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Canal de Interatividade: Uma Visão de Futuro

Autores:    Marcus Aurélio Ribeiro Manhães e Pei Jen Shiehs  (*)

Canal de Interatividade: Uma Visão de Futuro
Maio 2005
Autores: Marcus Aurélio Ribeiro Manhães e Pei Jen Shieh  (*)

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Sumário

1. INTRODUÇÃO
2. COMPROMISSOS FUNDAMENTAIS DO CANAL DE INTERATIVIDADE
3. SITUAÇÃO NO MUNDO E ESTADO DA ARTE
4. ENCAMINHAMENTO


1. INTRODUÇÃO

O Decreto Presidencial 4.901, de 26 de novembro de 2003, instituiu o Projeto do Sistema Brasileiro de Televisão Digital – SBTVD com o objetivo principal de democratização da informação por meio do acesso à tecnologia digital. Neste sentido, o Sistema Brasileiro almeja se estabelecer como a porta de entrada para o mundo da informação para uma parte significativa da população brasileira, ainda sem acesso às facilidades da informática e da Internet, portanto enquanto agente de inclusões digital e social.

Para cumprir este papel será fundamental a garantia de interatividade entre usuários e um sistema de sustentação de serviços e aplicações. Isto representará o estabelecimento de um sistema onde cada usuário, individualmente, poderá interagir, encaminhando ou recebendo informações e solicitações às emissoras/programadoras.
Denomina-se Canal de Interatividade a este sistema que será constituído através da conexão entre as redes de televisão com as redes de telecomunicações.

A comunicação das emissoras/programadoras para os usuários será estabelecida no Canal de Descida, constituído pelos canais de radiodifusão, podendo se dar enquanto uma comunicação Broadcast (Ponto-Multiponto) - aberta e disponível a todos os usuários ou ainda em Unicast (Ponto a Ponto) – individualizada.

Para que cada usuário possa retornar informações às emissoras/programadoras, será necessário um meio de comunicação denominado Canal de Retorno, a ser constituído por qualquer tecnologia ou meio que permita a comunicação entre usuários do SBTVD (indivíduos, grupos de interesse ou coletividade) com as emissoras ou outro provedor de informações e serviços – através das redes de telecomunicações.
A figura 1 mostra uma representação esquemática do Canal de Interatividade.

Figura 1: Representação esquemática do Canal de Interatividade



Compreende-se que o Canal de Retorno poderá se dar com o emprego de múltiplas redes em complementaridade, como ilustra a Figura 2.

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Figura 2: Canal de Interatividade, num cenário de múltiplas redes.


Pela natureza das redes de telecomunicações e das tecnologias que as sustentam, compreende-se que a comunicação se dá em ambos os sentidos, especialmente devido aos protocolos de confirmação utilizados nos modens em geral. Porém, o Canal de Retorno refere-se apenas à comunicação no sentido dos usuários para as
emissoras/programadoras.

Se modelos de negócio e legislação permitirem, o Canal de Descida Individualizado - comunicação das emissoras/programadoras para os usuários - poderá ser, adicionalmente, implementado através da mesma solução de rede de telecomunicações que sustentar o Canal de Retorno.

Para realizar as inclusões digital e social, o SBTVD deverá prover novos serviços e aplicações baseados em interatividade e contribuir para a otimização e modernização dos programas de governo e da prestação de serviços públicos.
Deverá, também, atender o requisito de baixo custo, propiciar uma rede de educação à distância e prever conexão à Internet. O canal de interatividade será determinante para que o SBTVD alcance estes objetivos com sucesso.

2. COMPROMISSOS FUNDAMENTAIS DO CANAL DE INTERATIVIDADE

A grande questão a ser respondida para o Canal de Interatividade, no contexto do SBTVD, não é apenas tecnológica, mas custo e abrangência da solução. Muitas das tecnologias existentes atenderiam perfeitamente as demandas, no entanto, para a efetivação das inclusões digital e social no país, será necessário que o canal de
interatividade esteja disponível a um baixo custo para a maior parte da população, inclusive nas regiões onde não existem, atualmente, nem os meios de comunicação mais básicos, como a telefonia fixa. A solução deverá ser adequada para cada cenário, considerando-se aspectos populacionais, geofísicos, morfológicos e sócio-econômicos.
Preferencialmente, não deverá ser única, estimulando a competitividade entre fornecedores de serviço e de canal de retorno para se obter ganho em qualidade e redução de preço.

