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RELATÓRIO A RESPEITO DA PROPOSTA DE ALTERAÇÃO DO PLANO GERAL DE METAS DE UNIVERSALIZAÇÃO DO STFC

Flávia Lefèvre Guimarães

Flávia Lefèvre Guimarães é advogada e coordenadora da Frente dos Consumidores de Telecomunicações, consultora da associação Pro Teste e representante dos usuários no Conselho Consultivo da ANATEL. Sua atuação na ComUnidade WirelessBRASIL está registrada aqui.
 


 

Ref.: Relatório – Alteração do Plano Geral de Metas de Universalização do STFC

Prezado Presidente

Tendo em vista o que determinam os arts. 8°, inc. V; 12, inc. III e art. 17, inc. II, do Regimento Interno do Conselho Consultivo da ANATEL, venho por esta apresentar Relatório referente à proposta de alteração do Plano Geral de Metas de Universalização do STFC – Decreto 4.769, de 27 de junho de 2003, a fim de que seja distribuído entre os demais integrantes do Conselho.

Coloco-me à disposição para esclarecimentos.

Atenciosamente

Flávia Lefèvre Guimarães
Representante das Entidades Representativas dos Usuários


São Paulo, 25 de março de 2008

Ao
Sr. Presidente do Conselho Consultivo
Vilson Vedana

Att.: Sra. Secretária do Conselho Consultivo
Marilda Moreira

RELATÓRIO A RESPEITO DA PROPOSTA DE ALTERAÇÃO DO PLANO GERAL DE METAS DE UNIVERSALIZAÇÃO DO STFC – DECRETO 4.769, DE 27 DE JUNHO DE 2003, DO MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES

I – INTRODUÇÃO

Tendo o em vista o que dispõem o art. 35, inc. I, da Lei 9.472, de 16 de julho de 1997; art. 36, §1°, “a” e art. 42, do Decreto 2.338, de 7 de outubro de 1997 e art. 7°, inc. I, do Regimento Interno do Conselho Consultivo da Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, e considerando:

1) Que em reunião extraordinária, ocorrida no último dia 18 de março deste ano, convocada pelo Presidente do Conselho Diretor – Embaixador Ronaldo Mota Sardenberg – com o objetivo de dar posse a cinco novos membros nomeados pelo Presidente da República, bem como para “dar conhecimento” sobre a proposta do Ministério das Comunicações para o Anexo ao Decreto n° 4.769, de 27 de junho de 2003, que estabelece o Plano Geral de Metas de Universalização para o STFC – PGMU;

2) Que na referida reunião discutiu-se sobre o cabimento do pronunciamento do Conselho Consultivo a respeito do PGMU na atual fase de encaminhamento da proposta de alteração do Decreto 4.769/2003, uma vez que a ANATEL já havia encerrado o processo de Consulta Pública 842/2007 e encaminhado a proposta ao Ministério das Comunicações, sem que o Conselho Consultivo tivesse sido convocado para se pronunciar nos termos da legislação referida acima, durante o período de setembro de 2007 a fevereiro de 2008 (período em que estavam com mandato em vigor sete conselheiros, sendo que dois não empossados, por determinação do Conselho Diretor);

3) Que na referida reunião foi consenso que o Conselho Consultivo tem competência para colocar em pauta as matérias que entender relevantes e, portanto, pode pronunciar-se a respeito da proposta de alteração do PGMU, ainda que o Ministério das Comunicações tenha fechado a questão, como colocado pelo Conselheiro Marcelo Bechara. Até porque a discussão a respeito da inclusão digital das escolas já vem sendo feita no âmbito do Conselho Consultivo há mais de um ano, iniciando-se com a apresentação do Coronel Oliva a respeito dos planos definidos no âmbito do Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, em 18 de julho de 2006;

4) Que na referida reunião em 18 de março último, presidida pelo Conselheiro Vilson Vedana, de acordo com o que dispõe o art. 8°, § 2°, do Regimento Interno do Conselho Consultivo, fui nomeada como relatora do tema;

5) Que, em virtude da relatoria e tomando como base a apresentação da proposta de alteração do PGMU feita pelo representante do Ministério das Comunicações e Conselheiro Consultivo – Dr. Marcelo Bechara, solicitei os seguintes documentos:

a) Processo que originou a elaboração pela ANATEL da minuta de Decreto e aditamento ao Contrato de Concessão;

b) Estudos econômicos que concluíram pela equivalência de custo entre o PGMU hoje em vigor e o que se pretende implantar;

c) Relação, por área de concessão, dos municípios que atualmente não são atendidos por banda larga;

d) Cronograma indicando quais serão os municípios, por concessionária, atendidos em cada fase do novo PGMU;

e) Relação do número de escolas em cada município a ser atendido;

f) A relação das normas que, como colocado na apresentação do Conselheiro Marcelo Bechara, especificam a obrigação de as concessionárias observarem as definições do MEC para atender as escolas;

g) Quantas escolas por área de concessão serão atendidas, tendo em vista a informação prestada pelo Conselheiro Marcelo Bechara, e o respectivo cronograma;

h) Especificações técnicas a respeito da velocidade da banda larga que será disponibilizada para as escolas;

i) Especificações técnicas de como o serviço poderá ser provido, os possíveis provedores e as regras a respeito dos preços;

j) Especificações técnicas a respeito do "moden" que deverá ser fornecido pelas concessionárias às escolas, conforme especificado pelo Conselheiro Marcelo Bechara;

k) Quais os Programas Federais ligados à educação e inclusão digital que estão coordenados com a proposta de alteração PGMU;

6) Que em resposta às solicitações acima, fui informada de que o foco do PGMU não pode extrapolar as questões afetas à implantação de infra-estrutura e que, portanto, outros serviços não poderiam estar compreendidos na proposta de Decreto e que os provedores de serviços serão os autorizados para operar o Sistema de Comunicação Multimídia e que este serviço, relativamente à prestação gratuita para cinqüenta e cinco mil escolas está ligado ao PROINFO
(1) do Ministério da Educação e Cultura;

(1) O Programa Nacional de Informática na Educação (ProInfo) é um programa educacional criado pela Portaria Nº 522/MEC, de 9 de abril de 1997, para promover o uso pedagógico das Tecnologias de Informática e Comunicações (TICs) na rede pública de ensino fundamental e médio.

