José Ribamar Smolka Ramos
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Dezembro 2009               Índice Geral


23/12/09

• Msg de José Smolka "O tempora, o mores!"  (2)

de J. R. Smolka <smolka@terra.com.br>
para wirelessbr@yahoogrupos.com.br
data 23 de dezembro de 2009 11:21
assunto Re: [wireless.br] O tempora, o mores! (divagando no off-topic e voltando ao assunto)

Bruno L F Cabral escreveu:>
>> e banco não é corporação?
>> [ ...]
>
> então desçamos para a situacao brasileira. um certo controlador
> de uma certa empresa telefônica causou muito prejuízo aos
> acionistas. foi tudo pra justiça, inclusive americana, onde o
> juiz até disse claramente que o controlador MENTIA em sua defesa
>
> acabou que tiveram que pagar um "calaboca" de US$1bi para se
> livrar desse sujeito, e ainda por cima tirando todas as ações
> contra ele da justiça.
>
> chama isso de boa governança corporativa? e ele é considerado
> pelo Farol de Alexandria um homem "brilhante"...

Ok... Mesmo sendo off-topic, vamos lá. Creio que vc está tentando, elipticamente, continuar a referir-se ao caso do Banco Opportunity e seu sócio controlador, o Sr. Daniel Dantas. Se estou enganado, por favor me corrija.

Este é precisamente o exemplo do que citei na segunda parte do post anterior. Este senhor (que não há duvidas que seja brilhante, mas, aparentemente, usa este brilhantismo para fins escusos) gravita o tempo todo em torno do poder, em todas as esferas e de todas as colorações ideológicas. O ponto fundamental para o sucesso da maneira que ele escolheu para tocar seus negócios é que ele necessita desta proximidade incestuosa com o poder. E (triste sina a nossa!) a contrapartida da existência de figuras como o Sr. Daniel Dantas é a necessária existência de políticos, preferencialmente - mas não exclusivamente - ocupantes de cargos públicos, que julgam que neste tipo de transação eles também podem obter vantagens pessoais e políticas.

Outra coisa, muito diferente, é tentar generalizar o comportamento de toda a classe empresarial, e de todas as corporações (especialmente aquelas que tenham controle acionário estrangeiro) com base neste caso, ou num grupo seleto de casos amplamente conhecidos. Isto é um tipo de falácia de generalização, denominada cherry-picking (catando cerejas).

> Ainda vamos sentir saudades do Lacerda...

Presumo que vc se refira ao Carlos Lacerda, figura controvertida da política brasileira no período de Getúlio até a ditadura. Não sei exatamente como esta referência se aplica aqui.

> eu não gosto do estilo do PHA, mas prefiro mil vezes não ler sobre
> fichas falsas da FSP, ou sobre a suposta censura do estadinho, ou
> seja, não dou crédito algum ao que sai no (como diria o PHA) PiG (*)
>
> sobre a revista "espie"[1] nem em consultório de dentista...

Suspeitava disto... Não creio que o PHA possa ser classificado como grande paradigma da imprensa brasileira. Na verdade, em tom sarcástico, o verbete sobre ele na desciclopédia diz (IMHO com propriedade):

Paulo Henrique Amorim é ex-jornalista da Globo, ex-jornalista do IG e há quem diga que é ex-jornalista em tempo integral.

Então, para benefício de quem não lê no original, cito (alternãncias de cor do texto conforme o original):

Uma liminar do ministro Arnaldo Esteves Lima, do STJ (Superior Tribunal de Justiça) , suspendeu o processo contra o banco Opportunity, de Daniel Dantas, até que o processo contra o juiz Fausto Martin de Sanctis, movido pelo banqueiro, seja julgado. A medida suspende qualquer ação decorrente da tal Operação Satiagraha, incluindo a condenação de Dantas a 10 anos de prisão.