O canal de interatividade deverá ser capaz de suportar serviços e aplicações interativas, incluindo acesso à Internet, quando isso for possível. Os requisitos necessários para suportar estas capacidades devem ser investigados, frente as diferentes condições sócio-economicas e geográficas existentes no país e à diversidade
de serviços e aplicações que serão criados com o SBTVD. As diversidades de cenários, de aplicações e de serviços exigirão grande flexibilidade do sistema, possibilitando a coexistência de diferentes redes e provedores de serviços e/ou conteúdo para o canal de interatividade, de modo a atender níveis diferenciados de exigências de custo e de tráfego (número de usuários, taxas de transmissão, latência, etc.); partindo-se do atendimento à população de baixa renda em condições mínimas satisfatórias até atingir níveis de desempenho muito mais elaborados.

Para atender as inclusões digital e social será importante que ao menos uma solução viabilize baixo custo para os usuários, tanto de aquisição e manutenção de equipamentos, como de tarifação pelo uso do Canal de Retorno. O requisito de baixo custo, associado ao cenário de convergência de redes e de serviços, irá demandar a
criação de um novo modelo de exploração de serviços e a elaboração de nova regulamentação de sustentação aplicável. A tarifação deverá ser muito bem analisada, pois se a população de baixa renda arcar integralmente com os custos decorrentes de implementação e utilização do Canal de Retorno, os serviços podem se tornar inviáveis.

Como alternativas poderão ser criados serviços gratuitos e de utilidade pública, serviços subsidiados por outros que sejam tarifados, tarifação diferenciada conforme o horário de utilização, etc. Outras formas de subsídio poderão ser aplicadas ao se considerar o custo de implantação de novas redes, tal como o compartilhamento de uma mesma rede entre usuários isentos, pagantes parcialmente e pagantes integralmente.

Para atender a todos estes requisitos, técnicos e não técnicos, serão necessários identificar as condições existentes no país e analisar as tecnologias possíveis de serem empregadas, tanto as já consagradas como as que necessitariam de desenvolvimento. A diversidade e a convergência de redes e tecnologias irão requerer soluções de interconexão e de gerenciamento, além de soluções para problemas de interferências internos a cada sistema e aqueles entre sistemas distintos. Surgirão, ainda, outras questões como alocação de espectro, protocolos de acesso, segurança da informação, controle de tráfego e dimensionamento de rede.

Num cenário de diversidade, o estabelecimento de regulamentação apropriada será crucial. Consideram-se que as regulamentações para o uso do espectro e aplicações de serviços deverão ser flexíveis o suficiente para não tolher avanços tecnológicos ou novos paradigmas de modelos de negócios apropriados às demandas socialmente impostas.

O SBTVD deverá possibilitar ao usuário a escolha e a utilização do meio de comunicação que lhe for mais conveniente para constituir o Canal de Retorno, assim como deve prover meios alternativos nas localidades não servidas atualmente por nenhum meio de telecomunicação. Esta condição determinará que a Unidade Receptora
Decodificadora - URD
(1) seja flexível e modular para que qualquer meio de comunicação possa ser aplicável, disponibilizando, por exemplo, uma interface universal tipo USB ou Ethernet e prover conexão IP.

Das tecnologias existentes, as que possuem maior penetração atualmente no país são o STFC e as redes celulares GSM e CDMA. A telefonia fixa tem da ordem de 40 milhões de assinantes, enquanto a celular tem da ordem de 70 milhões. No entanto, mesmo com estes números, existem muitas localidades não cobertas por nenhuma destas alternativas. Além disso, mesmo nas localidades cobertas por estes meios de telefonia, o acesso à Internet chega numa parcela muito pequena destas localidades. O sucesso da inclusão digital através do SBTVD dependerá do provimento de condições econômicas, tecnológicas, mercadológicas e regulamentares que incentivem a criação e implantação de provedores de serviços e conteúdos para usuários do Sistema em todo território nacional, especialmente desenvolvendo provedores locais e regionais, num primeiro momento, e depois, estabelecendo a garantia de acesso à Internet através de provedores de INTERNETV, onde isso for viável.

(1) Aparelho capaz de receber os sinais de Televisão Digital, provenientes do ar ou de outro meio físico, com
a função de sintonizar e decodificar os sinais, de modo a possibilitar a sua reprodução por meio de televisores analógicos.