7) Que recebi os seguintes documentos no dia 19 de março último, as 18:33 h:

a) Nota Técnica resumida da Secretaria de Telecomunicações do Ministério das Comunicações;

b) Parecer da Advocacia Geral da União a respeito da proposta de alteração do PGMU;

c) Lista dos Municípios e Localidades a serem atendidos pelo novo PGMU;

8) Que no dia 24 de março, as 15:00 h, recebi da ANATEL o Informe 16/2007, acompanhado de três anexos, relativos aos estudos econômicos para atendimento da sede dos municípios, faltando o Anexo IV, do qual, ao que parece, constam as informações apresentadas pelas concessionárias a respeito dos custos dos PSTs e backhauls.

Passo a relatar sobre a matéria que me foi submetida, nos termos a seguir descritos.

II – CONTEXTO DO STFC NO BRASIL

A Lei Geral das Telecomunicações determina que:

“Art. 64. Comportarão prestação no regime público as modalidades de serviço de telecomunicações de interesse coletivo, cuja existência, universalização e continuidade a própria União comprometa-se a assegurar.
Parágrafo único. Incluem-se neste caso as diversas modalidades do serviço telefônico fixo comutado, de qualquer âmbito, destinado ao uso do público em geral”.

“Art. 79. A Agência regulará as obrigações de universalização e de continuidade atribuídas às prestadoras de serviço no regime público.
§ 1° Obrigações de universalização são as que objetivam possibilitar o acesso de qualquer pessoa ou instituição de interesse público a serviço de telecomunicações, independentemente de sua localização e condição sócio-econômica, bem como as destinadas a permitir a utilização das telecomunicações em serviços essenciais de interesse público.

Art. 86. A concessão somente poderá ser outorgada a empresa constituída segundo as leis brasileiras, com sede e administração no País, criada para explorar exclusivamente os serviços de telecomunicações objeto da concessão”.

Os contratos de concessão dispõem:

Atualmente, o único serviço de telecomunicações prestado em regime público é o STFC
(art. 64 parágrafo único da LGT)



Também o Tribunal de Contas da União, em processo cujo objeto consistiu na investigação a respeito da falta de utilização do Fundo de Universalização das Telecomunicações, concluiu no Acórdão TCU n° 1.107/2003:

Em função dos dispositivos legais acima, as concessionárias privadas, a partir de julho de 1998, assinaram contratos de concessão com prazo final em 31 de dezembro de 2005, por meio dos quais se obrigaram a cumprir as metas de universalização que viessem a ser fixadas pela ANATEL, o que se deu por meio do Decreto 2.592, de 15 de maio de 1998. Este decreto estabeleceu metas para acessos individuais e para telefones de uso público – os TUPs.

Houve, até 2001, crescimento significativo dos acessos instalados e em uso pelos consumidores; em 1998 havia 20 milhões de acessos em uso e, em 2001, de acordo com Relatório da ANATEL, chegou-se a mais de 37 milhões de acessos em uso. A expectativa, de acordo com a ANATEL é que se chegasse em 2005 com 58 milhões de acessos instalados e em uso.
 



Ocorreu que o preço do serviço, especialmente da assinatura básica, inviabilizou que as metas esperadas de 58 milhões de acessos instalados e em uso fossem cumpridas. A partir de 2001 o número de acessos individuais em uso apresentou crescimento vegetativo e apresentou queda a partir de 2005. O país hoje tem por volta de 37 milhões de acessos em uso, sendo que aproximadamente 20% deste número estão nas mãos de pessoas jurídicas.

Os dados divulgados por meio do último Relatório Anual da ANATEL mostram que a teledensidade atual não atende a expectativa que se tinha, especialmente por força da incapacidade econômica do consumidor residencial de pagar pela assinatura básica, como fica claro com o gráfico abaixo. Há hoje 51 milhões de acessos instalados. Porém estão ociosos mais de 12 milhões de acessos instalados. Este fato é gravíssimo, tendo em vista a inércia da ANATEL de garantir que as receitas obtidas pelas empresas com a cobrança das altas tarifas cumpram a finalidade estabelecida pela Lei Geral de Telecomunicações e pelo primeiro Plano Geral de Metas de Universalização.



Nas classes C, D e E, o decréscimo de acessos em uso é bem acentuado:


Gráfico Apresentado pelo Dr. Luis Guilherme Schymura - FGV em reunião do dia 8.11.2007 na ANATEL



O mesmo vem ocorrendo com os telefones de uso público – TUPs. Segundo o Relatório Anual de 2006:

TUP
A rede de Telefone de Uso Público (TUP) – ou orelhão, como é mais conhecido –, que vinha mantendo a estabilidade de 1,3 milhão de acessos em serviço, desde 2003, caiu para 1,1 milhão de acessos em 2006, com a conseqüente queda da teledensidade – de 6,9/1.000 (2005) para 6,0/1.000 em 2006”.


A redução dos TUPs em uso vem se dando com autorização da ANATEL, com base no argumento das concessionárias de que a utilização dos telefones vem caindo. Entretanto, a Agência não tem considerado que o Decreto 2.592, de 15 de maio de 1998, estabelecia o número de telefones por município, mas não especificava regras para sua distribuição. Em virtude deste fato, houve uma concentração de TUPs em áreas mais centrais, que diminuíam custos de instalação e manutenção para as concessionárias.

Ocorre que, nessas áreas existe maior concentração de acessos individuais em uso e maior capacidade dos usuários de manter um telefone móvel ou um fixo residencial ou comercial; ou seja, considerar-se a redução do tráfego nos TUPs instalados nas condições referidas acima não autoriza a conclusão de que não há demanda da população mais pobre pelos telefones públicos e por telefones residenciais.

