José Ribamar Smolka Ramos
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Novembro 2011               Índice Geral


14/11/11

• PGQ-SMP e PGQ-SCM, "conquistas" ou fontes de confusão?

de J. R. Smolka smolka@terra.com.br por yahoogrupos.com.br
para "wirelessbr@yahoogrupos.com.br" <wirelessbr@yahoogrupos.com.br>, "Celld-group@yahoogrupos.com.br" <Celld-group@yahoogrupos.com.br>
data 10 de novembro de 2011 17:38
assunto [wireless.br] PGQ-SMP e PGQ-SCM, "conquistas" ou fontes de confusão?

Oi pessoal,

No diário oficial do último dia 31 de outubro foram publicadas duas resoluçoes da Anatel: nº 574 e nº 575, que aprovam, respectivamente, o Regulamento de Gestão da Qualidade do Seviço de Comunicação Multimídia (RGQ-SCM) e o Regulamento de Gestão da Qualidade da Prestação do Serviço Móvel Pessoal (RGQ-SMP).

O RGQ-SCM é novidade completa, nunca existiu antes. Já o RGQ-SMP vem para substituir o Plano Geral de Metas de Qualidade do SMP (PGMQ-SMP) e o Regulamento de Indicadores da Qualidade do SMP. A grande inovação do RGQ-SMP é a inclusão de metas e procedimentos específicos para as conexões de dados, de forma análoga ao PGQ-SCM.

Estes dois regulamentos foram saudados como uma "conquista dos consumidores" e uma "vitória da sociedade". Mas após duas leituras dos mesmos estou cada vez mais convencido que eles parecem "camelos" (aqueles que, na verdade, são cavalos, porém foram projetados por um comitê - neste caso de advogados e engenheiros, e os textos são penosos sob os dois pontos de vista). A redação é desnecessariamente confusa, existem ambiguidades sobre onde coletar os dados para calcular os indicadores, e muita coisa simplesmente está ainda por definir. O motivo disto, talvez, tenha sido a pressa em editar essas resoluções ainda dentro do mandato do presidente da Agência que se despedia do cargo (vai ver que ele queria este "lustro" no curriculum dele, e não do sucessor ;-) ).

Só vou dar alguns exemplos, porque ser extensivo ia tomar um tempo danado.

O § 5º do art. 1º do RGQ-SMP e o art. 9º do RGQ-SCM, dizem que as prestadoras dos serviços tem que certificar os seus processos de coleta de dados e cálculo dos indicadores com um OCC (Organismo Certificador Credenciado do Sistema Brasileiro de Certificação - Esta definição tem no SGQ-SMP, mas não no SGQ-SMP). Porém não tem nenhuma notícia sobre como o Inmetro, que é o gestor do Sistema Brasileiro de Certificação, designará quais são os OCCs que responderão por estas tarefas; e como o próprio Inmetro aferirá e atestará a capacidade destas organizações para funcionarem como OCCs desta área. Mas estas disposições já estão em vigor. Se alguém aí souber com e quando esta pendência irá se resolver me diga, porque eu não sei.

O inciso II do art. 3º do RGQ-SMP e o inciso III do art. 3º do RGQ-SCM definem a existência de um calendário (ainda a ser divulgado) onde a Anatel vai definir quando deve ocorrer a coleta de dados para os indicadores. Eu não vejo muita vantagem neste método, a não ser no caso do SMP, por razões históricas.

Os eventos de call-control (alocação de canal de sinalização, alocação de cana de dados, início de chamada, término normal da chamada, queda de ligação, etc.) ocorridos durante o transcorrer de chamadas de voz ou de dados no SMP são registrados em estruturas de dados chamados call-detail records (CDRs). Todos os mecanismos de coleta e análise de dados de performance no ambiente de telecom estão intoxicados com a análise dos CDRs para entender o que se passou. Tanto que plataformas de serviço (ex.: os próprios SGSN/GGSN do packet core, as SMSCs do serviço de SMS, etc.), embora pudessem adotar uma forma de gerência mais moderna e ágil, são programadas para gerar arquivos com registros CDR-like para serem incluídos nas análises de performance.

