ROGÉRIO GONÇALVES
Telecomunicações - Artigos e Mensagens
 
 
ComUnidade
WirelessBrasil 
  Junho 2007              
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27/06/07
• Crimes Digitais - Fernando Botelho 
participa de audiência pública (2)
  ----- Original Message ----- 
  From: Rogerio Gonçalves 
  To: 
  wirelessbr@yahoogrupos.com.br 
  Sent: Wednesday, June 27, 2007 2:27 AM
  Subject: [wireless.br] Re: Crimes Digitais - Fernando Botelho participa de 
  audiência pública (2) 
   
  Prezado Dr. Fernando,
   
  Pelo o que extraí do seu comentário, existe um 
  entendimento jurídico de que os provedores de acesso, apesar da condição de 
  usuários dos serviços de telecom, são responsáveis pela prestação de um 
  serviço de valor adicionado que libera aos usuários das redes IP das 
  concessionárias de telefonia o acesso às redes de amplitude superior (os 
  backbones IP, imagino). Ou seja, supondo que as redes locais sejam as ruas de 
  um bairro e os backbones as rodovias federais, os provedores de acesso 
  operariam cabines de pedágio e cobrariam um valor x, para que os carros, que 
  já estivessem trafegando nas ruas do bairro que não pertencem aos provedores, 
  também pudessem trafegar nas rodovias federais, que também não pertencem a 
  eles. Certo?
   
  O argumento para a existência desse SVA, que se 
  constitui na cobrança de pedágio, é que, devido a uma imposição legal, as 
  donas das ruas dos bairros não podem elas mesmas operarem as cancelas que 
  liberariam o tráfego entre as suas ruas e as rodovias federais.
   
  Trazendo esta parábola para o mundo das 
  telecomunicações, teríamos então que, por força do artigo 86 da LGT, as 
  concessionárias de telefonia supostamente não poderiam cobrar pelo 
  fornecimento de endereços IP válidos, que liberariam o tráfego de informações 
  entre os computadores dos usuários que estão conectados em suas redes locais e 
  os backbones internet, porque esta tarefa é considerada como serviço de valor 
  adicionado e a Lei exige que concessionárias de serviços de telecomunicações 
  explorem exclusivamente o serviço objeto de suas concessões que, no caso da 
  telefonia é o STFC.
   
  Surgem daí duas contradições: uma legal e outra 
  técnica, ambas porém absurdas, que são:
   
  1) Quanto ao aspecto legal, as redes IP 
  públicas, que servem como plataforma para a prestação de serviços de valor 
  adicionado que operam com protocolo IP, como o email, páginas web, voIP e 
  outros, são bens tangíveis e sem elas, não existe nenhuma possibilidade dos 
  SVAs hospedados em servidores remotos serem utilizados, haja vista que os 
  pressupostos básicos para que os computadores possam trocar informações com 
  outros computadores, são que: i) eles estejam em rede e; ii) os endereços de 
  cada host derive de um diretório-raiz comum a todos eles. Assim, quando o 
  servidor DHCP da rede IP da concessionária de telefonia fixa atribui um 
  endereço IP, válido ou não, para o modem de um usuário, o computador daquele 
  usuário, quando conectado ao modem através de uma cabo de rede ou porta USB, 
  estará apto a trocar informações com outros computadores através da rede IP 
  pública local, cujo domínio do diretório-raiz, por delegação de blocos CIDR 
  (protocolos BGP I ou E) foi atribuído à concessionária de telefonia. Isto é 
  mais do que suficiente para, nos termos do § único do artigo 69 da LGT, 
  caracterizar o serviço fornecido pelas concessionárias do STFC, quanto a forma 
  de comunicação, como sendo "comunicação de dados", já que os usuários irão 
  utilizá-los única e exclusivamente para intercomunicação de dados binários 
  entre computadores.
   
  2) Quanto ao aspecto técnico, devemos considerar 
  que a rede internet é uma rede comutada por pacotes exatamente igual à rede 
  Renpac, que é operada pela Embratel desde 1985, sendo que cada uma delas 
  possui seus próprios SVAs, aderentes à família de protocolos X da CCITT na 
  Renpac e ao protocolo IP na Internet e ambos são incompatíveis com os 
  protocolos do Sistema de Sinalização por Canal Comum nº7 (SSC-7) utilizado 
  pelas redes públicas de telefonia que, por sua vez, possui seus próprios SVAs.
   