Sendo assim, a política que vem sendo adotada pela ANATEL tem penalizado os cidadãos mais pobres que: a) não têm condições financeiras de manter um telefone fixo; b) não têm condições de manter uma linha pós-paga de telefone móvel e se submetem aos absurdos preços – terceiro mais caro do mundo – dos planos pré-pagos; c) estão sujeitos ao regime privado de serviço, sem garantias de acesso e preço e d) não têm mais acesso fácil aos TUPs.

Conclusão: há inegável demanda reprimida de acessos individuais residenciais fixos, principalmente nas classes C, D e E, que não pode ser atendida em virtude do alto preço da assinatura básica residencial e, em muitas localidades, há falta de TUPs, a despeito de a infra-estrutura estar disponível, o que se deu com receita originada do pagamento de altos custos pelos consumidores do plano básico do STFC.

Importante destacar que a justificativa para o alto preço da assinatura básica, assim como para o benefício concedido às concessionárias possibilitando aumentarem este item da cesta de tarifas anualmente, foi a obrigação das concessionárias de cumprirem as metas de universalização, aumentando o número de acessos instalados e a quantidade de TUPs. Ocorre que foi justamente essa ferramenta regulatória, utilizada para viabilizar a universalização, que terminou por criar uma barreira impedindo que os cidadãos possam usufruir da infra-estrutura instalada ao seu alcance.

A despeito dos questionamentos existentes quanto ao efetivo cumprimento das metas de universalização, o certo é que a Agência tem concluído no sentido de que as concessionárias cumpriram suas obrigações. Tanto assim, que puderam renovar os contratos de concessão por mais vinte anos, para o que o cumprimento das metas funcionava como condição sine qua non.

Em suma, a universalização do STFC foi concluída; entretanto, existem mais de doze milhões de acessos instalados ociosos, sem que os cidadãos possam pagar por elas e sem que a ANATEL tenha buscado mecanismos de fazer cumprir a finalidade da garantia de acesso universal ao STFC.


III – A RENOVAÇÃO DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO

Apesar do quadro acima, os contratos de concessão foram renovados, em 22 de dezembro de 2005, mantendo-se a estrutura tarifária, assim como a possibilidade de aumento real de preços ano após ano.

A despeito do grande questionamento da sociedade, que inclusive ajuizou Ações Civis Públicas e Ação Popular, a Agência justificou a manutenção da estrutura tarifária com a permanência da assinatura e seu alto preço, no fato de que as concessionárias teriam pesadas obrigações decorrentes do PGMU, estabelecido com o Decreto 4.769/2003.

Importante considerar, antes de tudo, que a justificativa é altamente questionável, na medida em que, segundo a própria agência, as metas de universalização foram cumpridas. Ou seja, existe infra-estrutura de STFC suficiente à disposição dos cidadãos.

Todavia, a agência entendeu que haveria necessidade de se ampliar a universalização e, para tanto, estabeleceu novas obrigações por meio do Decreto 4.769/2003, por entender que as mesmas tinham relevância social.

Vale frisar, que as obrigações relativas aos TUPs não significarão quase nada para as concessionárias, visto que o decreto estabelece uma obrigação de teledensidade
(2) que coincide com o que já temos hoje, conforme relatório da ANATEL, o que significa que as empresas terão de comprometer pouquíssimo ou nada de suas receitas para garantir o cumprimento dessas metas, que permanecem em vigor com a alteração proposta pelo Ministério das Comunicações:

“DAS METAS DE ACESSOS COLETIVOS
Art. 7° A partir de 1° de janeiro de 2006, nas localidades com STFC com acessos individuais, as concessionárias deverão ter ativado TUPs em quantidades que assegurem que a densidade de TUPs, por setor do PGO, seja igual ou superior a 6,0 TUPs/1000 habitantes.
Parágrafo único. A ativação dos TUPs deve ocorrer de forma que, em toda a localidade, inclusive nas áreas de urbanização precária, existam, distribuídos territorialmente de maneira uniforme, pelo menos três TUPs por grupo de mil habitantes”.

(2)  Art. 7o A partir de 1o de janeiro de 2006, nas localidades com STFC com acessos individuais, as concessionárias deverão ter ativado TUPs em quantidades que assegurem que a densidade de TUPs, por setor do PGO, seja igual ou superior a 6,0 TUPs/1000 habitantes.
Parágrafo único. A ativação dos TUPs deve ocorrer de forma que, em toda a localidade, inclusive nas áreas de urbanização precária, existam, distribuídos territorialmente de maneira uniforme, pelo menos três TUPs por grupo de mil habitantes


O Decreto também estabelece metas para instalação de postos de serviço de telecomunicações, de acordo com as quais:
“Art. 13. Nas localidades com STFC com acessos individuais as concessionárias do serviço na modalidade Local deverão estar ativados, por setor do PGO, PSTs observando as seguintes disposições:
(...)
Art. 14. Cada PST deve dispor de, pelo menos, quatro TUPs, quatro TAPs e facilidades que permitam o envio e recebimento de textos, imagens e gráficos, em modo fac-símile, bem como, deve estar acessível ao público em geral sete dias por semana no horário de oito às vinte horas.
Art. 15. Os TUPs e os TAPs utilizados em PSTs devem permitir o pagamento dos serviços por meio de cartão indutivo, sem prejuízo de outras formas de pagamento, observado o disposto na regulamentação”.

Sob a alegação de que os PSTs não têm relevância social para o país, as concessionárias obtiveram junto ao Ministério das Comunicações o acolhimento da proposta de alteração das metas de instalação dos postos de serviço de telecomunicações nos municípios com cinqüenta mil habitantes em diante, para a instalação em todos os municípios do Brasil, que não tenham acesso a banda larga, de infra-estrutura de backhaul.

