Michael Stanton

WirelessBrasil

Ano 2000       Página Inicial (Índice)    


14/08/2000
As empresas e a Internet

O tratamento dado pela mídia ao uso comercial da Internet, praticado no País desde o final de 1994, deve fazer pensar que predomina neste meio o usuário doméstico, que poderá realizar suas compras e escolher seu entretenimento através da Rede. Embora seja grande e crescente este setor do mercado, ele é muito menor em volume de recursos aplicados do que o setor que trata de relações comerciais entre as empresas, conhecido como B2B - Business to Business, que tende a ser menos conhecido pelo público em geral.

Até a invenção do computador pessoal, 100% dos computadores era de uso institucional e nào pessoal. A maioria dos computadores pessoais hoje se encontra nas empresas, onde normalmente se comunica remotamente através de uma rede local, a qual poderá fazer parte de uma grande rede corporativa nas empresas maiores. A difusão da computação distribuída nas empresas, com o abandono dos mainframes (grande computadores acessíveis através de terminal remoto) em favor de soluções "cliente-servidor", mudou substancialmente o panorama da computação na empresa, um fenômeno chamado downsizing. Coincidiu também com o declínio de empresas como a IBM, a Unisys e a Digital Equipment (hoje parte da Compaq), e a ascensão de empresas como a Intel, a Microsoft, a Sun Microsystems e a Oracle.

Dentro das empresas, estenderam-se as áreas de aplicação dos sistemas de informação. Inicialmente restritos a inventário, chegaram a incorporar sempre maior número de áreas da empresa: planejamento de recursos de manufatura, engenharia, finanças, recursos humanos, gestão de projetos, manutenção, transportes e assim em diante, passando a se chamar de ERP - Enterprise Resource Planning (planejamento de recursos corporativos). Hoje em dia, software ERP deverá integrar quase toda a atividade corporativa. Deve-se notar que para atender esta necessidade algumas empresas assumiram a ônus de desenvolver os sistemas necessários por conta própria, mas a tendência geral foi de adquirir estes sistemas de terceiros, e, em função disto, hoje existe uma grande indústria de software ERP, dominada pela Oracle.

Era natural que a informatização atingisse também as relações comerciais entre as empresas. O uso de redes de computadores para troca de informações entre empresas já era previsível desde o início dos anos 80, e foi criada uma norma internacional para fazê-lo através do correio eletrônica, chamada de EDI - Electronic Data Interchange. Porém, a integração desta comunicação com os sistemas corporativos foi muito lenta. Foi apenas com o lançamento da Internet comercial e especialmente a revolução trazida pela WWW, possibilitando a integração fácil entre comunicação e sistemas de informação, que foi efetivamente aberto o sinal para o comércio eletrônico em grande escala, e especialmente entre as empresas.

Recentemente surgiram na Rede os "portais B2B", que são websites que reúnem os fornecedores e os consumidores de um determinado setor da economia, e que operam como as bolsas de comodidades. Alguns exemplos são www.e2open.com (computadores), www.partsbase.com (aviação) e www.globalnetxchange.com (comércio varejista). Estimou-se recentemente que o valor anual das vendas realizadas nestes portais B2B já alcança a cifra de US$150 bilhões, e tende a crescer. Em comparação, o total de vendas eletrônicas no varejo não deve chegar a 10% disto. Os portais B2B oferecem vantagens e desvantagens. Democratiza mais o acesso de novas empresas, inclusive de outros países, que poderão concorrer com maior facilidade com as estabelecidas. Numa situação de fornecedor, isto pode levar a uma diminuição de preços, ou até com a transferência para o exterior do fornecimento de componentes. Por outro lado, os beneficiários seriam os compradores, os quais poderiam estar constituindo um cartel informal. O fato que estes portais estão sendo montados por consórcios de empresas supostamente concorrentes já faz o governo norteamericano recear que eles vão limitar a competição econômica. Um caso muito visado é o lançamento da Covisint (www.covisint.com), sendo montado pelas três grandes montadoras de automóveis dos EUA (www.nytimes.com/library/tech/00/07/biztech/articles/07trust.html).