Pois é… A decisão tem só caráter liminar, mas…

Quantas vezes, senhores leitores, alertei aqui que todos os absurdos e abusos daquela operação de nome ridículo acabariam beneficiando Dantas? Cheguei a escrever uma vez que o tal delegado Protógenes Queiroz, hoje um comunista do Brasil, e o juiz de Sanctis eram, na prática, aliados do banqueiro, ainda que não o quisessem. Será, assim, tão difícil encontrar entrevistas e considerações de ambos que vão um tantinho além do processo legal? Será, assim, tão difícil caracterizar certa perseguição? Acho que não!

No dia 12 de junho do ano passado, a revista VEJA escreveu uma Carta ao Leitor exemplar a respeito . Está tudo lá. Leiam. Volto em seguida:

A prisão do banqueiro Daniel Dantas, do especulador Naji Nahas e do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, acusados de um rol de crimes que envolvem de corrupção a fraudes financeiras, vai seguindo um roteiro previsível no caso dos crimes dos colarinhos-brancos. O juiz decreta a detenção temporária ou preventiva sem que haja necessidade para isso, a Polícia Federal protagoniza uma ação espetaculosa, os presos aparecem de algemas nos jornais e na televisão, os advogados dos presos entram com pedido de habeas corpus, uma instância superior o concede, os presos são libertados para responder ao processo em liberdade - e, depois de anos de refrega jurídica, os acusados são absolvidos. Na massacrante maioria das vezes, não porque sejam de fato inocentes, mas porque o inquérito original, feito a toque de caixa, com falhas e inconsistências pueris, abre aos advogados de defesa brechas enormes para fazer a transformação de criminosos em injustiçados.

A lógica mais banal sugere que deva ser feito o contrário: a polícia investiga os suspeitos, elabora um inquérito com provas e argumentos irretocáveis, a peça é examinada e acolhida pelo juiz, abre-se um processo com os réus respondendo em liberdade e, só lá no final, em caso de condenação, os culpados são presos. Presos de verdade, por anos a fio, e não apenas por alguns dias, como vem sendo a regra.

No que se refere à última operação da Polícia Federal, esses erros de investigação tão comuns atingem níveis lisérgicos. A pressa em produzir imagens para a televisão de criminosos de colarinho branco sendo algemados resultou em um inquérito incompetente na colheita de provas, indigente em sua compilação e ágrafo na apresentação final - o que prenuncia vida fácil para a defesa dos acusados quando as instâncias judiciais começarem a cumprir sua nobre função. Os policiais produziram 5 000 páginas. Elas foram reduzidas a 173 no relatório final do juiz, que teve a sabedoria de rejeitar a imensa quantidade de arbítrios, julgamentos apressados e convulsões ideológicas exaradas pelo delegado da Polícia Federal responsável. Uma reportagem desta edição de VEJA mostra que essa operação foi feita longe do alcance do diretor-geral da PF e com a participação indevida de espiões da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). O resultado do amadorismo e da incompetência do trabalho policial será, provavelmente, a impunidade de Dantas, Nahas e companhia. Uma pena.

Voltei
De Sanctis já foi considerado suspeito para continuar à frente do caso MSI/Coritnhians, um outro em que Protógenes atuou. Algumas pessoas ainda não perceberam que é contraproducente recorrer a expedientes heterodoxos para fazer justiça. Isso só beneficia o crime e os criminosos.

Tantas vezes chamei aqui a atenção para esse fato. Setores da imprensa são igualmente responsáveis por esse andamento das coisas. Não adianta, agora, tentar acusar a Justiça de parcial ou de leniente com os poderosos.

No dia 3 de agosto do ano passado, por exemplo, ficamos sabendo que, na Operação Satiagraha, Protógenes e sua equipe receberam, com autorização da Justiça, senhas para acessar o cadastro completo e monitorar o histórico de ligações de qualquer assinante das companhias de telefonia. Esse tipo de permissão não está previsto na lei (n.º 9.296) que disciplina o uso de escutas telefônicas nas investigações criminais e divide opiniões dentro do Poder Judiciário.

E o que escrevi então? Isto:

Há um verdadeiro conluio de juízes de primeira instância e policiais, especialmente os federais, contra o estado democrático e de direito. A lei não os autoriza a agir assim, e o sigilo é uma das garantias asseguradas pela Constituição.

