempo e no espaço político convenientes... nunca antes!

Por fim, para aqueles que, após ler essa longa análise, ainda não se convenceram e pensam que tudo isso pode ser apenas "conversa fiada" ou "argumentação direcionada", sugere-se que se questionem sobre o quê a direção nacional do PT usará para empolgar seus correligionários no congresso nacional do partido, justo agora que a candidata melhora sua performance nas pesquisas às custas de um discurso mais estatizante. Deixaria um filé eleitoral de 20 bilhões de reais - o único disponível, por sinal - para empresas privadas que simbolizam o "capitalismo, o neo-liberalismo e o imperialismo multinacional"? Permitiria a Lula "rolar o assunto com a barriga" para o próximo governo e não aproveitar esse filé milionário e de incalculável repercussão junto ao povão?

Mas se, após tudo isso ainda restar alguma dúvida, aí não tem jeito e só restará uma opção: ler todas as centenas de blogs e de comunidades virtuais criadas pela equipe de Dilma e por seus correligionários para vencer a eleição pela Internet, à moda Obama. Essa leitura mostrará como realmente pensam e agem os petistas, bem como o que esperam do partido e da candidata.