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Novembro 2010               Índice Geral do BLOCO

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05/11/10

• Telebrás, Eletronet e PNBL (295) - Artigo: "Banda larga - entre o puxadinho e a lei"

Olá. WirelessBR e Celld-group!

Recebi algumas cobranças, no período pré-eleitoral, para retornar ao tema "PNBL com Telebrás" mas, para evitar discussões e posicionamentos políticos, decidi esperar mais um pouco.

Setembro/outubro foi uma temporada de poucos fatos concretos e muitos factóides.
E, permitam-me desde já incluir a licitação ainda em andamento feita pela Telebrás, no "quesito factóide" e a explicação deverá vir numa próxima mensagem.

Sempre temos novos participantes e então explico novamente que acompanhamos o tema "ressurreição da Telebrás" desde 2007 e já estamos na mensagem/post de número 295!

Lembro que o PNBL nunca foi, "pra valer", uma vontade política do atual governo.
O acompanhamento cerrado do noticiário me permite opinar que o PNBL surgiu com muita força em 2009 a partir da pretensão do Sr. Rogério Santanna, então secretário de Logística e Tecnologia do Ministério do Planejamento, de presidir a moribunda estatal Telebrás e colocá-la na condução do plano de banda larga.
Opino também que o Sr. Santanna conseguiu "vender" a idéia ao governo pois o assunto poderia ser utilizado na campanha eleitoral.
O Sr Santanna consegui para si a presidência da estatal mas o tema não foi utilizado na campanha por motivos óbvios: não havia nada de concreto que pudesse ser submetido ao bombardeio do adversário.

Repito mais uma opinião: não sou contra um PNBL sério e honesto, planejado por pessoas competentes e com a participação de todos os envolvidos, no caso, teles, Estados e sociedade.
Mas sou ferrenhamente contra este PNBL que aí está, decidido nos meandros dos gabinetes do Planalto - mais especificamente, da Casa Civil - centrado na reativação de uma estatal em processo de extinção, por um governo que prima pelo aparelhamento dos seus órgãos.

A presidente eleita Dilma Rousseff que, enquanto ministra da Casa Civil,  apoiou o PNBL nos termos que em está posto, tem agora uma batata quente nas mãos, mesmo antes da posse: a recriação da Telebrás não se enquadra em suas promessas de austeridade. Sua orientação sobre o "PNBL com Telebrás" será uma primeira amostra do que devemos esperar do seu governo e do cumprimento de seus propósitos enumerados no discurso de vencedora.

Estou colecionando as matérias do período e na próxima mensagem apresento um resumo dos principais eventos, ainda não veiculados em nossos fóruns.

Como moderador proativo do WirelessBR  (obrigado ao participante que enviou a  simpática "definição") tento fazer a minha parte, "agitando" vários temas, sem deixar de opinar como simples participante.
Aposentado, estou fora do mercado e da universidade e o que consigo fazer, precariamente, é acompanhar o noticiário, tentar ler nas entrelinhas, fazer resumos e estimular a discussão.
E minha frustração, permitam-me o desabafo, é que não consegui que os aspectos técnicos do PNBL chegassem realmente ao debate em nossos fóruns.
Graças à licitação polêmica em curso, temos muito o que analisar e comentar na área técnica.

Mas vamos em frente que atrás vem gente!  :-)

Transcrevo abaixo esta matéria de hoje:
Fonte: Estadão
[05/11/10]  Banda larga - entre o puxadinho e a lei - por Floriano de Azevedo Marques Neto

Ao debate!

Boa leitura!
Um abraço cordial
Helio Rosa

Portal WirelessBRASIL
BLOCOs Tecnologia e Cidadania

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Fonte: Estadão
[05/11/10]  Banda larga - entre o puxadinho e a lei - por Floriano de Azevedo Marques Neto (*)

A evolução nas telecomunicações é assombrosamente veloz. Isso faz com que seja tentador adotar um atalho, uma solução mágica para desenvolver o setor. Daí o risco de tomarmos o mau caminho. Há alguns meses o governo federal lançou o seu Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), para ampliar o acesso da população à internet de alta velocidade. É essencial oferecer a todos o acesso à transmissão dos conteúdos disponíveis na internet. Para isso são necessários investimentos em redes e serviços. O problema é que o PNBL é um mau caminho. Por ele não conseguiremos universalizar a internet. Pior, estragaremos o que já conquistamos.

