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28/11/12

• Loteamento das Agências Reguladoras (2) - Editorial O Globo: "Resultado do aparelhamento das agências"

Olá, WirelessBR e Celld-group!

01.
Motivado pelo escândalo da hora, estou reciclando e revitalizando um "post" de fevereiro deste ano no WirelessBRASIL.
O link está aqui: [10/02/12]  Loteamento de agências reguladoras.

O "loteamento" (ou melhor seria "aparelhamento"?) volta à mídia na repercussão da investigação da PF que atingiu o núcleo central do Governo (de novo...).
Creio que este assunto, mesmo quando tratado genericamente, é de nosso particular interesse pois não exclui a Anatel, a agência que regula a área em que atua grande parte dos participantes dos fóruns.

O texto do "post" referenciava uma coluna de Mariana Mazza e registrava dois artigos, todos novamente transcritos no final desta página, com a recomendação, devido à continuada atualidade, de "vale conferir ou ler de novo".
Aqui estão as manchetes e os inevitáveis "recortes para salivação":  :-)

Leia na Fonte: Portal da Band - Colunas
[07/02/12]   Mais controle sobre as agências - por Mariana Mazza
Recorte:
(...) Há oito anos a campanha política para aumentar o controle sobre as ações das agências reguladoras atingia o auge. O governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nunca simpatizou com essas autarquias, símbolos das privatizações da era FHC. Dilma Rousseff, na época ministra de Minas e Energia, não dava refresco à Aneel, que perdeu boa parte de seus poderes durante a reforma do setor elétrico promovida no governo Lula. Enquanto isso, a Casa Civil, comandada por José Dirceu, elaborava seus planos de unificação das leis que regem as agências, devolvendo aos ministérios boa parte da gestão dos setores regulados. O projeto mais polêmico sobre o tema, enviado ao Congresso em 2004, é de autoria da própria Casa Civil.(...)

Leia na Fonte: O Globo
[07/06/08]   O erro original - por Míriam Leitão
Recorte:
(...) A agência é um órgão de Estado, e não do governo. A idéia é que seja um organismo independente de todas as pressões. Defende o mercado da ingerência indevida do governo; defende a sociedade das distorções criadas pelo mercado; defende as empresas participantes do abuso de poder de mercado de empresas dominantes.(...)

Fonte: Estadão - Editorial
[18/06/08]   Loteamento de agências   (Obs: link original descontinuado)
Recorte:
(...) Desde o início do primeiro mandato, o governo do presidente Lula vem trabalhando para destruir o sistema de agências reguladoras. Agências desse tipo, existentes em países desenvolvidos, são órgãos de Estado, não de governo. Devem funcionar com independência política, proporcionando estabilidade e previsibilidade às condições de investimento em setores básicos, como energia, transportes e telecomunicações. O presidente Lula e seus principais auxiliares nunca aceitaram essa concepção, assim como jamais aceitaram os critérios de impessoalidade e competência na gestão pública.(...)

02.
Por extremamente oportuno, transcrevo um editorial d'O Globo de ontem, que não trata especificamente da Anatel:

Leia na Fonte: Noblat / O Globo
[27/11/12]  Resultado do aparelhamento das agências - Editorial O Globo
recorte:
"Logo ao assumir no primeiro mandato, em 2003, o presidente escolheu as agências reguladoras como alvo. Talvez pelo fato de elas terem relação direta com o programa tucano de privatização — tema explorado pelo PT —, não importou que fossem um instrumento inspirado nas boas práticas internacionais de modernização da administração pública.
Nada mais equivocado do que considerar que as agências “terceirizavam” o poder do Executivo. Ora, elas foram criadas como organismos independentes aos governos para, sem qualquer tipo de interferência, fiscalizar a prestação de serviços de concessionários de áreas em muitas das quais houve transferência de empresas públicas para o setor privado e concessão de exploração de serviços a empresas particulares.
Mas o governo Lula acabou, na prática, com a independência das agências, tratando-as como autarquias menores de ministérios, à disposição do jogo político fisiológico de troca de cargos e verbas por apoio no Congresso e em eleições.(...)