Os portais B2B são apenas a parte mais evidente de outsourcing (terceirização) dos sistemas de informação que resulta do crescimento da Internet. Sempre mais, serviços na Internet estão sendo providos por sistemas remotos. Os websites de busca (Cadê, Altavista, Yahoo!, entre outros) prestam o serviço de localização de informação para o usuário final, através de uma aplicação instalado e operado por eles. Provedores de informação podem ser beneficiados pela instalação dos seus websites nos servidores do seu provedor de acesso. Os serviços prestados por um destes provedores podem não se limitar apenas à provisão de espaço em disco, como envolver também suporte para comércio eletrônico ou sistemas de mensagens. Ou seja, o provedor de acesso estaria fornecendo e operando sistemas de informação para que o provedor de informação pudesse atender os seus clientes.

Nos últimos dois anos notou-se o aparecimento de uma nova categoria de provedor, chamado de provedor de serviços de aplicação (ASP - Application Service Provider). Um ASP lida apenas com o serviço de aplicação, e não combina isto com a provisão de acesso dos usuários (infra-estrutura de comunicação). Inicialmente, o ASP poderia colocar seu hardware junto do provedor de acesso, para tornar mais baixos os seus custos de comunicação. A última evolução observada no mercado faz com que o ASP nem precise ser dono dos computadores usados para instalar seus sistemas de informação. Estes computadores fariam parte de um server farm pertencente a um data center operado por uma outra empresa, que proveria o ambiente de computação e comunicação alugado e usado por um ou mais ASPs. Esta diferenciação de mercados entre empresas cada vez mais especializadas é comum, e geralmente aumenta a produtividade global, pois cada empresa deveria ser mais eficiente em sua área de especialização.

Há várias vantagens com o modelo de ASP e data center. Em primeiro lugar, as aplicações poderão se estender a todo o elenco ERP já mencionado. Neste caso, a empresa estaria terceirizando totalmente seus serviços de informação, mantendo apenas computadores pessoais e uma rede de acesso para seus próprios funcionários poderem utilizar os sistemas de informação remotos. Isto também permitiria a adoção de sistemas ERP por empresas pequenas e médias, que hoje não têm condições financeiras de fazê-lo, pelo alto custo do hardware, software e pessoal técnico necessários. Um estudo recente do Gartner Group prevê enorme sucesso para ASPs que desenvolvam e comercializem sistemas ERP de custo baixo, e com funcionalidade adequada - o autor faz analogias com o impacto sobre a indsústria automobilística do modelo Fordeco de Henry Ford. (www.aspnews.com/analysis/analyst_cols/article/0,2350,4431_386601,00.html).

Por outro lado, seria essencial para a viabilidade da abordagem ASP que as redes de comunicação utilizadas fossem confiáveis e seguras e garantissem uma boa qualidade de serviço (desempenho) para seus usuários. A Nortel Networks recentemente proclamou que o índice de disponibilidade dos seus equipamentos de rede excedia 99,999%, o mesmo que dos equipamentos da rede de telefonia, assim estabelecendo um patamar a ser atingido. A segurança poderia ser garantida por meio das redes privadas virtuais (VPN - Virtual Private Networks), onde a segurança vem do uso de criptografia. Finalmente, a qualidade de serviço necessária deverá poder ser garantida com a adoção de novas tecnologias de rede desenvolvidas nos últimos anos, mas de uso ainda restrito na Internet de hoje, embora constitua o coração da chamada Internet2, iniciativa conjunta da academia e da indústria para desenvolver a próxima geração da Internet (www.ucaid.edu/home.html).

Em suma, há uma grande interação entre o desenvolvimento dos sistemas informatizados das empresas e das redes de comunicação de dados, na qual cada um alimenta o crescimento do outro. Esta é a base da nova economia em construção e está mudando radicalmente a maneira em que se faz negócios em todas as áreas.