3. SITUAÇÃO NO MUNDO E ESTADO DA ARTE

Nos países onde atualmente existem sistemas de TV digital terrestre, não houve uma preocupação maior com o Canal de Interatividade. Nestes países, a maioria das pessoas têm acesso a serviços Internet de banda larga, de modo que os sistemas de TV simplesmente utilizam os meios de comunicação de dados existentes para o Canal de
Retorno.
O padrão europeu especifica um canal de retorno via RF para o sistema de TV digital terrestre, o DVB-RCT. No entanto, parece que não houve implementação prática deste padrão, devido à sua dificuldade de alocação de RF em contraste à disponibilidade de outros meios. Além disso, não se preocupou em explorar esse novo conceito dialógico.

Como já mencionado, o caso brasileiro é atípico, pois o SBTVD propõe uma concepção diferente para o sistema de TV digital, atribuindo-lhe uma forte função social como agente de inclusões digital e social, tendo um importante caráter educativo, de saúde e de prestação de serviços públicos, além da sua função de entretenimento.
Assim, o Canal de Interatividade no SBTVD não deverá ser visto como um simples canal de retorno, tal qual ocorre nos outros países, mas principalmente como um meio de comunicação para a promoção das inclusões digital e social, onde as pessoas possam efetivamente interagir com o sistema de TV, usufruindo dos serviços de utilidade pública, sociais e educativos acima citados, criando uma ponte entre o “mundo broadcast” e o “mundo telecom”.

É sob essa nova óptica social que deve ser analisada a situação do Canal de Interatividade no mundo, ou mais precisamente, das tecnologias disponíveis e passíveis de serem utilizadas para a implementação do Canal de Interatividade no SBTVD.
Especialmente, nos últimos anos ocorreu um avanço muito grande nas redes de telecomunicações, surgindo diversas alternativas tecnológicas que permitem o tráfego de voz, dados e imagens com altas taxas de transmissão, que devem ser avaliadas.

O SBTVD não deve, a priori, descartar nenhuma alternativa tecnológica, considerando inclusive um Canal de Interatividade wireless na faixa de radiofreqüências destinada à própria televisão. Pelo contrário, deverá utilizar todas as alternativas possíveis e de modo complementar, para atender a toda diversidade de cenários
existentes no país e realizar a sua função social. Desse modo, deve-se pensar numa “rede” de Canal de Interatividade de múltiplas tecnologias e provedores, possibilitando aos usuários do SBTVD a escolha do meio que irão utilizar como Canal de Retorno além do acesso a portais de provedores de serviços.

Dentre as tecnologias e redes de telecomunicações disponíveis destacamos no quadro a seguir, algumas que já poderiam ser aplicadas:

Lembramos que no SBTVD, a descida de dados será majoritariamente estabelecida através do broadcasting.

4. ENCAMINHAMENTO

Partindo de uma compreensão inicial do tema Canal de Interatividade, foram demandados para o desenvolvimento do SBTVD uma série de requisitos que constituíram a RFP Canal de Interatividade, anexa à CARTA CONVITE MC/MCT/FINEP/FUNTTEL - No 14/2004. Aguarda-se que a sociedade brasileira, através de instituições acadêmicas e de pesquisa, dê respostas a parte destas demandas. No entanto, compreende-se que outras frentes de ação devem ser estimuladas e desenvolvidas para a efetivação do complexo sistema de sustentação ao Canal de Interatividade.

Devemos considerar a formulação de um Modelo de Referência Geral para o Canal de Interatividade, que estabeleça todas as suas implicações, requisitos e formas de implementação, baseando-se em tecnologias, contingências e necessidades identificadas. Tal modelo deverá contar com os subsídios desenvolvidos em resposta à RFP, sem no entanto se restringir aos mesmos, especialmente porque muitas variáveis devem surgir em conseqüência da complexidade do tema.

Evidencia-se também a elaboração de análise bastante completa de adequação e desempenho de cada alternativa tecnológica vislumbrada, sejam tecnologias já existentes ou em desenvolvimento. Assim, demanda-se a constituição de subsídios básicos, considerando-se a arquitetura de rede apropriada a cada tecnologia; as vantagens e desvantagens de cada uma, incluindo, além dos fatores técnicos, os fatores econômicos sociais e regulatórios. Das tecnologias inovadoras ou em desenvolvimento, espera-se uma solução técnica para o canal de interatividade, utilizando redes sem fio auto-estruturadas Ad Hoc (2) e uma solução utilizando RF Intrabanda (VHF/UHF) em redes sem fio suportadas por infra-estrutura. Para isso, além das respostas à RFP, conta-se com a adequação de produtos comerciais a estas particularidades. Ao que considera-se importante uma aproximação com fornecedores de terminais de usuários e de redes.