03.
A competente e prestigiada jornalista Dora Kramer, que escreve sobre política em vários jornais, cita uma novidade em relação ao aparelhamento das agências, em sua coluna de ontem:

Leia na Fonte: O Estado de S. Paulo
[27/11/12]  Tolerância continuada - por Dora Kramer
Recorte:
(...) Fala-se que Dilma Rousseff quer aproveitar o ensejo para acabar com as indicações políticas nas agências reguladoras. Antes tarde. Mas poderia ter sido bem mais cedo. Aliás, poderia nem ter sido necessário mudar o rumo. Quando o PT chegou à Presidência a crítica central às agências era seu excessivo caráter de independência em relação ao poder político, exatamente por terem sido concebidas como instrumentos de controle. Originalmente elas seriam uma espécie de ministério público da prestação de serviços públicos praticados pela iniciativa privada."

04.
O assunto "loteamento" e "agências como órgãos de estado e não de governo" é recorrente em nossos fóruns e aqui estão alguns links de "posts" anteriores:

28/05/12
Editorial do Estadão: "As pressões sobre as agências"
04/12/09
Loteamento da Anatel + Juiz de Fora + Manaus... Outras?
22/07/09
Msg de José Roberto S. Pinto - Da série "Loteamento": Anatel loteada, aparelhada, capturada, sitiada...
17/07/09
Matérias do Estadão com opiniões de Flávia Lefèvre: Inoperância e "loteamento da Anatel" + "Panes nas teles"
05/06/09
"TCU critica Anatel" + "Loteamento da Anatel": João Rezende
09/05/09
"Loteamento da Anatel": João Rezende aprovado + "Não sou pascácio, na Anatel também quero um Nicácio" + Dora Kramer: "De onde menos se espera é que saem as melhores surpresas"
20/02/09
"Loteamento" da Anatel: "Resumo" + Rateio político coloca João Rezende na Anatel indicado pelo PT
19/01/09
"Loteamento" da Anatel: "Sucessão no congresso tem reflexos na Anatel" - Artigo do Estadão
01/09/08
Emilia Ribeiro e o "loteamento" da Anatel
18/06/08
Fusão Oi/BrT e PGO (11) - Editorial do Estadão: "Loteamento de Agências"

05.
Recentemente Paulo Bernardo declarou:
(...) A Anatel é um órgão de Estado, com pessoas indicadas pela presidenta que passam por sabatina no Senado e quadro técnico de carreira. É um órgão caracterizado como de Estado, faz reuniões públicas, se enquadra na Lei de Acesso à Informação e toma decisões após consulta pública", argumenta ele.(...)

05.
Creio que um bom complemento para este assunto polêmico é este trecho de uma mensagem do nosso sumídíssimo (mas possivelmente atento!) participante Rogério Gonçalves quando, em 2010,  opinei e fui contestado por ele:

"Se a Anatel não é, "no papel", um órgão de Estado, é de todo desejável que assim fosse e um governo realmente sério deveria estimular seu funcionamento como tal."

Rogério Gonçalves:
(...) O impedimento para a Anatel se tornar um Órgão de Estado (em maiúsculas e sem aspas) não está na vontade do governo da vez e sim na Constituição Federal, mais especificamente nos artigos 1º e 18º, que tratam da organização político-administrativa da República Federativa do Brasil.

Para uma agência reguladora poder desfrutar do status de Órgão de Estado, seria necessário, em primeiro lugar, que ela não fosse instituída como uma autarquia pela sua lei de criação, pois autarquias, especiais ou não, sempre precisam ser vinculadas aos ministérios responsáveis pelas suas áreas de atuação e isso as relega, inevitavelmente, à condição de reles apêndices do Poder Executivo (órgãos da administração indireta).