O Ministério das Comunicações, diante do problema da classificação dos serviços estabelecida pela Lei Geral de Telecomunicações, que afasta a banda larga da classificação de STFC, buscou o parecer da Advocacia Geral da União, para averiguar a viabilidade da troca, tendo em vista as seguintes ponderações:

O parecer da AGU proferido em junho de 2007 foi no seguinte sentido:



Ou seja, a despeito das limitações legais quanto ao fato de que a infra-estrutura de banda larga não se enquadra na classificação do STFC, a representante da AGU concluiu que “SE A INFRA-ESTRUTURA DE BACKHAUL INTERNET EM BANDA LARGA VIABILIZAR A PRESTAÇÃO DO STFC, POSSIBILITANDO MELHOR QUALIDADE NA PRESTAÇÃO DESTE SERVIÇO, BEM COMO POSSIBILITANDO MAIOR EXPANSÃO DO MESMO EM RELAÇÃO A INFRA-ESTRUTURA ATUALMENTE EXISTENTE, ..., DESDE QUE DEVIDAMENTE JUSTIFICADO PELA ÁREA TÉCNICA COMPETENTE, PODERIA SIM SER IMPLEMENTADO ... EIS QUE SE DESTINARIA A PRESTAÇÃO DO STFC ...”.

Entretanto, a proposta de Decreto não garante que a infra-estrutura será utilizada para a prestação do STFC, de modo a atender a baixa teledensidade da telefonia fixa existente hoje no país, especialmente nas regiões mais pobres e nas classes C, D e E e muito menos para a melhoria da qualidade do serviço, o que coloca em situação de extrema fragilidade jurídica a proposta de norma.

Veja-se, por outro lado, que o procedimento legal para que se incluam novas metas impõe que a ANATEL, 24 meses antes da alteração pretendida, promova audiência pública, a fim de garantir amplo debate com a sociedade, que, como já é noção basilar do direito administrativo, também é parte no contrato de concessão.

Ou seja, ainda que haja consenso entre as concessionárias, o Ministério das Comunicações e ANATEL quanto às pretendidas mudanças, a sociedade deve, obrigatoriamente ser ouvida e ter tempo para se manifestar, pois é a principal interessada; são os usuários, com o preço da assinatura – essa sim classificada como STFC, que irão suportar o custo da extensão das redes de backhauls, que, como reconhecido no parecer da AGU, não se classifica como STFC.

Portanto, podemos afirmar que a proposta do Ministério das Comunicações implica em afronta direta aos arts. 70 e 103, da Lei Geral de Telecomunicações, que dispõem:

“Art. 70. Serão coibidos os comportamentos prejudiciais à competição livre, ampla e justa entre as prestadoras do serviço, no regime público ou privado, em especial:
I - a prática de subsídios para redução artificial de preços.
Art. 103. Compete à Agência estabelecer a estrutura tarifária para cada modalidade de
serviço.
§ 1° A fixação, o reajuste e a revisão das tarifas poderão basear-se em valor que corresponda à média ponderada dos valores dos itens tarifários.
§ 2° São vedados os subsídios entre modalidades de serviços e segmentos de usuários, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 81 desta Lei”.

Entendemos, então, que a proposta de alteração do PGMU não tem respaldo legal, por significar claro subsídio entre modalidades distintas de serviço – o que, aliás já ocorre com o PGMU em vigor – e, mais, por ter sido derivada de processo normativo que desrespeitou a legislação em vigor. Por exemplo, a Consulta Pública 842/2007, foi instaurada em outubro de 2007 e teve prazo de dez dias para apresentação de contribuições, dos quais quatro eram feriados. Ademais, não foram disponibilizados à sociedade quaisquer documentos que pudessem viabilizar uma análise mais profunda da proposta, em clara violação aos princípios inscritos no art. 37, da Constituição Federal e, por fim, a proposta não foi encaminhada ao Conselho Consultivo, como determina o art. 35, inc. I, da Lei Geral das Telecomunicações e art. 42, do Decreto 2.338/1997.

IV – O DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO

Tendo em vista o grande envolvimento e interesse do Ministério das Comunicações no processo de alteração das metas de universalização, depois do parecer da AGU, o Ministro enviou o Ofício 139/2007/MC a ANATEL, em 18 de julho de 2007, do qual constou:



O estudo econômico realizado pela ANATEL estava finalizado em 14 de dezembro de 2007, concluindo pela viabilidade da alteração. Importante destacar que os documentos entregues não indicam outras fontes de informação a respeito dos custos além daquelas que foram prestadas pelas próprias empresas interessadas. Veja-se o que dispõe o informe:



Os estudos apontam, ainda, que há situações e conjunturas absolutamente distintas para cada uma das três concessionárias que demandam uma análise econômica mais consistente e aprofundada, a fim de se garantir não só a equivalência econômica entre as metas estabelecidas em 2003 e as constantes da proposta de alteração, mas também para se verificar se o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos está ou não sendo mantido e que a alteração permitirá que se respeite o princípio da modicidade tarifária, pois estamos tratando de serviço público essencial, prestado no regime público.

Isto porque, no caso da Telesp – Telecomunicações de São Paulo S/A, controlada pelo grupo Telefônica, dentre os 622 municípios, somente 268 não têm banda larga e deverão receber os backhauls.

Veja o quadro elaborado pela Secretaria de Telecomunicações do Ministério das Comunicações:



No caso da Telefonica, é fácil entender que a obrigação de instalação de PSTs, nos moldes estabelecidos pelo Decreto em questão, implica em muito mais custos, não só para instalar, mas também porque inclui a manutenção dos mesmos, disponibilização de prédios, contratação de funcionários para a operação dos postos, entre outros.

Por outro lado, considerando-se as características sócio-econômicas da área de concessão da Oi, é evidente que a extensão de infra-estrutura a todos os municípios sem backhaul significará enormes investimentos que, muito provavelmente, significarão mais custos do que a instalação e manutenção dos PSTs.

Este fato é relevante, na medida em que, na proposta de alteração do Decreto, consta que o art. 13 passaria a ter a seguinte redação:

“Art. 13. A concessionária deverá instalar backhaul nas sedes dos municípios e localidades ainda não atendidos, em suas respectivas áreas geográficas de concessão, observadas as seguintes disposições:
(...)
§ 1° As despesas e as receitas resultantes da implementação do disposto no caput, assim como o eventual saldo dos recursos, serão apurados, até 31 de julho de 2009, em forma a ser estabelecida por regulamento da ANATEL.
§ 2° Verificando, nos termos do disposto no § 1°, eventual saldo positivo, este será utilizado na ampliação do backhaul, o que se dará pelo atendimento a localidades a que se refere o caput ou, em já estando todas as localidades atendidas, pelo aumento das capacidades mínimas de transmissão, na forma de regulamento a ser estabelecido pela ANATEL”.