Só que a geração dos CDRs de todos os eventos de call-control é muito caro em termos de capacidade de processamento das plataformas. Então a tradição é marcar data para coletar estes dados, assumindo que um determinado dia funciona como arquétipo de todos os outros, e o que acontece neste dia é usado como parâmetro de referência para representar todos os outros dias. Já era assim no tempo do sistema Telebrás, tanto que as quintas-feiras (o dia-símbolo adotado) eram conhecidas como "o dia do DDDX" (sistema para a coleta dos CDRs de todos os eventos de call-control). Nesse dia ninguém fazia nada que pudesse afetar a estabilidade da rede, para não correr o risco de gerar indicadores ruins. O que mostra logo o grande defeito destes métodos de avaliação baseados em calendário: assim como os motoristas que sabem onde estão os radares na via e, naqueles trechos, reduzem a velocidade para parecer que obedecem ao limite de velocidade, voltando a acelerar quando saem do alcance do radar, as operadoras fazem de tudo para que, nos períodos de coleta agendados no calendário, tudo esteja "nos trinques", e depois disso não se preocupam tanto.

Eu sou favorável a medição contínua, com metas diferenciadas para os indicadores em PMM (Período de Maior Movimento, para o tráfego de voz do SMP) ou em PMT (Período de Maior Tráfego, para os serviços de dados do SMP e do SCM) e fora deles. Este negócio de "calendário" - com a possível exceção dos indicadores que tem que ser obtidos mediante pesquisa junto aos usuários - não tá com nada.

Aliás, por falar em PMM e PMT, os incisos XII e XIII do art. 3º do SGQ-SMP e o inciso VIII do art. 3º do SGQ-SCM definem rigidamente as faixas de horário para o PMM (duas faixas, das 10:00 às 13:00 horas e das 18:00 às 21:00 horas) e para o PMT (10:00 às 22:00 horas). Sem variações para acomodar eventuais sazonalidades (finais de semana, feriados, eventos especiais, etc.), diferenças geográficas (usuários urbanos de grandes x médios x pequenos centros, ou usuários urbanos x rurais não tem os mesmos perfis temporais de tráfego), nem diferenças de tecnologia (o SCM é basicamente prestado via DSL, enquamto o SMP é EDGE/HSPA, e seus usuários não se comportam da mesma forma). Essa "pasteurização" da definição de PMM e PMT não traz nenhum benefício real para a avaliação da qualidade do serviço prestado. É apenas uma conveniência burocrática. Então eu me pergunto: esses caras querem mesmo controlar os indicadores e usá-los como ferramenta para melhorar a experiência de uso dos usuários? Ou estão somente querendo "jogar para a torcida"? E não me venham com o argumento que "o calendário definirá datas de coleta que contornem as sazonalidades". Comigo não cola.

O Art, 9º do SGQ-SCM, e o art. 24 do SGQ-SMP (ambos com vários parágrafos, incisos e alíneas), definem que, dentro de 120 dias (até o final de Fevereiro 2012, portanto) as operadoras SCM e SMP tem que disponibilizar um software de medida do desempenho da conexão. Além dos possíveis conflitos entre os resultados dessas medições ad hoc feitas pelos usuários e o processo formal de medição do desempenho da rede, o que pode gerar uma enxurrada de reclamações de difícil avaliação (e solução mais difícil ainda) - especialmente no caso do SMP, onde as características da rede de acesso vão se flutuantes; existe a definição que a medida será feita entre a localização do usuário e o PTT. Qual o critério para definir qual PTT será usado? Não está definido. Provavelmente estão acreditando que o tal do GIPAQ ou a Entidade Aferidora da Qualidade (chegaremos neles a seguir) vão resolver todas as ambiguidades mais tarde.