Em segundo lugar, seria necessária uma emenda à Constituição, dando às agências reguladoras a mesma autonomia político-administrativa que é atribuída à União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal, de forma a equipará-las a estes entes federativos e é aí que a suína torce o rabicó pois, como o inciso I do § 4º do art. 60 da CF determina que qualquer emenda propondo alterações na forma federativa de Estado não será objeto de deliberação (tornando cláusulas pétreas os arts. 1 e 18), resulta que, para transformar as agências reguladoras em Órgãos de Estado, seria necessário convocar uma nova Assembléia Constituinte!!! (...)


Boa leitura!
Um abraço cordial
Helio Rosa
Portal WirelessBRASIL

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Leia na Fonte: Noblat / O Globo
[27/11/12]  Resultado do aparelhamento das agências - Editorial O Globo

Logo ao assumir no primeiro mandato, em 2003, o presidente escolheu as agências reguladoras como alvo. Talvez pelo fato de elas terem relação direta com o programa tucano de privatização — tema explorado pelo PT —, não importou que fossem um instrumento inspirado nas boas práticas internacionais de modernização da administração pública.

Nada mais equivocado do que considerar que as agências “terceirizavam” o poder do Executivo. Ora, elas foram criadas como organismos independentes aos governos para, sem qualquer tipo de interferência, fiscalizar a prestação de serviços de concessionários de áreas em muitas das quais houve transferência de empresas públicas para o setor privado e concessão de exploração de serviços a empresas particulares.

Mas o governo Lula acabou, na prática, com a independência das agências, tratando-as como autarquias menores de ministérios, à disposição do jogo político fisiológico de troca de cargos e verbas por apoio no Congresso e em eleições.

O mais novo escândalo patrocinado pelo grupo hegemônico no PT, deflagrado em torno da chefe de gabinete do escritório da Presidência em São Paulo, Rosemary Nóvoa de Noronha, é um caso de corrupção decorrente, entre outras causas, da degradação das agências reguladoras.

Se elas não houvessem sido atraídas para a órbita do Palácio, continuassem a ser de fato independentes, dirigidas de forma profissional, Rosemary, ou Rose, desembarcada em Brasília na comitiva do primeiro governo Lula, de quem foi secretária pessoal, não teria montado um esquema de tráfico remunerado de influência a partir de agências reguladoras (ANA, de águas, e Anac, agência de aviação civil).

Um dos sinais do poder do esquema foi a pressão para a aprovação pelo Senado da indicação de Paulo Rodrigues Vieira, apadrinhado de Rosemary, para a ANA. Rejeitado uma vez, o Planalto reapresentou o nome e conseguiu aprová-lo.

Na sexta-feira, a Operação Porto Seguro, da Polícia Federal, prendeu Paulo e o irmão, Rubens Carlos Vieira, encaixado na diretoria de infraestrutura aeroportuária da Anac — uma das mais aparelhadas das agências reguladoras.

A demonstração do alcance do esquema é o envolvimento do segundo no organograma da Advocacia-Geral da União (AGU), José Weber Holanda.

Dilma agiu com rapidez e demitiu todos, ainda no sábado, como necessário. Mas é preciso se conhecer o mapeamento desta teia de negociação de pareceres e outros “negócios”.

Por ironia, no mensalão, ainda em julgamento, e neste novo escândalo repetem-se dois personagens: José Dirceu, “chefe da quadrilha” do mensalão e de quem Rosemary foi secretária no PT antes de ir trabalhar ao lado de Lula; e o indefectível mensaleiro Waldemar Costa Neto (PR-SP), pilhado em negociações com o esquema.

E mais uma vez surge um descuidado Lula, “traído” no mensalão e agora “apunhalado pelas costas” por Rose e protegidos.

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Leia na Fonte: O Estado de S. Paulo
[27/11/12]  Tolerância continuada - por Dora Kramer

A quantidade de “braços direitos” envolvidos em escândalos nos últimos anos não é exatamente um dado que conspire a favor do governo, do PT, do ex-presidente Lula nem da imagem de austeridade da presidente Dilma Rousseff, bordada com canutilho pelo departamento de propaganda do Planalto.