Vejam lá: não se quebra mais o sigilo de quem está sendo investigado. Agora é para valer e é oficial: não existem mais ligações - e isso inclui os e-mails - privadas no Brasil. Juízes de primeira instância e policiais decidiram seqüestrar os seus direitos. Segundo o tal Odilon de Oliveira, é preciso parar com os “garantismos” - que ele diz ser “dos bandidos”. E, para fazê-lo, não se incomoda em acabar também com os “garantismos” do cidadão comum.

Estamos todos entregues à sanha de justiceiros, que agem ao arrepio da lei, escarafuncham as nossas conversas, metem-se em nossa vida privada, invadem nossos direitos individuais e, depois, saem por aí fazendo a “edição” que melhor lhes convier do que conseguiram colher, atingindo aqueles que consideram seus “inimigos”. Usam a ação dos criminosos como pretexto para arroubos de estado policial.

ATENÇÃO: ISSO QUE JUIZES DE PRIMEIRA INSTÂNCIA E PF ESTÃO FAZENDO NÃO EXISTE EM NENHUM PAÍS DEMOCRÁTICO DO MUNDO. Aliás, com essa abrangência, nem nas ditaduras. Não vai demorar, haverá verdadeiras gangues no Brasil dedicadas à chantagem - e em assuntos que nada terão a ver com questões públicas.

Fiquem certos: isso não vai contribuir para a diminuição do crime e da impunidade. Até porque os bandidos certamente não tratam as questões realmente relevantes por telefone.

Encerro
Como está agora provado, procedimentos ao arrepio da lei só ajudam os criminosos. Sim, vão acusar Dantas de ter comprado o STF, o STJ e o pipoqueiro da esquina. Tivesse o processo legal seguido o seu curso, sem protagonismos ridículos, talvez ele estivesse em pior situação.

Tudo conforme o previsto aqui. Tudo conforme a lógica. Como sempre.

E, por meu lado, este off-topic está encerrado. Pelo menos em público, se quiser continuá-lo em pvt, por mim tudo bem. Volto, então, ao tema principal que deu origem ao primeiro post.

Cerca de duas vezes por semana recebo e-mails de empresas que oferecem seus serviços de comunicações integradas para o mercado corporativo. Elas apregoam, explicitaente, que usarão VoIP para reduzir os custos de chamadas telefônicas. Já tive contato pessoal com uma, e virtual com outra, destas empresas. O que pude deduzir do seu modus operandi é:

a) Todas possuem apenas licenças SCM, e tem acordos operacionais com alguma operadora tradicional de telecom que possui a licença STFC. Na versão soft elas compram da operadora pacotes de minutos no atacado para comercializar com seus clientes. Na versão hard a própria operadora é a dona da empresa, explicitamente (como no caso A. Telecom) ou via contrato de gaveta (a que vi, alegava que a Oi seria a verdadeira proprietária);

b) A visibilidade da empresa contratante para o STFC é feita com números pertencentes ao plano de numeração da operadora que dá suporte à empresa prestadora do serviço (embora, com a portabilidade, isto tenha ficado mais difuso);

c) Chamadas VoIP LDN ou LDI são direcionadas para um gateway STFC mais próximo do destino da chamada, diminuindo ou eliminando o degrau tarifário. O objetivo final é que pague-se somente tarifas locais.

Então, se a prática de uso destas empresas parece generalizada, e a verdadeira burla (se é que podemos chamar assim) ao STFC é a morte virtual das suas variantes LDN e LDI, então porque a chiadeira e o noticiário concentram-se apenas sobre a Telefónica? Porque não se pede, também, auditoria da Anatel sobre a BrOi, a Intelig, a Embratel e a GVT por este mesmo motivo?

E, finalmente, quero registrar minha decepção com a maneira como a Flávia Lefévre terminou o seu post sobre este assunto. Deixar implícita a existência de qualquer nexo entre o caso da Telefónica e o caso do mensalão do GDF, IMHO é uma argumentação que beira o ad hitlerum.
[ ]'s

J. R. Smolka


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