José Ribamar Smolka Ramos
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 Outubro 2003               Índice Geral


17/10/03

"Perguntei se havia uma tendência da telefonia em migrar para internet..." 

----- Original Message -----  
From:
 jose.smolka@vivo.com.br
Sent: Friday, October 17, 2003 11:37 AM
Subject: Re: [wireless.br] Duvidas

A pergunta do Estevam:
Pessoal, estou no segundo período de Engenharia de Telecomunicações( FUMEC ), certa vez durante uma palestra de um engenheiro da Siemens na faculdade, ele falava sobre alguns produtos da Siemens relacionados a telefonia por protocolo, perguntei se havia uma tendência da telefonia em migrar para internet. 
Ele me respondeu que a rede atual não suportaria esse fluxo de transmissão de dados, e nem nos próximos anos seria viável a transmissão de tanta informação pela internet.
Surgiu-se então um polemica na faculdade sobre esse assunto, a internet comporta ou não esse fluxo de informação?



A sua pergunta tem muitas possíveis respostas, e muita controvérsia. Vou tentar dar, rapidamente, a minha opinião. 
Historicamente, temos visto os serviços de dados prestados pelas concessionárias de serviços de telecomunicações, no mundo todo, convergirem de uma "salada" de tecnologias (X.25, Frame-Relay, etc.), que criam redes e serviços incompatíveis, para um único padrão: TCP/IP. A utilização universal dos protocolos de rede (IP) e transporte (TCP ou UDP) sobre uma malha de segmentos de transmissão física extremamente variada é que caracterizam a rede chamada de Internet (com "i" maiúsculo). A partir desta rede comum, desde que os usuários concordem na utilização dos mesmos protocolos de aplicação, é possível construir serviços de alcance global. Alguns destes consensos já existem, como, por exemplo, nos serviços de correio eletrônico (protocolo SMTP) ou acesso remoto a hosts (protocolo TELNET). Agora, o serviço de transporte de voz, estilo telefonia (também conhecido como VoIP), é uma outra conversa.

A opinião que "a rede atual não suportaria este volume de tráfego, nem seria viável, nos próximos anos", conforme você citou na sua mensagem, corresponde a um dos extremos da velha "guerra religiosa" entre os chamados netheads (com formação tipicamente em TI e ciência da computação) e os telcoheads (com formação clássica em telecomunicações). A opinião no outro extremo do espectro é "pra que tanta complicação? Já temos plena condição de convergir todos os serviços para a rede TCP/IP". Em minha opinião, embora minha simpatia seja pela posição nethead, nenhum dos dois lados está completamente certo. diga-se, de passagem, que a opinião telcohead sobre o assunto já é uma evolução, porque até um tempo atrás eles nem sequer consideravam a idéia de convergir os serviços de telecom sobre uma rede TCP/IP. Hoje se questiona não mais a viabilidade técnica, mas a capacidade de transporte do volume de tráfego.

A posição telcohead atual é a seguinte: para efetuar a convergência sobre TCP/IP é necessário configurar serviços baseados em protocolos de aplicação mais sofisticados que os atuais, para poder garantir níveis de qualidade do serviço (QoS) equivalentes aos da rede telefônica atual. Essa posição está na base das proposições para a montagem das chamadas "next generation networks" (NGNs). Concordo em parte com essa posição, porque os protocolos de aplicação atuais não conseguem garantir QoS equivalente quando o volume de tráfego escala para níveis industriais, mas as proposições NGN que vi até agora, especialmente no caso de redes de telefonia móvel, ofendem minha convicção que a regra KISS (keep it simple, stupid!) é sempre a melhor opção.

Leve em conta, também, o seguinte fato: os fornecedores tradicionais de equipamentos de telecomunicações sempre trabalharam com margens de lucro semelhantes às da IBM nos bons tempos do reinado dos mainframes. Quando se começa a falar seriamente em convergir serviços em um ambiente aberto, e o espírito dos sistemas abertos começa a bater nesta praia, acho muito natural que estas instituições comecem a adotar posições defensivas, tais como "o problema é muito complexo", "não dá para garantir QoS equivalente", ou "não tem como agüentar o volume de tráfego". 
Minha opinião é: assim como a IBM também tentou (e não conseguiu) deter a onda de sistemas abertos com este tipo de argumentação, os fornecedores de telecom também não irão conseguir. A velocidade com que soluções convergentes sobre TCP/IP serão adotadas pelas concessionárias vai depender, em grande parte, do quanto os engenheiros responsáveis pelas áreas de planejamento técnico conheçam o assunto e tenham (ou não) uma postura, segundo L. F. Veríssimo, "mais ortodoxa que rótulo de maizena".

De todas as objeções levantadas, acho esta do volume de tráfego a pior de todas, porque a rede de serviços de dados TCP/IP tem apenas uma pequena fração dos recursos totais de transmissão física das concessionárias. 
A maior parte dos links de rádio, fibra ótica, multiplexadores PDH e SDH, etc., está alocada para transporte dos canais de voz e sinalização da rede telefônica tradicional. Se a rede IP tivesse um vlume de recursos de
transmissão equivalente, a capacidade de transporte de tráfego seria, em minha opinião, também equivalente (ou, talvez, maior). 
J. R. Smolka 

 

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