A evolução vivida nos últimos dez ou doze anos foi notável. A telefonia fixa e móvel está praticamente universalizada no acesso. Os custos, proporcionalmente à renda, vêm caindo. Sem os elevados tributos teríamos preços bastante acessíveis, mesmo comparados com os de outros países. As conquistas não podem ser desconsideradas. Mas o setor de telecomunicações é diferente de outros. Se tivéssemos no esgotamento sanitário a universalização que temos na telefonia fixa ou móvel, estaríamos equiparados a países da Europa. Nas telecomunicações as necessidades são crescentes. Se ontem desejávamos ter um telefone à mão para chamar um médico, hoje queremos ter acesso remoto a diagnósticos por imagem. Se há 15 anos necessitávamos receber textos por fax, hoje a demanda é por baixar um livro no computador.

Embora editada no século passado, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) é permeável a esse dinamismo. Por isso deu ao presidente da República a atribuição de, a qualquer tempo, determinar quais serviços merecem ser universalizados (ou seja, oferecidos, sob patrocínio da União, a todos os cidadãos, em qualquer parte do território nacional, em condições acessíveis). Previu recursos para isso, mediante um Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), que hoje dispõe de alguns bilhões de reais, nunca utilizados. Dispôs, ainda, de instrumentos para atribuir à iniciativa privada o provimento desses serviços.

Desprezando todo esse instrumental, a política proposta pelo governo federal adota um atalho, apoiada em três vetores:

Recriação da Telebrás como agente de "regulação do mercado";

submissão da banda larga como um apêndice do serviço de telefonia;

e imputação às concessionárias de telefonia da obrigação de construir redes para suportar a crescente necessidade de tráfego de dados em alta velocidade.

Se forem implantados, esses vetores podem, no curto prazo, produzir algum resultado. Porém, ele não se sustentará. E a consequência de médio prazo será comprometer o modelo inaugurado com a LGT, pondo em risco os avanços que ela nos trouxe.

A recriação da Telebrás é uma ilegalidade com patrocínio oficial. A estatal só não foi extinta pela LGT porque, como uma empresa não operacional (uma holding), ela deveria administrar o passivo gerado por anos de descalabro das teles estatais, evitando que a União arcasse com todo o prejuízo. Ela não tem autorização legal para prestar serviços de telecomunicações. Mas o PNBL prevê para a Telebrás um regime de duplo privilégio. Reserva-lhe a exclusividade da prestação de serviços de telecomunicações aos órgãos públicos, impedindo que as empresas privadas disputem esse mercado. A estatal tem assegurado o acesso privilegiado a redes de outras estatais (Petrobrás, Eletrobrás) sem permitir condições isonômicas de acesso às outras prestadoras. Em vez de oferecer redes e serviços nas regiões ainda não atendidas, a Telebrás pretende prestar serviços em regiões mais adensadas, onde hoje já existem três ou quatro operadoras. Por fim, o PNBL desconsidera que, pela Constituição, o papel de regular o mercado compete exclusivamente à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) (artigo 21, XI).

Banda larga é a qualidade de uma rede de transporte de dados. Não se confunde com o serviço de telefonia, que se presta prioritariamente à transmissão de sons. As redes de telefonia mais avançada podem transmitir dados em alta velocidade. Podemos transmitir voz pela internet, usando o Skype. Mas isso não significa que internet e telefonia sejam a mesma coisa. Entretanto, recentemente um alto funcionário encarregado da implantação do PNBL declarou que a proposta é fazer da banda larga um "puxadinho" do serviço de telefonia. A imagem é ilustrativa. Em direito urbanístico, "puxadinho" é a alcunha que se deu às ampliações irregulares de moradias, feitas por necessidade das famílias, mas que nos legaram verdadeiras cidades clandestinas. O PNBL tangencia essa clandestinidade. Ao pretender confundir telefonia e banda larga, embaralha-se a separação entre serviços. Compromete a regulação, traz instabilidade jurídica. No Judiciário já há impugnações a esse respeito. A LGT é reconhecida por ter criado uma regulação clara e estável. O PNBL, por birra ou incúria, solapa este mérito.

Por fim, quem paga a conta. A ideia em voga é imputar às concessionárias de telefonia os ônus de investir em redes de transporte de dados. É mero aforismo. Suas receitas vêm dos que usam seus serviços: os consumidores de telefonia. Ou seja, mesmo quem não deseja ter computador pagará pela construção de redes para que as empresas exploradoras de serviços de dados (ligadas às concessionárias ou competidoras) ofereçam internet em alta velocidade, cobrando por isso. Enquanto bilhões de reais do Fust, pagos por todos nós para esse fim, aguardam num cofre do Tesouro Nacional.

O PNBL parece querer voltar no tempo para atingir o futuro. O risco é que o atalho seja uma via para o retrocesso.

(*) Floriano de Azevedo Marques Neto é advogado, livre-docente em Direito Público pela Universidade de S. Paulo
 


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