Para citar os casos mais famosos ocorridos em ambiente de Palácio: Valdomiro Diniz era braço direito de José Dirceu, que era braço direito de Lula, que o substituiu por Dilma, que pôs no lugar Erenice Guerra, que caiu na rede da suspeita por tráfico de influência, mesma acusação que fez do braço direito do advogado-geral da União e de pessoa da confiança do ex-presidente alvos de investigação da Polícia Federal.

Convenhamos, não é algo trivial. Tampouco a ser desconsiderado no cômputo geral de "malfeitorias" cometidas na antessala do Poder central.

Na melhor hipótese demonstra o modo displicente do governo na nomeação de auxiliares, ainda mais quando ocupantes de postos-chave, e a total liberdade com que conseguem atuar longe de qualquer fiscalização ou controle interno. Nunca são sequer importunados. Invariavelmente são descobertos por denúncias publicadas na imprensa ou por operações de iniciativa da PF.

Essa última, a Porto Seguro, durante longo tempo investigou entre outros o advogado-geral da União adjunto e a chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo sem que os superiores deles se dessem conta de suas atividades paralelas.

A polícia levou tempo para recolher provas que pudessem sustentar as prisões e indiciamentos. Mas quem convivia com eles não precisaria de mais que indícios de conduta reprovável para afastá-los das respectivas funções.

E se atuavam livremente é porque ou tinham autorização ou no mínimo se sentiam protegidos pela indulgência dos chefes em alguns casos e, em outros, por temor da retaliação vinda do altar onde se instalavam seus padrinhos.

Não é pequeno nem desprovido de razão o constrangimento do governo petista com o indiciamento de Rosemary Noronha por corrupção e tráfico de influência. A moça é poderosa, arrogante e abusa do direito de demonstrar que tem as costas quentes. Características sobejamente conhecidas nas cercanias do poder, aí incluído o Senado, "forçado" a aprovar a nomeação de Paulo Vieira, um dos presos, para a agência de Nacional de Águas em votação viciada, depois de duas rejeições.

As atividades ilícitas de "Rose" poderiam até ser desconhecidas, mas as relações das quais emanavam sua força eram assunto corrente. Ela foi secretária de José Dirceu que, no entanto, nesse caso entra apenas como intermediário de uma indicação lavrada em cartório do "céu" e assinada embaixo: Lula.

O trabalho de bastidor agora é de contenção de danos para evitar novos desdobramentos.

Por ora, o episódio ressalta a existência no governo de um ambiente de tolerância, terreno fértil à impunidade que dá margem à reincidência continuada. E não ajuda o PT a convencer a sociedade de que o Supremo comete uma grande injustiça ao julgar com rigor ímpar o processo do mensalão.

De origem

Fala-se que Dilma Rousseff quer aproveitar o ensejo para acabar com as indicações políticas nas agências reguladoras. Antes tarde. Mas poderia ter sido bem mais cedo. Aliás, poderia nem ter sido necessário mudar o rumo. Quando o PT chegou à Presidência a crítica central às agências era seu excessivo caráter de independência em relação ao poder político, exatamente por terem sido concebidas como instrumentos de controle. Originalmente elas seriam uma espécie de ministério público da prestação de serviços públicos praticados pela iniciativa privada.

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Leia na Fonte: Portal da Band - Colunas
[07/02/12]   Mais controle sobre as agências - por Mariana Mazza (foto)

A presidência da Câmara dos Deputados resolveu colocar a mão em um vespeiro nesta semana. Ontem foi decidida a junção dos projetos que pretendem ampliar o controle externo sobre as agências reguladoras e a criação de uma comissão especial para analisar o assunto. Há anos, o tema tem sido tratado abaixo do radar do parlamento. Para se ter uma ideia, os projetos mais antigos sobre o tema já tem nove anos de tramitação. A proposta onde as demais foram apensadas é de autoria de Arthur Virgílio (PSDB/AM), que na época era senador.