Neste momento ainda existem incertezas decorrentes de uma definição a ser tomada quanto à escolha do sistema de televisão digital que melhor se adequará ao caso brasileiro. Entretanto, os estudos já revelam algumas possibilidades e, nestas bases, considera-se um novo paradigma de distribuição do espectro de rádio freqüência.
De fato, a Anatel já estabeleceu critérios que garantam a convivência entre o sistema analógico e um futuro sistema digital, bem como a inclusão de novos canais em todas as regiões. Porém, com a tecnologia digital nos canais de broadcast3, o espectro de rádio freqüências estritamente reservado para sinais de televisão poderá admitir outros serviços, especialmente aqueles destinados a prover Canal de Interatividade. Uma nova regulamentação será exigida quanto à distribuição dos canais e dos serviços e, fundamentalmente, deverá ser muito mais flexível, não restringindo tecnologias nem serviços.

Identificamos, portanto, mudanças nos paradigmas que se remetem às redes de telecomunicações, sistemas de televisão, legislação e administração de recursos naturais. A concepção do sistema Canal de Interatividade impõe o estudo e a compreensão dos fenômenos associados e, conseqüentemente a elaboração de
modelos de negócios, com respectivas análises valorativas, fundamentalmente voltadas ao interesse público.

Muitos interesses privados devem ser tocados com tal transformação, porém inúmeras oportunidades de negócio devem ser estimuladas. A transformação tecnológica será um fato inevitável, mas cabe, antecipadamente sua compreensão e explicitação para que a sociedade possa se beneficiar de suas vantagens. Ao que identificamos, além das questões de ordem técnica, existem dois grandes pólos interessados na elaboração de
conhecimento e domínio tecnológico: o Governo Federal na defesa dos interesses públicos e, no domínio dos interesses privados, inúmeras pessoas jurídicas atuantes em telecomunicações, rádio e televisão.

(2) Tecnologia que não depende de infra estrutura centralizada, mas que se auto sustenta e compartilha recursos.
(3) Canais abertos de televisão

4.1 Frentes de Ação

Com base nestas discussões, consideram-se imprescindíveis as seguintes frentes de ação:
• Convergência de um modelo de referência,
• Identificação e interlocução com os players associados (governo, radiodifusores, empresas de telecomunicações, indústrias, representantes da sociedade civil, provedores de conteúdo e serviço), • Análises e encaminhamentos de ações relativas a espectro e legislação,
• Elaboração de modelos de negócios e análise de cenários.

De modo geral, considera-se que tais frentes já façam parte do projeto SBTVD em andamento. Entretanto, é necessário que sejam evidenciados esforços para a realização do Canal de Interatividade, efetivando uma ampla divulgação e consulta à sociedade brasileira.


(*) Sobre os autores:

Marcus Manhães (manhaes@cpqd.com.br)
Trabalha no CPqD desde 1984; obteve o titulo de mestre em educação pela Universidade Estadual de Campinas -Unicamp em 2003.
Na Fundação CPqD vem participando de pesquisas e desenvolvimentos em projetos de telecomunicações wireless, passando por sistemas de rádio digital, telefonia celular e televisão digital. Realizou inúmeros trabalhos de certificação internacional em equipamentos de telecomunicações, além de ter desenvolvido metodologias para testes de interoperabilidade, benchmarking e otimizarão em redes de telecomunicações celulares CDMA e GSM. Atualmente está envolvido no desenvolvimento do Sistema Canal de Interatividade para a Televisão Digital brasileira.

Pei Jen Shieh  (pei@cpqd.com.br)
Possui graduação em Bacharelado em Física pela Universidade de São Paulo (1981) e mestrado na Área de Tecnologia Nuclear/Crescimento de Cristais pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (1984).
É Pesquisadora em Telecomunicações da Fundação Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações; trabalhou na área de Dispositivos Ópticos, passando depois para a de Gerência de Redes.
Sua presente atuação é na área de TV Digital, principalmente no tema Canal de Interatividade.
 

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