Ou seja, apesar de a proposta prever a hipótese de sobrar recursos para as concessionárias, já havendo, inclusive, previsão de novas obrigações para absorvê-los, não deixa claro como se dará a compensação decorrente de eventual saldo negativo, nos casos em que, eventualmente, os custos inicialmente previstos para a instalação dos PSTs sejam inferiores aos recursos necessários para cumprir as metas.

Havendo saldo negativo por conta da implementação dos backhauls, as empresas irão solicitar a aplicação de mecanismos tarifários para compensarem as pretensas perdas ou, ainda, a depender dos entendimentos firmados com o Ministério das Comunicações e projetos de leis que tramitam no Congresso Nacional, as concessionárias poder-se-ão utilizar de recursos públicos – o FUST, no caso, para suportarem as obrigações do PGMU. Mas a proposta de alteração do decreto curiosa e surpreendentemente não trata desta hipótese.

De qualquer forma, o certo é que a alteração das metas de forma genérica para as três concessionárias, até em face dos números apresentados pela Secretaria de Telecomunicações do Ministério das Comunicações, é absolutamente injusta, pois a proposta de alteração não apresenta mecanismos de correção destas incontornáveis distorções, o que implicará em riscos para o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão, para o cumprimento do princípio da modicidade tarifária; ou seja, para a garantia de acesso do STFC ao consumidor.

Veja-se o mapa da penetração de banda larga (serviço residencial e soho – distribuição das tecnologias de banda larga por municípios) no país:



O mapa acima deixa claro que não existe equivalência entre as situações de cada uma das concessionárias e que a necessidade de maiores investimentos nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste, poderá implicar em aumento de tarifa para os usuários do STFC.

V – A UNIVERSALIZAÇÃO DA BANDA LARGA – INCLUSÃO DIGITAL

Dados recentes divulgados por meio da publicação Atlas brasileiro de telecomunicações – 2008, da Teletime, informam que:

Crescimento em alta velocidade
Acesso por cabo e ADSL ganha fôlego no país, com aumento no número de assinantes e nas capacidades de banda contratadas
A banda larga (compreendidos aqui os serviços residenciais prestados sobre redes de cabo e ADSL) foi o serviço que mais se expandiu territorialmente em 2007, e foi também aquele que mais puxou para cima as margens de lucro das operadoras de cabo e telefonia fixa.
O ADSL chega hoje a 2.135 cidades brasileiras, 38,4% dos municípios. Parece pouco, mas estas cidades concentram 74,2% da população brasileira (140,2 milhões de habitantes) que respondem por 87,17% do consumo nacional de bens e serviços. Ou seja, a maior parte do mercado nacional está em cidades com este serviço disponível, embora, é sempre bom lembrar, isso não signifique que a cobertura atinja tota a população necessariamente”.
(...)
Crescimento
A banda larga rivaliza com o celular o posto de serviço que mais cresceu nos últimos anos. (...) Desde então [2004], o crescimento vem sendo da ordem de mais de 50% ao ano”.

O gráfico abaixo ilustra bem a realidade descrita:



VI – A CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DE SE TROCAR OS PSTS PELA INFRA-ESTRUTURA DE BACKHAULS INDISCRIMINADAMENTE

Sendo assim, é pertinente perguntarmos: Partindo do pressuposto de que seria possível subsidiar a universalização da banda larga – que não se classifica como STFC, com receita originada do STFC – serviço essencial, prestado em regime de monopólio, pois a previsão de competição com a entrada das empresas espelhos não se concretizou, não se desenvolve como planejado e sua penetração é uma das menores da América Latina, e, por outro lado, se a banda larga vem mostrando crescimento firme na penetração, na ordem de 50% ao ano, o que justificaria a troca de metas no atual cenário?

O Ministério das Comunicações tem acenado com a justificativa de que a alteração das metas possibilitará que, até 2010, cinqüenta e cinco mil escolas estarão conectadas ao serviço de banda larga, como resultado da proposta de alteração das metas, segundo as informações prestadas por seu representante no Conselho Consultivo, na última reunião ocorrida no dia 18 de março deste ano, ocasião em que veio apresentar aos conselheiros a versão final do Decreto já enviado à Casa Civil.

Na exposição de motivos da proposta de alteração o Ministro faz as seguintes ponderações:


Das ponderações acima, podemos concluir que a proposta incluiria alguma “atuação sinérgica das infra-estruturas de comunicação com programas pedagógicos do setor de educação para, de fato, transformar a informação em conhecimento e criar as bases efetivas rumo à inclusão digital”.

Todavia, quando perguntamos quais programas pedagógicos estariam coordenados com a proposta ora em análise, informou-nos o Conselheiro Marcelo Bechara que o PGMU não pode incluir outras obrigações que não digam respeito diretamente com o STFC e que, além disso, a política de universalização em questão não está coordenada com qualquer outra política educacional, que tenha como objetivo a inclusão digital das escolas.

Segundo o Conselheiro – representante do Ministério das Comunicações, é o Serviço de Comunicação de Multimídia relacionado com o Programa Nacional de Informática na Educação – PROINFO, desenvolvido pelo Ministério das Comunicações que irá cumprir o papel anunciado.

Examinando o referido programa, verificamos que a escola, para ser beneficiária, deve preencher uma série de requisitos que milhares de escolas brasileiras não têm como cumprir. Corrobora essa afirmação, matéria jornalística veiculada em 11 de novembro de 2007, pela Rede Globo de Televisão, que podemos assistir acessando o link: http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM753487-7823-AS+PIORES+ESCOLAS+DO+BRASIL,00.html 

A matéria mostra escolas em municípios nos estados do Maranhão, Alagoas, Minas Gerais e Mato Grosso. São escolas que funcionam embaixo de árvores, escolas de taipa, sem piso, sem porta, sem teto, em condições extremamente comprometidas de segurança e que não possuem a mínima condição material de receber computadores para a utilização da banda larga. Além disso, os professores têm formação profissional comprometida, inviabilizando a utilização dos equipamentos de informática e, consequentemente dos serviços.