Há oito anos a campanha política para aumentar o controle sobre as ações das agências reguladoras atingia o auge. O governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nunca simpatizou com essas autarquias, símbolos das privatizações da era FHC. Dilma Rousseff, na época ministra de Minas e Energia, não dava refresco à Aneel, que perdeu boa parte de seus poderes durante a reforma do setor elétrico promovida no governo Lula. Enquanto isso, a Casa Civil, comandada por José Dirceu, elaborava seus planos de unificação das leis que regem as agências, devolvendo aos ministérios boa parte da gestão dos setores regulados. O projeto mais polêmico sobre o tema, enviado ao Congresso em 2004, é de autoria da própria Casa Civil.

Dizer que as agências ficaram histéricas é pouco para descrever o clima nessas autarquias durante esse período. Mas nada como um dia após o outro. Os anos foram passando e a fúria contra as agências parece ter sido aplacada. O lema de que essas autarquias são órgãos de Estado (e não de governo) e que a autonomia é o princípio mais nobre para a boa regulação se consolidou. Com isso, a ideia de exigir que as agências prestassem conta aos órgãos de controle externo, como o TCU, aos ministérios e aos deputados e senadores foi sendo pouco a pouco enfraquecida. Enquanto isso, a comemorada autonomia foi se transformando em soberania, com muitas agências decidindo e agindo como se realmente não devessem explicações a ninguém.

Tantos anos depois, a decisão de criar uma comissão especial para analisar os projetos que pretendem disciplinar as agências parece uma boa notícia. Mas ainda é cedo para comemorar. Para quem acompanha a dança dos parlamentares, a criação de uma comissão especial muitas vezes é decidida exatamente para engavetar assuntos espinhosos. Isso porque os partidos têm que indicar quais parlamentares participarão do grupo. Se ninguém for indicado, a comissão simplesmente existe, mas não funciona.

Os projetos para uma Lei Geral das Agências também dão uma lição sobre a distância entre o jogo político real e as iniciativas que acabam sendo apenas manobras vazias. Cada um desses projetos tramita em regime de urgência, o que permite que o Plenário vote em definitivo as propostas a qualquer momento. Basta existir "vontade política", para usar o jargão do Congresso. Se um projeto fica nove anos sem votação mesmo sendo considerado urgente, imaginem o que seria se ele tivesse uma tramitação comum?

A reforma legal das agências não está entre as prioridades do governo em 2012. Outros projetos importantes para o setor de telecomunicações também foram esquecidos neste ano, como é o caso da nova Lei do Fust, que liberaria praticamente R$ 1 bilhão por ano para investimentos na expansão da banda larga. O marco civil da Internet também sumiu da lista de prioridades apresentadas na semana passada, durante a abertura do ano legislativo.

Nesta primeira semana de trabalho, vários deputados criticaram a ausência desse temas importantes na agenda legislativa. Se o setor está tão visado pelos parlamentares, tomara que a tal vontade política dessa vez se concretize e permita que a Lei Geral das Agências enfim saia do papel. Depois de 15 anos da privatização dos serviços públicos, acho que já estamos maduros para colocar um pouco de ordem nas agências.

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Leia na Fonte: O Globo
[07/06/08]   O erro original - por Míriam Leitão (foto)

A impressão digital neste novo escândalo do governo Lula já pode ser identificada. Ele nasceu do fim da independência das agências reguladoras. Desde o primeiro dia, o governo mostrou não entender a razão de as agências serem independentes. Houve todo tipo de interferência; nomeações políticas, aparelhamento. O PT confundiu com perda de poder o que era modernização do aparelho do Estado.

Logo que começou o primeiro mandato, foi aberta a temporada de caça à independência das agências. O presidente Lula definiu a nova ordenação — que não entendeu — como "terceirização" do poder. Demitiu ou enfraqueceu quem entendia o que é uma agência, retirou poderes delas, nomeou para os cargos de direção políticos derrotados nas eleições, indicados políticos, pessoas valorizadas por suas carteirinhas ideológicas. Com atos como esses, preparou o terreno para todo tipo de impropriedade e improbidade. Assim surgem distorções econômicas, incerteza regulatória, interferência para atender a grupos políticos e interesses privados. Assim surgem os intermediários e suas nebulosas transações. Tudo passa a ser possível quando órgãos que regulam sofrem esse grau de desidratação de suas prerrogativas; esse grau de aparelhamento.

