FERNANDO NETO BOTELHO

TELECOMUNICAÇÕES - QUESTÕES JURÍDICAS

Janeiro 2005               Índice (Home)


31/01/05

Tarifa-Assinatura (2)

----- Original Message -----
From: Fernando Botelho
To: wirelessbr@yahoogrupos.com.br ; Celld-group@yahoogrupos.com.br
Sent: Monday, January 31, 2005 10:37 AM
Subject: [wireless.br] Re: [Celld-group] Importante: Tarifa-Assinatura

----- Original Message -----
From: "tassilu faria" <tassilu@hotmail.com>
To: <Celld-group@yahoogrupos.com.br>
Sent: Friday, January 28, 2005 5:29 PM
Subject: RE: [Celld-group] Importante: Tarifa-Assinatura
Prezado Fernando,
Sou mais um consumidor ansioso para ver a tarifa de assinatura básica extinta. Porém outro dia, conversando com um amigo, ele argumentou o seguinte:
"Tássilu, se cerca de 25% do que pagamos na conta telefônica são impostos, e isso inclui a assinatura básica... você acha que os tribunais federais vão retirar do prórpio governo essa receita tributária milionária, se não
houver uma mobilização muito significativa da sociedade?"
Fiquei perplexo, mas tive que concordar. Portanto acredito que o único caminho viável, será engrossar o caldo das ações coletivas e mobilizar a imprensa ainda mais.
PS: conforme a notícia abaixo, 25% de 1,5Bi são 375milhões.... o governo vai querer buscar essa receita de alguma forma. A exemplo do que vem fazendo com as recentes "reformas tributárias", que desonera alguns e massacra outros mais, mantendo ( quando não, aumentando) a receita do ponto de vista do governo.
Atenciosamente,
Tássilu Faria


