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VoIP versus ICMS (5)

Autor:  Fernando Neto Botelho

 

VoIP versus ICMS

Fernando Neto Botelho

Com o demonstrativo gráfico seguinte, estas duas conexões – a iniciada em rede IP e, a partir do respectivo roteamento de interface, a iniciada, em continuação, em rede telefônica convencional – ficam mais facilmente vislumbradas.
Por elas, se autoriza a convicção de que
(i) o PSCI integra a conexão dentro da rede IP, à qual promove o acesso e a transmissão do sinal multimídia da voz, mas
(ii) não integra o restante fenômeno da conexão – que se faz tipicamente telefônica, para a qual dispensado acesso intermediado – iniciada esta última a partir do acionamento do “gateway” de interface das duas redes, destinado à terminação ou início nesta mesma rede telefônica.

Confira-se a hipótese:


Hipótese 3: Computador-a-Fone Fixo-Móvel Convencional


De todos esses detalhes técnicos, podem ser fixadas as seguintes visões:

– O que informa tecnicamente a atividade de VoIP é a instalação, exclusiva, de novos protocolos de rede no computador-servidor/VoIP (novos softwares: o “H.323” e o “SIP”).
– Esses novos protocolos instalam-se no computador-servidor do PSCI, ali atuando em conjunto com os demais softwares lá existentes (DNS e DHCP) e abrangendo o software-base da rede IP (TCP\IP) para comunicações de voz;
- Logo, o que se implementa, sob a sigla “VoIP - Voice over Internet Protocol”, é tecnologia e aplicação inovadoras em redes IP, conseguidas com a criação do novo software de rede;
- O PSCI não teve alteradas, pela instalação do inovador programa em seu servidor, sua dinâmica e sua posição na rede IP (como agregador de valor e como consumidor de serviços de transporte de telecomunicações);
- O “gateway” de interface – o roteador da rede – é que direciona o tráfego do sinal de comunicação (agora de voz) para outras estruturas que não se confundem com a do PSCI;
- Porque há a interface do tráfego IP da voz com a rede pública de telefonia – feita através do gateway de interface – somente a partir dela é que se cogita de ligação típica-telefônica, sendo que quem solicita esta (ao prestador de PSTN\STFC ou móvel) é justamente o Provedor de VoIP (ou seu terceirizado), o que confirma que ele continua, também aí, a atuar como usuário desta última rede (telefônica). Não se transforma, por isso, em prestador de telefonia.
- Se houver parceria na prestação (VoIP = a ISP + Prestador\SCM) a convicção é a de que o dever de completamento da conexão se restringirá apenas ao Prestador de SCM, pois a sua delegação não se estende a não-delegatários.

Análise Tributária

Chega-se, enfim, ao ponto motivador do propósito inicial: definição tributária de VoIP e sua sujeição, ou não, à exação estadual, pelo ICMS.
Não se apresenta complexa, agora, a tarefa diante do esgotamento da pesquisa dos delimitadores do fato em si, pois, identificado, resta tão só a questão de sua adequação à específica hipótese de incidência, porquanto os demais elementos do tributo não oferecem complexidade.

Para esta missão, optamos por alinhar conclusões finais, com as quais fixamos nossa posição sobre o referido aspecto tributário.
São elas:

1 - O Provedor de VoIP encontra-se, hoje, na exata posição fática-técnica do PSCI, pelo que a atividade daquele se integra na deste, circunscrita a inovação, que sobrepõe uma à outra, à inserção, no computador servidor do último, de novo programa computacional destinado ao gerenciamento do tráfego do dado multimídia (da voz).

2 - Não é a atividade material, isoladamente, que configura a prestação do serviço de telecomunicações, mas sua adição a delegação formal, sem a qual ausenta-se elemento definidor da exação pelo ICMS quanto a serviços de “comunicação\telecomuncações”. Prestador de VoIP não é delegatário formal de telecomunicações.

3 – Não há, no país, disciplina normativa, até o momento, de VoIP (que, como dito, constitui aplicação e tecnologia por emprego de software à atividade dos PSCI). VoIP sintetiza, assim, não mais que inovação e convergência tecnológica.

4 – Não há, na atualidade, norma legal que defina hipótese de incidência tributária, quanto ao ICMS, por prática, pelo PSCI, da conexão IP de dados multimídia (de voz). Viola, de conseqüência, o princípio da legalidade tributária – art. 146, III, “a”, da CF – a instituição, por exclusiva norma convenial, da exação não-definida em lei, sendo, por isso, inaplicável a regra do Convênio ICMS 55/05
(27) , editada pelo CONFAZ, quanto às atividades de VoIP por prestadores de acesso à Internet.