  Essa diferença entre os SVAs e as redes de 
  telecomunicações que servem como plataforma para eles serem prestados, fica 
  mais nítida se usarmos como referência o modelo para interoperabilidade entre 
  sistemas abertos, também conhecido como modelo ISO/OSI de sete camadas, no 
  qual as camadas 1 (física), 2 (enlace) e 3 (rede), são de responsabilidade das 
  empresas de telecomunicações, enquanto as camadas 4 (transporte), 5 (sessão), 
  6 (apresentação) e 7 (aplicação), são de responsabilidade dos usuários.
   
  Assim, se consideramos que, de acordo com o 
  modelo OSI, os SVAs da internet são apenas programas de computador que 
  interagem com as redes de telecomunicações através de protocolos da camada 7, 
  como o pop, smtp, http, ftp, sif e outros e que, os computadores que hospedam 
  esses serviços podem estar localizados em qualquer lugar do mundo, estaremos 
  então diante da impossibilidade total dos SVAs serem confundidos com os 
  serviços de telecomunicações, pelo simples fato 
  deles atuarem em ambientes completamente distintos, ficando o meio físico 
  (camadas 1, 2 e 3) por conta das empresas de telecom e o meio lógico (camadas 
  4, 5, 6 e 7) por conta dos milhões de servidores de SVAs espalhados pelo 
  mundo.
   
  Recorrendo ao passado das redes públicas de 
  comunicação de dados para esclarecer melhor esta questão dos SVAs, creio que 
  muitos participantes aqui do grupo, especialmente o pessoal que trabalhou na 
  Embratel, devem lembrar dos serviços de informação (ou de teleinformática) que 
  utilizavam a Renpac como plataforma para serem prestados, como o Cirandão, os 
  bancos de dados da Bireme e da Fiocruz e o Consórcio Rodobens. Apesar da 
  utilização da Renpac sempre ter sido mais direcionada para conexões P2P 
  (CVCs), os serviços de informações serviam para adicionar valor ao serviço de 
  telecom, atraindo novos usuários e consequentemente, uma renda extra para a 
  Embratel. 
   
  Pois bem, os SVAs da rede Internet têm 
  exatamente a mesma finalidade dos serviços de informação da rede Renpac, que é 
  agregar valor ao serviço de telecom. Porém, com a significativa vantagem de 
  qualquer pessoa poder se tornar um provedor de SVA, como por exemplo, criando 
  um site e cobrando um valor das pessoas que quiserem acessar seu conteúdo e 
  essa forma simples de prestação de serviço, coloca em evidência um fator 
  determinante que também elimina qualquer 
  possibilidade dos SVAs serem confundidos com os serviços de telecom, que é o 
  conceito de domínio (DNS), segundo o qual os provedores de SVA só podem cobrar 
  pelo acesso ao conteúdo que estiver dentro dos domínios deles (www.qualquercoisa.com), 
  jamais pelo acesso ao conteúdo de TODA a internet, o torna ilegal a figura do 
  "cobrador de pedágio" que ilustrou a parábola do início desse texto. 
   
  Isso nos leva a grave constatação que as as 
  concessionárias de telefonia fixa estão utilizando os provedores de acesso 
  para burlarem o artigo 86 da LGT, que as obriga a explorarem exclusivamente o 
  STFC, pois ao forçarem esta confusão entre SVAs e serviços de telecom, as 
  empresas estão apenas criando um artifício para ocultar a existência da rede 
  pública de comunicação de dados Internet que, por força do artigo 207 da LGT, 
  deveria ter sido devolvida à União antes da celebração dos contratos de 
  concessão do STFC em 1998 e dessa forma, os provedores de acesso atuam como 
  fachada, para esconder da população que as concessionárias de telefonia não só 
  se apropriaram dessas redes IP públicas, como também as estão utilizando para 
  exploração de serviços em regime privado e o fato das empresas não possuírem a 
  devida concessão legal para fazê-lo, as sujeitam a serem indiciadas no ilícito 
  penal de desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicações, previsto 
  nos artigos 183, 184 e 185 da própria LGT.
   