Ressaltamos que muitas outras escolas no Sul e Sudeste também não têm condições de infra-estrutura para se beneficiarem do PROINFO.

Os requisitos do PROINFO são:

1- PRÉ-REQUISITOS
Segue, abaixo, um conjunto de recomendações que irão subsidiar a elaboração de um plano para a montagem de um laboratório de informática na Escola, de forma a serem evitados problemas básicos de infra-estrutura, assim como, venham a propiciar um ambiente adequado ao desenvolvimento de projetos educacionais.

- O laboratório de informática deverá contemplar, no mínimo, 2m² para cada computador a ser instalado, de forma a garantir um mínimo de espaço para a operação dos equipamentos pelos respectivos alunos, provendo um ambiente de aprendizagem agradável e confortável;

- O laboratório de informática deverá estar protegido de forma adequada contra agentes agressivos (areia, poeira, chuva etc) e distante de tubulações hidráulicas visando garantir a integridade dos equipamentos a serem instalados, bem como a dos ocupantes do laboratório, tendo em vista que tais agentes agressivos não só podem danificar os equipamentos como também provocarão desconforto aos alunos e/ou demais ocupantes dos laboratórios.

- Temperatura ambiente de no máximo 30° C, nas condições previstas para a operação
(equipamentos + alunos). Se não for possível em condições naturais, deverá ser instalado um aparelho de ar condicionado de, no mínimo, 18.000 BTU. Tendo em vista as especificações técnicas de temperatura para o funcionamento dos equipamentos, bem como para o conforto dos ocupantes do laboratório (levando-se em consideração sua ocupação total, em qualquer período do ano), sempre que a temperatura dentro do laboratório possa ultrapassar os 30° centígrados, torna-se obrigatória à instalação de ar condicionado de forma a adequar a temperatura ambiente, promovendo maior conforto e garantindo o bom funcionamento dos equipamentos instalados.

- Tomadas elétricas comuns para uso geral não podem ser compartilhadas com a rede elétrica para os equipamentos de informática devido, principalmente às interferências e oscilações geradas por aparelhos como: liquidificadores, enceradeiras, geladeiras, ar condicionados etc, que podem vir a causar danos nos estabilizadores e fontes de alimentação dos equipamentos, chegando a provocar a queima destes.

- Ausência de falhas estruturais na alvenaria do prédio – infiltrações, rachaduras, umidade, mofo etc. cuja existência compromete a segurança tanto dos ocupantes dos laboratórios, como dos equipamentos nele instalados.


Incontornável, então, o lamentável fato de que a grande maioria das escolas brasileiras, especialmente as do Centro-Oeste, Norte e Nordeste, não preenche os requisitos acima e, portanto, não terá condições de se beneficiar da política pública anunciada.

Sendo assim, ainda que a bandeira de se levar banda larga a cinqüenta e cinco mil escolas até 2010 seja de grande apelo social, temos a obrigação de lidar com a realidade de que, antes, o país deve garantir condições mínimas materiais para que possam funcionar e, principalmente, garantir melhores condições de formação e salários para os professores.
Entretanto, a política anunciada pelo Ministério das Comunicações, está desvinculada de qualquer política de inclusão digital e não faz qualquer referência à conexão das escolas. A proposta está baseada na extensão de infra-estrutura que não se classifica como STFC e será subsidiada com receita originada do STFC, o que lança as finalidades alardeadas em alto grau de incerteza jurídica e prática, inadequada ao volumoso recurso que necessariamente absorverá da massa dos consumidores.

Ademais, já existem outros programas federais como o Gesac – Governo Eletrônico Serviço de Atendimento ao Cidadão e o Casa Brasil, em desenvolvimento, no sentido de garantir a inclusão digital.

Aduzimos, outrossim, que segundo informações do representante do Ministério das Comunicações, que se confirmam com o teor da proposta de alteração do Decreto, que não traz dispositivos legais que garantam a efetiva utilização do serviço, a última milha da infra-estrutura a ser entregue nas escolas deve ser desenvolvida por outras empresas que não as concessionárias.

Nessa direção, importante destacar que nem a proposta ora em tela e nem qualquer outra proposta de norma que a complemente ou regule, expressa qualquer orientação no sentido de como o serviço chegará às escolas, se haverá regra de preço, de modo a garantir que não se venha por a perder a finalidade que motiva a pretendida alteração do PGMU.

Na esteira da análise a respeito da conveniência e oportunidade da alteração do PGMU, neste momento e da forma como está sendo proposta, não se deve esquecer de considerar que o contrato de concessão estabelece:


Fica claro, então que, por se tratar de contrato público, o Poder Concedente tem atribuição legal (Lei 8.666/93) para impor unilateralmente novos condicionamentos. E os contratos de concessão trazem essa possibilidade, além da imposição de novas metas de universalização.

Assim, considerando que os trabalhos para elaboração da revisão contratual prevista para dezembro de 2010 já estão em curso na ANATEL, esta oportunidade deveria ser levada em conta, ao invés de se atropelar o andamento da concessão estabelecido contratualmente, sem que o tema tenha sido devidamente debatido pela sociedade, que é quem vai pagar a conta.

Por fim, não devemos deixar de mencionar que, para o sucesso das finalidades anunciadas pelo Ministro das Comunicações, a definição quanto às licitações de novas tecnologias sem fio é fundamental. Porém, o fato é que a licitação do Wimax está suspensa, justamente por dúvidas quanto ao papel das concessionárias na participação deste segmento do mercado; questão que, com a alteração pretendida, se torna ainda mais relevante, tendo em vista a grande dominância que as concessionárias passarão a ter com a implementação da rede de backhaul.

VII – O SCM E A URGENTE NECESSIDADE DE DESAGREGAÇÃO DAS REDES

Repita-se que, de acordo com os planos do Ministério das Comunicações, o serviço a garantir o acesso à banda larga será o Serviço de Comunicação Multimídia. Segundo o representante do Ministério, esse serviço não pode ser incluído no PGMU por impedimentos legais, pois não se poderiam impor às concessionárias obrigações que não se classifiquem como STFC.