Todos os males sofridos pela Anac vieram desse erro original. A ex-diretora Denise Abreu, que tanta polêmica provocou, era considerada "do grupo de José Dirceu". O também controverso ex-presidente da Anac Milton Zuanazzi era "do grupo de Dilma Rousseff". O outro ex-diretor Leur Lomanto era um político sem mandato. Foi o caso também do atual diretor geral da Agência Nacional do Petróleo, que se qualificou para o cargo por ser ex-deputado sem mandato do PCdoB, partido da base aliada.

O governo Lula transformou as agências em apêndices dos ministérios. Ao fazer isso, produziu um recuo no tempo. Voltou-se aos departamentos anexos aos ministérios que decidiam preços dos serviços públicos; como o departamento de águas e energia elétrica, o dos combustíveis, entre outros, de viva memória e nenhuma saudade. Foi para substituir esses apêndices que surgiu a moderna regulação.

A agência é um órgão de Estado, e não do governo. A idéia é que seja um organismo independente de todas as pressões. Defende o mercado da ingerência indevida do governo; defende a sociedade das distorções criadas pelo mercado; defende as empresas participantes do abuso de poder de mercado de empresas dominantes.

As agências existem em setores regulados pois trata-se de concessionários de serviço público; por estarem em área na qual o mercado sozinho cria distorções. Uma empresa que controle uma via única de acesso — seja oleoduto, estrada ferroviária, linha de transmissão — pode impor esse poder através do veto à passagem. A agência garante o direito de passa$a todas as companhias e assim garante a competição.

No caso de haver uma empresa com poder dominante no mercado, a regulação independente dará a garantia aos grupos que queiram entrar no mesmo setor de que eles não estarão submetidos ao poder excessivo da empresa dominante. Ao regular as ações potencialmente conflituosas entre as companhias, as agências dão garantia ao próprio mercado para investir; ao combater conluio entre empresas, dão garantias ao consumidor desses serviços ou produtos. Não são agências de defesa do consumidor propriamente ditas, como os procons, mas, ao garantirem o funcionamento do mercado, acabam protegendo os interesses e direitos do consumidor.

Seus dirigentes têm mandato e contas a prestar à sociedade. Elas têm que estar protegidas da pressão política, cujos interesses são sempre temporários e mutantes. Têm que estar blindadas contra o risco de serem capturadas pelas empresas que atuam neste mercado. O maior desafio da ANP, quando foi criada, era ser independente em relação ao enorme poder da Petrobras. No começo, até conseguiu isso, porém, no governo Lula, foi gradualmente perdendo essa função até cair naquilo que é uma das distorções clássicas: um regulador controlado pela empresa que deveria regular.

Foi neste ambiente que ocorreram as transações para a compra da tradicional, admirada, mas financeiramente arruinada, Varig. Ela estava falida, mas tinha ativos valiosos. Pagar a dívida e resgatá-la era um modelo velho, que o governo sabiamente rejeitou. No entanto, se interferiu da forma como a ex-diretora da Anac está dizendo, cometeu o pior de todos os erros. O caso é grave, precisa ser apurado. A ex-diretora ficou estigmatizada por seus atos e palavras, mas agora está cumprindo o papel de trazer a público diálogos e atos inaceitáveis. O pior que o país pode fazer é não dar atenção, achando que se trata apenas de uma vingança pessoal ou de mais uma das muitas brigas intestinas do PT. Ao falar, ela está correndo riscos. Tendo provas e indícios do que relata, precisa ser levada a sério para que se façam as investigações e apurações necessárias. Já há outros depoimentos validando parte do que ela disse; existem fatos dando consistência a certos aspectos do que revelou. Existe, sobretudo, o terreno propício a distorções nesta relação, sem transparência e limites institucionais, entre o governo e as agências reguladoras.