5 – Aplica-se, à inovadora atividade (Provimento de VoIP), o aresto/ STJ (Embargos de Divergência (456.650-PR, 11.05.2005), quanto à NÃO OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR DO ICMS (SERVIÇOS COMUNICAÇÃO). O ICMS será devido apenas por prestador de serviço típico-formal de telefonia (titular do “backbone”) a partir do momento em que acionada conexão telefônica através do gateway de interface da rede IP com a rede ATM, sendo o fato gerador do tributo, neste caso, a última conexão por circuito, e sua base de cálculo, para o ICMS, o custo do serviço prestado apenas por esta operadora PSTN.


6 – Não haverá incidência de ICMS na prestação de VoIP em modalidade “P2P” – entre computadores ligados à rede Internet - ou na modalidade Computador-PSTN, esta quanto ao valor da assinatura “flat” contratada junto ao Provedor de VoIP.

7- Havendo integração, à prestação do acesso\Internet e VoIP, de delegatário de serviços de telecomunicações (SCM, SRTT\STFC), a este caberá, com exclusividade, o encargo tributário com o ICMS devido pela prestação respectiva - aí, prestação de serviço de telecomunicações\comunicação típico.
CONCL

Conclusão

A despeito das considerações finais-tributárias, os Estados acham-se munidos de disciplina convenial adicional, que, além da disposição textual inserida no recente Convênio CONFAZ-ICMS 55/2005 sobre VoIP, ainda autorizam exação, pelo ICMS, das próprias receitas advindas da atividade de PSCI
(28).
A subsistência desta estrutura convenial denota ter o aresto último, do STJ, conservado, realmente, seus efeitos apenas “inter alios”.
Pode-se antever, portanto, possibilidade de conflitos – de natureza tributária – proporcionais a perdas de receitas públicas que a transposição da voz para redes IP irá proporcionar.
Aliados, ainda, a litígios que inovações de impacto, como essa, tendem usualmente a produzir noutros campos – concorrenciais-empresariais – o cenário, que se avizinha com a inovação, mostra-se potencialmente conflituoso.
A ele será convocado o derradeiro ator – o intérprete das repercussões jurídicas da inovação - que tanto melhor fará quanto puder compreender do fato, consolidado como está, com seus amplos lindes tecnológicos, e seu perfil normativo ainda por se editar.
Ressalve-se a possibilidade, aqui sempre mencionada, de a norma de regulação, ou a própria lei formal, virem a disciplinar, no futuro, a inovação, qualificando-a como serviço típico de telecomunicações, e não mais como mera aplicação, momento, então, em que, dado o caráter formal dos serviços, se terá de adequar a interpretação tributária à nova realidade.
Até que isso ocorra, o ICMS, quanto às aplicações e provimento de VoIP, não poderá fugir a balizas da legalidade, que, neste momento, não o autorizam.


(27)   O Convênio ICMS 55/2005 apresenta, em sua “Cláusula Primeira”, autorização para que Estados tributem, pelo ICMS, receitas advindas do provimento de VoIP. A disposição: “Relativamente às modalidades pré-pagas de prestações de serviços de telefonia fixa, telefonia móvel celular e de telefonia com base em voz sobre Protocolo Internet (VoIP), disponibilizados por fichas, cartões ou assemelhados, mesmo que por meios eletrônicos, será emitida Nota Fiscal de Serviços de Telecomunicação – Modelo 22 (NFST), com destaque do imposto devido, calculado com base no valor tarifário vigente, na hipótese de disponibilização”.

(28) 1 – Convênio ICMS 78/01-CONFAZ – Cláusula Terceira (de 06.12.2001) – Autoriza os Estados a concederem redução da base de cálculo do ICMS incidente em prestações onerosas de serviço de comunicação, na modalidade acesso à Internet, de forma que a carga tributária seria equivalente ao percentual de 5% (cinco por cento) do valor da prestação.
2 – Convênio ICMS 50/03 (de 04.07.2003), do CONFAZ, revigora o Convênio 78/01, autorizando a convalidação dos procedimentos adotados em relação às prestações de serviço de acesso à Internet efetuadas nos Termos do Convênio ICMS 78/01 (o que se fez editado, portanto, após a última decisão do STJ).
3 – Convênio 05\2006 ratifica os anteriores e disciplina a exação pelo ICMS sobre a atividade dos ISPs.
4 – Em MG, o Decreto 43.537/2003 atualiza o RICMS e mantém, no item 32, Part 1, Anexo IV, Título XI, a seguinte hipótese de incidência do ICMS/MG “ Prestação onerosa de serviço de comunicação, na modalidade de acesso à Internet – alíquota de 5%”


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