  Quanto a desnecessidade da presença das 
  concessionárias de telefonia fixa (inclusive a Embratel) e dos prestadores de 
  SCM na audiência, sinto discordar do Sr., pois no caso da banda larga, a 
  condição de operadoras de fato das redes IPs físicas permite que essas 
  empresas, juntas, detenham o cadastro de todos os usuários desta alternativa 
  de conexão no Brasil, ao passo que os provedores de acesso, na maioria dos 
  casos, possuem apenas o registro dos usuários que autenticaram equipamentos 
  através dos seus servidores RADIUS em conexões aDSL.
   
  Quanto aos termos de SRTT mencionados pelo Sr., 
  no dia em que a CPI da Anatel for iniciada, o povo certamente ficará sabendo 
  que estas autorizações para exploração de serviços de comunicação de dados, 
  outorgadas para todas as concessionárias de telefonia no dia 27 de julho de 
  1998, em desacordo com os artigos 86 e 207 da LGT, foi apenas mais um dos 
  muitos atos de liberalidade supostamente cometidos pelo Renato Guerreiro, na 
  época presidente da Anatel, haja vista que 
  esses termos de autorização são baseados nas portarias 286, 287 e 288, todas 
  emitidas no dia 29 de novembro de 1995, que por sua vez eram baseadas no 
  Decreto nº 1.719, editado no dia 28 de novembro de 1995, que foi declarado 
  nulo por inconstitucionalidade pelo STF no dia 27 de novembro de 1996, em 
  resposta a Ação Direta de 
  Inconstitucionalidade nº 1435-8 impetrada pelo PDT.
   
  Portanto Dr. Fernando, apesar de respeitar a sua 
  opinião, em minha modesta condição de usuário-estudioso dos assuntos de 
  telecomunicações, me permita discordar da sua abordagem sobre o artigo 61 da 
  LGT, pois tanto pelo aspecto legal, quanto pelo aspecto técnico, o teor deste 
  artigo é de uma clareza tão grande em 
  caracterizar os provedores de SVA como fornecedores de conteúdo, exatamente 
  iguais aos milhões de outros que existem na rede internet, que torna 
  impossível utilizá-lo como fundamentação para justificar a interferência dos 
  provedores de acesso nas conexões físicas realizadas entre os computadores dos 
  usuários e as redes IP operadas pelas concessionárias de telefonia.
   
  Assim, me parece inconcebível, até mesmo 
  surreal, que um projeto de lei emanado do Senado Federal, que se propõe 
  inclusive a alterar os termos do artigo 171 do CP, se preste a legitimar, 
  mesmo que indiretamente, a farsa do "provimento de acesso internet", que 
  sempre serviu apenas para mascarar o fato das concessionárias de telefonia 
  terem se apoderado ilegalmente das redes públicas de comunicação de dados e 
  entupir o Judiciário com milhares de ações contestando vendas casadas.
   
  Finalmente, vale lembrar que o ministro Hélio 
  Costa está em vias de celebrar um acordo com as concessionárias de telefonia 
  para utilizar recursos do Fust na expansão das redes IP públicas, de forma a 
  levar a rede internet até as escolas, bibliotecas e demais instituições 
  beneficiárias dos recursos do fundo. Considerando que, por causa da fachada 
  dos provedores e da falta de regulamentação dos serviços de comunicação de 
  dados, as redes IP públicas estão sendo mantidas artificialmente em uma 
  situação que não permite caracterizá-las como bens reversíveis à União, se 
  nada for feito agora para evitar esse descalabro, daqui a vinte anos essas 
  redes públicas serão incorporadas ao patrimônio particular das empresas, 
  engordadas em alguns bilhões de reais oriundos das verbas do Fust.
   
  É isso aí Dr. Fernando. Como o Sr. pode ver, 
  existe muita coisa para ser discutida na audiência do Senado.
  Um abraço
  Rogério Gonçalves
 
  
 
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