Ora, a resposta é um contra-senso, pois o próprio Ministério das Comunicações, por meio de parecer da Secretaria de Telecomunicações reconhece que a banda larga não se classifica como STFC, mas pretende a alteração do PGMU impondo esta obrigação às concessionárias.

Por outro lado, é claro que a última milha poderia sim ser prestada pelas concessionárias, assim como fazem com o ADSL – tecnologia que permite levar a banda larga ao terminal do assinante final, sem que sejam desrespeitados o arcabouço legal das telecomunicações e os contratos de concessão. Veja-se, nesse sentido, a enorme penetração que as concessionárias têm em suas áreas de concessão:



São as três concessionárias: Telefonica, Brasil Telecom e Telemar, que lideram a penetração, justamente porque detêm o uso exclusivo da rede de infra-estrutura e, com base no Serviço de Comunicação de Dados, podem prestá-lo aos assinantes do STFC, a despeito do que estabelece os arts. 68 e 69, da Lei Geral das Telecomunicações.

No mesmo Atlas das Telecomunicações de 2008, já referido acima, encontramos o seguinte:

“Competição
No Brasil, as redes das telefônicas ainda são dominantes quando o assunto é acesso em banda larga. As redes ADSL contam com 5,28 milhões de assinantes, contra 1,6 milhão de assinantes de cable modem/MMDS (dados de setembro de 2007). Ou seja, as teles detêm mais de 76% do mercado.
A líder do segmento é a Telefonica, com 1,94 milhão de assinantes de seu serviço Speedy, um share de 28% do mercado”.

Acresça-se a esse quadro o fato de que as três concessionárias já possuem autorizações para operar o SCM e, portanto, têm o maior interesse em poder subsidiar a extensão de suas redes. E, mais, havendo saldo negativo por conta da implementação dos backhauls, como já dissemos anteriormente, as empresas irão solicitar a aplicação de mecanismos tarifários para compensarem as pretensas perdas ou, ainda, a depender dos entendimentos firmados com o Ministério e da aprovação de projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional, utilizarem-se de recursos públicos – o FUST, no caso, para suportarem as obrigações do PGMU e subsidiarem a extensão da rede que, se não houver atuação regulatória no próprio decreto, irão ficar restrita a gerar benefícios exclusivamente para elas, impondo graves prejuízos ao ambiente competitivo.

É evidente que a orientação adotada pelo Ministério das Comunicações, sem amarras regulatórias, acirrará o quadro de dominância de mercado pelas três concessionárias, pois os provedores de serviço estarão sujeitos ao pagamento pelo uso da rede para proverem o serviço, competindo, portanto, em condições absolutamente desiguais com as concessionárias.

Esse quadro poderia mudar, caso a ANATEL cumprisse sua obrigação estabelecida no art. 71, da Lei Geral das Telecomunicações, e regulamentasse o que já deveria ter feito há anos, a desagregação da rede – que é pública e implementasse o modelo de custos, que já deveria, pelas normas do setor, estar implementada desde janeiro deste ano.

Recebemos contribuição da Associação Brasileira dos Usuários de Acesso Rápido À Rede Internet – ABUSAR, onde constam os seguintes questionamentos (anexo 1):

“1) Como o Ministro poderia afirmar que não vai haver subsídio direto, se é óbvio que ao imputar metas de universalização de serviços de comunicação de dados para as concessionárias do STFC, isto as tornará aptas a utilizarem os recursos do FUST, nos termos do art. 5º da lei 9.998/00, objetivo que vem sendo perseguido pelo Minicom e pela Anatel desde 2001?

2) Como o Ministro poderia falar em ampla competição se, no caso das localidades ainda não atendidas pelas redes IP, as concessionárias serão detentoras do monopólio dos "PoPs" instalados nas prefeituras, a partir dos quais poderão implementar "backhaus" para atender aos usuários finais graças as autorizações de SCM que foram outorgadas à elas?

3) Que competição é essa, na qual as concessionárias do STFC poderão explorar serviços com custo zero de "link IP", enquanto as suas concorrentes serão obrigadas a contratar "links" dessas empresas pagando os preços que elas bem entenderem?

4) Por que o governo fica alardeando que pretende promover a inclusão digital, se a presente proposta demonstra apenas a existência de um acordo comercial, no qual, em troca da liberação das verbas do FUST e nas suas transformações em operadoras multi-serviços, as concessionárias do STFC oferecem o fornecimento de conexões gratuitas à rede internet para 55 mil escolas públicas?”.


Por conseguinte, entendemos que a validade e garantia de efetividade da proposta em análise dependem essencialmente da implementação urgente da desagregação da rede e implementação do modelo de custo, sem o que as finalidades anunciadas estarão definitivamente comprometidas.


VIII – CONCLUSÃO

1. Banda larga não pode ser classificada como STFC e, portanto, sua implementação não pode ser subsidiada com receita proveniente deste serviço. O Poder Executivo, para utilizar os recursos do STFC e do FUST, deve criar nova modalidade de serviço público, como orientou o TCU:


2. A parte dos estudos econômicos que me foram apresentados, realizados pela ANATEL, não é suficiente para garantir que a equivalência econômica entre as metas em questão esteja presente e muito menos que a garantia do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão e do cumprimento do princípio da modicidade tarifária estão assegurados.

3. A universalização do STFC, no que tange à infra-estrutura, já foi cumprida; resta, entretanto, a adoção pela ANATEL de medidas que garantam o fim da barreira do preço para que os cidadãos das classes C, D e E possam ter acesso ao serviço de voz, sem estarem sujeitos à telefonia móvel, prestada no regime privado e, portanto, sem obrigação de universalização (há mais de dois mil municípios sem sinal de telefonia móvel), e à quarta tarifa mais cara do mundo (estudo Merrill Lynch).



4. A falta de definições a respeito de como a última milha do serviço será prestada compromete definitivamente:

a) O cronograma anunciado pelo Ministério das Comunicações, no sentido de que até 2010, cinqüenta e cinco mil escolas estarão ligadas na banda larga;

b) A competição no setor, pois acirra a posição de poder dominante das concessionárias.