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Fonte: Estadão - Editorial
[18/06/08]   Loteamento de agências   (Obs: link original descontinuado)
 
O governo petista cumpre o seu programa: em breve não restará no Brasil uma única agência reguladora digna desse nome. Uma a uma, todas vêm sendo submetidas ao loteamento de cargos e ao aparelhamento, como todo o resto da administração pública federal. Agora chegou a vez do PMDB, que será favorecido com a próxima nomeação para uma diretoria da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Ao chegar ao governo, em 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva queixou-se de ser o último a saber das decisões tomadas por diretores de agências. Demonstrando não entender a diferença entre órgão de governo e órgão de Estado, chegou a reclamar de uma “terceirização” de funções e poderes governamentais. Não havia nenhuma terceirização. Mas tem havido, nos últimos anos, um evidente e escandaloso processo de nomeações orientadas por critérios exclusivamente políticos, no sentido mais ignóbil dessa expressão.
 
Com a escolha de pessoa indicada pelos senadores José Sarney (PMDB-AP) e Renan Calheiros (PMDB-AL), a Anatel terá preenchidas cinco diretorias, número necessário para a votação do novo Plano Geral de Outorgas (PGO), tornado necessário para a regularização da compra da Brasil Telecom pela Oi - antiga Telemar, do Grupo Jereissati. Os dois peemedebistas defendem a nomeação de uma assessora especial da presidência do Senado, Emília Ribeiro. Formada em administração e direito, foi nomeada em 2006 para o Conselho Consultivo da Anatel e daí decorre toda a sua experiência no setor de telecomunicações.
 
O episódio é especialmente instrutivo para quem pretenda estudar os estilos de ação desse governo. Durante sete meses ficou vago o assento do quinto diretor da Anatel, enquanto se discutia uma indicação política.
 
Tudo se passou, nesse tempo, como se a agência não fosse mais que um apêndice do Executivo, sujeito às disputas e ao toma-lá-dá-cá das conveniências político-eleitorais. Isso é a negação mais elementar do conceito de agência reguladora. Além disso, quem for nomeado assumirá o posto com a missão de regularizar uma operação realizada com estímulo do governo e sob sua proteção. Seu papel, portanto, será cumprir ordens de um ministro ou de quem estiver acompanhando o caso da compra da Brasil Telecom.
 
O loteamento, segundo reportagem do Estado, foi resolvido já no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com base no acordo, a diretoria vaga há sete meses deve caber ao PMDB. A próxima vaga será aberta em novembro e pertencerá, em princípio, à cota do PT. No Brasil, partidos, grupos e políticos influentes têm cotas na administração: essa é a concepção dominante de coisa pública. O nome cotado é o professor Márcio Wohlers, indicado pelo presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Luciano Coutinho, articulador da compra da Brasil Telecom.
 
Para a opinião pública, o caso mais ostensivo de loteamento e aparelhamento de uma agência foi o da Anac, responsável pela definição de normas para a aviação civil. Dois dos mais graves acidentes da história da aviação brasileira, com centenas de mortos, chamaram a atenção para um quadro espantoso de incompetência. A sucessão de tragédias acabou resultando no afastamento de toda uma diretoria. Os desmandos facilitados pela relação promíscua entre Executivo e agência continuam, no entanto, aparecendo, com as denúncias sobre a articulação da venda da Varig.
 
A desmoralização da Agência Nacional do Petróleo (ANP) começou com a nomeação de um presidente escolhido com base em critério político e ideológico. O resultado mais ostensivo dessa escolha foi a desastrada revelação da descoberta do Campo de Tupi.
 
Desde o início do primeiro mandato, o governo do presidente Lula vem trabalhando para destruir o sistema de agências reguladoras. Agências desse tipo, existentes em países desenvolvidos, são órgãos de Estado, não de governo. Devem funcionar com independência política, proporcionando estabilidade e previsibilidade às condições de investimento em setores básicos, como energia, transportes e telecomunicações. O presidente Lula e seus principais auxiliares nunca aceitaram essa concepção, assim como jamais aceitaram os critérios de impessoalidade e competência na gestão pública.