Prezado Tássilu,
Vc tem razão.
A tarifa-assinatura atual gera receita operacional para as operadoras de telefonia e a específica receita gerada é mesmo tributada, tributação não só por impostos, mas também por contribuições específicas, a alíquotas pesadas, e por credores diversos (Estados e União).
Exemplo ?
O ICMS-Imposto s/ Circulação de Mercadorias e Serviços (de comunicação), à alíquota de 25% (am alguns Estados chega a 33%).
Ele atende aos Estados, incidindo sobre a tarifa-assinatura também.
A CIDE/FUST (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, devida ao FUST), à alíquota de 1% sobre a receita BRUTA tarifária, deduzidos, apenas, o ICMS, PIS e COFINS,. Atende à União, com igual incidência.
A CIDE/FUNTTEL (Contribuição devida ao FUNTTEL), à alíquota 0,5% sobre a receita BRUTA tarifária, deduzidos, apenas, o ICMS, PIS e COFINS. Atende à União, com igual incidência..
Isso, sem contar os demais tributos que, de um modo repercussivo, gravam, também, a mesma receita operacional-tarifária (o IRPJ, a CSLL, etc.).
A carga tributária é imensa e sua base significativamente composta pela tarifa-assinatura.
Pode-se então dizer que a tarifa-assinatura passa a ser triangularmente vital, ou, vital tanto:
- para as empresas prestadoras (que têm, nela, aproximadamente 1/3 de sua receita operacional),
- quanto para os erários Estadual e Federal (que têm, nela, intensa fonte de arrecadação de tributos superpostos), e, finalmente,
- para nós todos, que, além da tarifa-uso (preço por demanda), pagamos este custo acrescido-fixo, pelos serviços que contratamos como consumidores.
Numa relação triangular tão intensa de interesses, como essa, as coisas costumam mesmo não se resolver facilmente no Brasil.
Vide a última Reforma Tributária, que, depois de longo tempo tramitando no Congresso, acabou sendo reduzida, na aprovação, a uma menor parte - a outra, a maior, acabou retornando à Câmara Federal, para (re)exame, e isso ocorreu pela impossibilidade de solução da amplíssima questão política nela envolvida (interesses contrapostos, de três Entes Públicos - União, Estados, e Municípios, empresariado, e restantes segmentos da sociedade civil tribuada, cada um desejando algo contrário ao interesse tributário do outro.
Aprendi uma coisa nesses anos de atuação tributária: não há conciliação possível, no mundo e no Brasil em matéria fiscal....nossa história, desde o primeiro instante do Brasil-Colônia, conta esse roteiro, ou, o dos consensos públicos-fiscais com roupagens e aparências que envolvem dissensos monumentais, intransponíveis (entre os que estão, num ou noutro pólo, sujeitos ao problema - como contribuintes ou arrecadadores).
Mas, há, aqui, um aspecto que ainda agrega, na minha opinião, outro componente substancioso à solução da questão da tarifa-assinatura, que não está sendo debatido no tempo da análise do que se passa nos Tribunais nesse momento (talvez pela atenção que o volume de litígios judiciais provocou até agora)..
É que não apenas o Judiciário examina a subsistência desta tarifa-assinatura no cenário regulatório brasileiro - tarifa, reconheço, que, importando tanto para empresas, erários, e consumidores, apresenta mesmo um intenso colorido político, com você destaca.
Também o legislativo - não só a Câmara Federal, mas o Senado - examina o tema, já que há, hoje, em adiantada tramitação, nas duas casas legislativas, dois específicos PL´s (Projetos de Lei) que, de iniciativa de cada uma destas próprias Casas, visam alterar justamente o art. 103/LGT (Lei Geral de Telecomunicações), que é exatamente o dispositivo legal que dá o atual suporte para que a ANATEL possa (como o fez até agora) editar a estrutura dúplice-regulamentar-tarifária para serviços de telefonia (a duplicidade tarifária: tarifa s/consumo/assinatura + tarifa c/consumo/pulsos).
O art. 103 da Lei Geral é, o, digamos, epicentro normativo desta questão, pois, se já sob polêmica nas questões judicialmente instauradas e atualmente sob debate, acha-se também sob exame no âmbito do próprio legislativo federal.
O Judiciário o examina nessas inúmeras ações (coletivas e individuais), para, ao final, fixar se, quanto à sua atual redação, a tarifa-fixa/assinatura de telefonia poderá continuar a ser cobrada.
Mas, o legislativo, paralelamente, planeja alterá-lo (alterar o próprio art. 103) para dele fazer constar expressa proibição de que a tarifa-fixa seja cobrada.
Assim, se o primeiro (o Judiciário) vier a eventualmente fixar, ao final das disputas atuais, que a tarifa-fixa irá continuar, estará fazendo-o no exame da ATUAL redação do art. 103/LGT, o que significa que não terá de qualquer modo examinado a proibição expressa de sua cobrança que o Legislativo hoje examina implantar, mas que ainda não terminou sua tramitação interna no Congresso.
Dito de outra forma, se, eventualmente, houver aprovação posterior, pelo Poder Legislativo (pelo Congresso Nacional), de quaisquer dos dois PL´s relacionados com a tarifa-assinatura e, com eles, for inserido no art. 103/LGT, proibição.para a cobrança, teremos, aí, mais uma realidade, ou, uma inovadora realidade, de proibição legislativa expressa (e não mais de autorização para instituição da cobrança, como ocorre hoje com a atual redação do art. 103/LGT, que ao invés de proibir, autoriza a ANATEL a instituir a modalidade tarifária).
Há, por isso, penso, mais de uma questão política (igualmente polêmicas e de grande porte) além de dois Poderes da República envolvidos na solução:
uma, a questão já "sub judice" (da interpretação judicial que os Tribunais farão da atual redação do art. 103/LGT, que, repito, autoriza a ANATEL a gerenciar a política tarifária brasileira) e, outra, a (possível) questão futura (da instituição de nova redação para o art. 103/LGT, aí, contrariamente, com instituição de proibição expressa para esta).
Digo tudo isso porque, pegando gancho no seu raciocínio, entendo que a questão, no seu aspecto político ("lato" ou "stricto sensu", como se queira), parece abranger, hoje, mais de um cenário, ou, no mínimo, cenários sucessivos e inconfundíveis o que envolve o legislativo; e o que abrange a atuação do Judiciário).
Pelo volume que ganhou o problema, parece (uma opinião pessoal!) mais do que hora de se reiniciar a discussão sobre a questão (sempre polêmica) da tarifa "Flat", como instrumento de política tarifária única dos serviços telecomunicativos.
Do contrário, ou, a não se iniciar o debate da solução "Flat" para a tarifação, arrisca-se tê-la implantada coercitivamente, pela força de eventual decisão judicial definitiva dos Tribunais, ou, pela própria deliberação proibitiva do Legislativo.
Uma última coisa - com as antecipadas desculpas pelo alongamento na resposta (é que o tema é instigante): não sei se os demais irão concordar, mas me parece que uma eventual proibição da da tarifa-assnatura (seja pela decisão judicial definitiva, seja pela ação legislativa) poderá acarretar efeitos específicos um tanto além daqueles puramente fiscais.
Dentre esses, chama a atenção o da alteração dos contratos pré-celebrados.
Pleitos de re-equilíbrio financeiro de contratos de concessão de telefonia poderão surgir neste cenário, pois, ao serem licitados os serviços e expedidos os editais da licitação (seja quando da desestatização, seja com a delegação posterior de nos serviços telefônicos em regime público), observou-se uma certa estrutura tarifária à época autorizada pela lei brasileira, que assegurava a cobrança.
Ao se modificá-la posteriormente, se estará alterando, inevitavelmente, aquela estrutura contratada para a prestação dos serviços, com afetação conseqüente e direta da receita operacional (pré-licitada) que se fazia admissível.
Na doutrina jurídica - e quando a alteração é promovida por nova lei - damos o nome de "fato do príncipe", e "ele" determina o chamado re-equilíbrio dos contratos de concessão pública..
Pois bem. Se houver isso, teremos então uma causa de oneração do interesse público, que será a do Poder concedente, que terá de, ou recompor diretamente o desequilíbrio, ou reprogramar, compensatoriamente, a restante estrutura tarifária do contrato de concessão alterado (no caso, a tarifa sob demanda-pulsos pode vir a ser escolhida como este instrumento da compensação).
Corremos o risco, portanto, de acabarmos tendo, nós mesmos (os consumidores), de arcar com parte significativa da "conta" desta reestruturação, deste re-equilíbrio econômico-financeiro.
Portanto - e agora sim para finalizar, meu caro Tássilu - se já intensa a questão política (pelo lado das perdas tributárias dos dois entes que tributam a tarifa-assinatura) maior se tornará ela quando analisarmos o próprio fato de que nós mesmos, consumidores, poderemos vir a ser chamados "às contas" (da reestruturação da tarifa-pulso), num "plus" de sacrifício que paradoxalmente terá advindo de um aparente benefício.
Pessoalmente, permitam a insistência, a solução não me parece sair da esfera da discussão sobre a implantação da "Tarifa Flat", como nova política tarifária brasileira.
Abraços (e desculpe o tamanho da resposta...),
Fernando Botelho


ComUnidade WirelessBrasil