Os artigos de 26 a 30 do SGQ-SMP e os artigos de 33 a 37 do SGQ-SCM dizem que, dentro de 120 dias, as operadoras do SMP e do SCM tem que contratar uma Entidade Aferidora da Qualidade. Uma única Entidade Aferidora para todas as operadoras do SMP e uma única Entidade Aferidora para todas as operadoras do SCM? Interpretei certo? E, sendo assim, a Entidade Aferidora que for contratada pelas operadoras do SMP pode ser a mesma contratada pelas operadoras do SCM?

Até onde entendi esta Entidade Aferidora vai funcionar como uma espécie de Nielsen/Ibope (que fazem as medidas de audiência dos canais de TV) para as redes de acesso fixas e móveis, com uma metodoogia ainda a ser definida (ói o GIPAQ aí de novo, gente!), mas que obrigatoriamente terá que passar pelo crivo da tal OCC. E aqui uma dúvida: se cada operadora SMP ou SCM pode contratar sua própria OCC, mas a Entidade Aferidora é uma só (pelo menos para cada grupo de operadoras). Vai ter uma enxurrada de auditorias, feitas pelas várias OCCs contratadas pelas operadoras, sobre a Entidade Aferidora? Confuso.

E por falar em coisas confusas, temos o Grupo de Implantação dos Processos de Aferição da Qualidade - GIPAQ. Ele está definido nos artigos 39 a 44 do SGQ-SCM e nos artigos 47 a 52 do SGQ-SMP e, novamente, não está claro se serão dois GIPAQs separados ou um único. A única diferença, em minha opinião, é se teremos um ou dois "camelos". A composição do GIPAQ é: Anatel (que tem a presidência), a Entidade Aferidora da Qualidade, as operadoras (SCM ou SMP, conforme o caso), e mais quem a Anatel quiser convidar, sem limite de quantidade.

O objetivo do GIPAQ é garantir que os processos de aferição da qualidade, que serão executados em conjunto pelas operadoras e pela Entidade Aferidora da Qualidade, sejam funcionalmente corretos e sejam implantados no prazo (tô sentindo cheiro de atraso aqui). Os dois regulamentos oferecem o mesmo cronograma básico de atividades para o GIPAQ:

Obs.: Estou considerando a data de publicação dos dois regulamentos do DOU (31/10/2011) domo o dia "D" do cronograma de atividades do GIPAQ e os prazos máximos determinados pelos regulamentos.

FASE 1 (até D + 270)

1.1 Instalação do GIPAQ e elaboração do cronograma detalhado de atividades
1.2 Planejamento das atividades de desenvolvimento do software de medição e da implantação dos processos de aferição
1.3 Seleção e contratação da Entidade Aferidora da Qualidade (até D + 120)
1.4 Implantação do software de medição e dos processos de aferição
1.5 Validação do software de medição e dos processos de aferição; definição das áreas para teste
1.6 Preparação das redes e sistemas nas áreas selecionadas para teste
1.7 Avaliação e divulgação dos resultados da fase 1

FASE 2 (até D + 360)

2.1 Teste do software de medição e dos processos de aferição nas áreas selecionadas
2.2 Validação técnica e operacional dos testes
2.3 Elaboração dos manuais operacionais do software de medição e dos procedimentos de aferição

Meio apertado. Será que a Anatel já está se mexendo para convocar o(s) GIPAQ(s)? Embora a(s) Entidade(s) Aferidora(s) seja(m) membro(s) do GIPAQ, como a sua contratação faz parte do cronograma de trabalho, entendo que a instalação do GIPAQ é imediata, com participação da Anatel e das operadoras (e os convidados que a Anatel achar que devam participar), e quando a(s) Entidade(s) Aferidora(s) forem contratada(s) ela(s) passa(m) a participar dos trabalhos do GIPAQ.

É pouco ou quer mais? E eu ainda nem parei pra olhar os indicadores em si. Mas por hoje isto chega.

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J. R. Smolka


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