A Lua Branca e a Estrela de Ouro

Autora: Mariana Rezende

Capítulo 1

A lenda da Lua Branca


A lua brilhava no céu como um broche branco sobre o veludo negro.

Guerreiro Valente esperava, do lado de fora da pequena casa, seu  quarto filho nascer.
Seus dois filhos mais novos brincavam com o cachorro.
O mais velho estava no Grande templo procurando um astrólogo há mais de duas horas e ainda não voltara.
O pai estava muito preocupado. Não sabia se estava preocupado com o filho ou com a mulher ou com o bebê que estava "entalado" no ventre da mãe.

    - Grande Águia! - chamou - Por que não chega? Não vê que estou aflito?

    - Meu pai, meu irmão está no templo, e não pode ouvi-lo! - exclamou Vento Veloz que, no momento em que o bebê nascesse deixaria de ser o filho mais novo.
    - Não pode ouvi-lo nem vê-lo!

    -  Meu filho, não está preocupado com seu irmão?  Apesar de aflito, o pai sorriu ao ver o enorme sorriso do filho.

    - Não, papai, meu irmão é tão valente como você e... - neste momento o sorriso deixou os lábios do menino - ... estou preocupado com minha mãe! Não posso vê-la?

    - Poderá quando seu irmão nascer - respondeu Guerreiro Valente, acariciando a cabeça do filho de apenas três anos.

    - Olhe, pai! Meu irmão está chegando! - avisou Crocodilo Bravo.

    - Grande Águia! Seu moleque! Onde esteve?  - o pai, aliviado sorria de orelha a orelha.

    - Estive no templo procurando um astrólogo para meu irmão que está chegando, e não sou mais um moleque! Se esquece disso? - respondeu o garoto, ofegante.

    - Ora,e onde está o homem? - perguntou a parteira, logo depois de sair de casa. - Seu filho já nasceu! E  é uma menina muito especial.

Vento Veloz saiu correndo para ver a irmã, quase derrubando a mulher, enquanto pai e dois filhos gritavam de alegria.

Com a chegada do astrólogo, pouco depois, entraram para ver a pequenina que estava embrulhada em panos e aconchegada nos braços da mãe.

    - Minha irmã é muito bonita, não é, pai?
Vento Veloz estava sentado ao lado da mãe, na esteira, maravilhado por ver uma pessoa tão miúda com aquela.
    - Mas é muito pequena! Ela está doente?

    - Todas as pessoas são pequenas quando nascem, meu filho, e vão envelhecendo e crescendo. Como você, está pequeno agora mas, com muito carinho e uma boa alimentação, ficará tão grande como o seu pai! - explicou-lhe a mãe, Vento Suave.

    - Ah! então mamãe pode deixar que eu vou dar bastante milho para ela comer!  Assim ela fica bem grande que nem você!

Todos deram gargalhadas. Menos Vento Veloz, que não entendeu o motivo da graça.

    - Bebês não comem milho, seu bobão! - disse Crocodilo Bravo, rindo muito.

    - Comem o quê, então?

    -Eles se alimentam de leite materno.- respondeu o pai.

    - Ah! E o que é isso?

Desta vez a gargalhada foi ainda melhor (e maior). Vento Veloz, como de costume, não entendeu.

    - Leite materno é ...leite! Um leite feito especialmente para bebês. - desta vez foi a parteira quem respondeu, rindo gostosamente.

    - Mas não temos isso aqui! Precisamos ir ao mercado!

Mais uma vez todos riram. Só que abafaram o riso, para que o menino não ficasse chateado.

    - Temos sim, Ventinho! Está aqui dentro, disse Vento Suave, apontando para o próprio peito.

Vento Veloz ia perguntar se o tal leite materno estava dentro do coração da mãe, mas ficou quieto pois não gostava que rissem dele.

Por um instante, todos ficaram contemplando o pequeno bebê que dormia em sono profundo. era tão delicado, tão bonito e aparentava ser tão frágil...

Então, Grande Águia, que estivera de boca aberta enquanto olhava a menina, quebrou o silêncio:

    - O bebê parece doente! é tão... tão...

    - Branco!- completou o pai. é mesmo!  -É o bebê mais branco que já vi!

    - O bebê é muito sadio. - disse a parteira.  _ Veja as bochechas coradas! E é muito gordinha! Se parece mais com o filho de um deus! No Norte...

    - Existe uma lenda que diz que Tezcatlipoca [1] irá, a cada 59 anos, ao Norte e de lá trará uma criança clara, e a família que a possuir e cuidar dela será abençoada para sempre - disse  o sacerdote-astrólogo, que falou isso apenas para calar a parteira (pois todos sabiam que se ela começasse a falar do Norte, terminaria só dali a três dias).

    - E o nome? Como minha irmãzinha irá chamar-se? - Vento Veloz não despregava os olhos da linda menininha.

    - O nome! qual será seu nome, parteira? [2] - perguntou a mãe.

    - Será B...

    - Será como o pai e a mão desejarem. - disse o sacerdote.

    - Mas...

    - Porque a lenda diz que deverá ser assim e assim será. - o sacerdote respondeu a pergunta que ia sair da boca da parteira.

    - Por quê? - a parteira estava indignada.

    - Eu já respondi à essa pergunta. E então? como será chamada esta linda menina?

Guerreiro Valente saiu do quarto, deixando  pergunta sem resposta. Crocodilo branco o seguiu e encontrou o pai olhando para o céu, pensativo.

    - Está pensando em quê, papai?

Guerreiro Valente devolveu com outra pergunta:

    - Por que o céu está sem estrelas? Estou vendo apenas a lua!

    - É mesmo! Linda, não é, meu pai? Está muito branca!

    - Linda...como minha menininha...- Guerreiro Valente murmurava consigo.
    - Lua muito branca...

Durante um momento os dois ficaram em silêncio ouvindo distraidamente a conversa que vinha da casa. Até que enfim o patriarca exclamou:

   - Lua Branca será seu nome!


[1] O deus mais importante dos astecas.

Obs: Asteca - povo indígena que fundou, no território do México atual, um império pré-colombiano, conquistado em 1519 pelo espanhol Hernán Cortez (do Dicionário Houaiss).

[2] O nome das crianças astecas eram escolhidos pelas parteiras.


Não perca o próximo capítulo! E depois de lê-lo, não perca o próximo do próximo capítulo e assim por diante!


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