5. Admitindo-se o pressuposto sobre o qual trabalhou a Secretaria de Telecomunicações do Ministério das Comunicações, qual seja, de que a backhaul internet em banda larga se enquadra na classificação de STFC, a última milha poderia ser prestada pelas concessionárias por meio do ADSL, como já fazem de forma dominante em suas áreas de concessão e, portanto, essa obrigação poder-lhes-ia ser imposta.

6. Levando-se em conta as diferenças e déficits regionais, é fundamental que se incluam no Decreto especificações a respeito do cumprimento das metas, indicando-se qual o cronograma de atendimento a cada um dos municípios que serão atendidos e se especifiquem a origem das receitas para garantir o cumprimento das metas nas localidades situadas nas regiões onde há baixa ou nenhuma penetração de infra-estrutura de banda larga, bem como sistema eficiente de fiscalização de custos.

7. O Decreto deveria abordar no art. 13, § 2°, a hipótese de haver saldo negativo em desfavor das concessionárias, assim como qual será a origem da receita a suportar a diferença, sem comprometer a modicidade tarifária.

8. A proposta de alteração do PGMU, apesar de estabelecer que as concessionárias devem disponibilizar o acesso à infra-estrutura, preferencialmente, à implementação de políticas públicas (§ 5°, art. 13), não garante que as concessionárias devam ofertar o acesso a outras empresas que venham a contribuir para a implementação da política pública anunciada a preços razoáveis e isonômicos, garantindo modicidade e condições de competição.

9. A proposta de alteração do PGMU não traz qualquer referência à garantia de acesso gratuito do serviço de banda larga para as escolas, a ser prestado pelas concessionárias e nem faz referência a outras ferramentas contratuais ou regulatórias que assegurem o benefício.

10. A falta de coordenação entre o PGMU e outros programas voltados para a inclusão digital, no âmbito do Ministério da Educação e Cultura, é fator que enfraquece o caráter de política pública que se pretende atribuir à alteração anunciada; não há na proposta de alteração nenhum dispositivo legal que faça qualquer referência ao atendimento de escolas. O TCU manifestou-se em sentido diverso do que entende o representante do Ministério das Comunicações no Conselho Consultivo, no sentido de que tal matéria não poderia ser incluída. Veja-se a transcrição do resumo do acórdão já mencionado:


11. A regulamentação da desagregação das redes e implementação do modelo de custos são fundamentais para o sucesso da pretendida política, sem o que se manterá a preponderância das concessionárias nos mercados de banda larga e comunicação multimídia, impedindo-se a competição protegida pela Lei Geral de Telecomunicações, contribuindo-se para a manutenção dos altos preços do mercado brasileiro e, consequentemente, inviabilizando o acesso para as classes de baixa renda.

Portanto, a despeito de reconhecermos que para algumas regiões do país – Sul e Sudeste – cabem questionamentos quanto à relevância social dos PSTs, entendemos que tal fato não implica em se reconhecer legalidade e relevância para a proposta de alteração, especialmente quando se considera que o alegado ganho a ser realizado por meio dos backhauls seria a inclusão até 2010 de cinqüenta e cinco mil escolas no sistema de banda larga.

Primeiro porque os consumidores do STFC subsidiarão com as altas tarifas excludentes um imenso ganho para as concessionárias, que poderão utilizar em caráter exclusivo as redes instaladas, e, segundo, pela absoluta ausência de garantias na proposta de decreto no sentido de que as escolas terão condições de desfrutar da infra-estrutura a ser implantada, por absoluta falta de coordenação do PGMU com outros programas educacionais e de inclusão digital promovidos por outros Ministérios.

Sendo assim, passo ao meu voto:
É indiscutivelmente positiva a extensão da rede de backhaul por todo território nacional, principalmente por se tratar de ativos que, ao final da concessão, serão reversíveis ao patrimônio da União, e, mais, uma vez que se constitui como medida essencial para a universalização da banda larga no país, meio valioso de propagação de educação e cultura.

Porém, para que os benefícios anunciados possam de fato ser alcançados, é fundamental que sejam observados os seguintes aspectos:

1. Aprofundamento dos estudos econômicos para verificação da equivalência dos custos dos PSTs e backhauls, a fim de se garantir o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão;

2. Inclusão, no próprio decreto, de dispositivos que garantam preços razoáveis e isonômicos para os consumidores e prestadores do SCM, preservando-se a modicidade tarifária e a competição;

3. Inclusão, no próprio decreto, de garantias de prazo para a desagregação da rede de backhaul internet banda larga;

4. Inclusão, no próprio decreto, de previsão a respeito da hipótese em que haja saldo negativo entre o custo previsto para os PSTs e backhauls, indicando-se o mecanismo de reequilíbrio contratual;

5. Inclusão, no aditamento ao contrato de concessão, de cronograma indicando os municípios a receberem a infra-estrutura em cada fase do PGMU;

6. No bojo do processo de revisão dos contratos de concessão iniciado em 2007 e início de vigência em janeiro de 2011, seja revista a estrutura tarifária, especialmente quanto aos Planos Básicos e PASOO, a fim de evitar que o serviço de telefonia fixa local passe a subsidiar a universalização da banda larga, que trará ganhos para a sociedade, mas também trará grandes ganhos para as concessionárias, que poderão passar a vender serviços de comunicação multimídia;

7. No âmbito do processo normativo da ANATEL, que, em caráter de urgência, sejam definidas as regras de desagregação da rede e implementado o modelo de custos;

8. Sejam adotadas as medidas para se coordenar a política anunciada com a alteração das metas de universalização com outras políticas voltadas para a inclusão digital, educação e cultura;

9. Sejam apresentadas as ferramentas regulatórias ou contratuais que garantam o acesso gratuito de banda larga para as escolas de todo o país;

Esperando ter atendido ao regimento do Conselho Consultivo da ANATEL e contribuído para ampliar o debate quanto à matéria de grande relevância social, coloco-me à disposição para esclarecimentos.

Atenciosamente

Flávia Lefèvre Guimarães
Representante das Entidades Representativas dos Usuários
 

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