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Novembro 2011               Índice Geral do BLOCO

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28/11/11

• Mariana Mazza: "Bens Reversíveis"

Olá, WirelessBR e Celld-group!

01.
Resumo deste "post":
Inicialmente relaciono - e depois transcrevo - as Colunas de Mariana Mazza no Portal da Band sobre o polêmico tema "bens reversíveis".
Tomei a liberdade de perpetrar uma temerária juntada de recortes dos textos da Mariana, que julguei interessantes para compor uma visão panorâmica do imbróglio.
Em seguida, relaciono os "posts" do website do José Smolka que registram sua recente análise da ação da Proteste e o debate sobre o assunto.
Cito também o website da Flávia Lefèvre, advogada da ProTeste, com precioso conteúdo sobre o tema.

02.
Colunas sobre "bens reversíveis":

Fonte: Portal da Band - Colunas
[27/09/11]   Quem é o dono? - por Mariana Mazza
Fonte: Portal da Band - Colunas
[20/10/11]   Problemas na telefonia? Procure o Papa - por Mariana Mazza
Fonte: Portal da Band - Colunas
[24/10/11]   Toma que o filho é teu - por Mariana Mazza
Fonte: Portal da Band - Colunas
[26/10/11]   Caladão no horizonte - por Mariana Mazza
Fonte: Portal da Band - Colunas
[17/11/11]   Sangue novo, ideias tradicionais - por Mariana Mazza

03.
Juntada de recortes dos textos de Mariana Mazza

Bens reversíveis:
(...) "O assunto é espinhoso. E nos últimos tempos tem feito tremer muita gente no governo. A expressão "bens reversíveis" parece grego para quem não está familiarizado com o mundo das telecomunicações. Mas a explicação é simples. Quando o governo decidiu privatizar a antiga Telebrás, não foi negociado apenas o direito a prestar o serviço de telefonia fixa. Junto com as concessões para a oferta do serviço aos consumidores, o governo vendeu uma enorme malha de fios da Telebrás, seus imóveis e outras propriedades necessárias para fazer o serviço de telefonia. Esses equipamentos e imóveis são os "bens reversíveis". (...) [Recorte de Quem é o dono?]

(...) "A posição do novo presidente da Anatel sobre os bens reversíveis é bastante conhecida no setor. Rezende defende que o conceito seja "modernizado", em suas palavras, é que os bens não sejam mais controlados por meio de uma lista detalhada. Assim, não importa o bem do ponto de vista patrimonial, mas sim o que será necessário no futuro para prestar o serviço de telefonia.

Em conversas informais, Rezende já defendeu para mim o fim do conceito de bens reversíveis, alegando que esse tipo de controle não existe em outros países. Mas, vejamos, em outros países a concessão não tem prazo de validade, ou seja, não há risco do serviço parar do dia para a noite porque o contrato com a União expirou.

Hoje, Rezende não quis falar do assunto. Disse que sua posição já é conhecida (e é mesmo) e que aquele "não era o momento adequado" para falar de bens. Disse ainda desconhecer a contestação que a própria Anatel apresentou na Justiça, argumentando que está revendo a proposta de mudança no controle de bens. Diga-se de passagem, Rezende era o relator da proposta de novo regulamento de bens reversíveis quando era apenas conselheiro. (...) [Recorte de Mil e uma novidades]

(...) "Em uma conversa com Zerbone após sua sabatina no Senado Federal, realizada no início do mês, fiquei surpresa com as posições do novo conselheiro sobre o espinhoso assunto dos bens reversíveis. Ao contrário do que eu imaginava, Zerbone não parece concordar com a "modernização" do controle dos bens, defendida por quase todos dentro da Anatel, especialmente pelo novo presidente da autarquia. O conselheiro defendeu que a Anatel enfrente a questão, ao invés de procurar subterfúgios para não controlar esse patrimônio e, em suas palavras, a "função pública" desses bens. "É fundamental que a Anatel não fuja do tema por medo de enfrentá-lo", resumiu.

Zerbone defendeu que, independentemente da visão escolhida pela agência - se patrimonialista ou estratégica - é preciso se debruçar na criação de um sistema que garanta um controle ágil dos bens. "Se houve alguma irregularidade e, pelo visto, houve, isso vai ter que ser regularizado. Não dá para fugir do que se fez", afirmou, fazendo referência aos relatórios de fiscalização produzidos pela própria Anatel que mostram a venda dos bens pelas teles sem o aval da agência.

O novo conselheiro não se declarou nem pró nem contra o controle patrimonialista dos bens - "Particularmente, não gosto dessas classificações" -, mas demonstrou um certo receio com as iniciativas de exterminar o conceito de bens reversíveis, defendido por várias pessoas do setor e que já até foi materializado em um projeto de lei de autoria do senador Flexa Ribeiro (PSDB/PA). Para ele, só seria possível acabar com esse conceito "se for criado outro método para garantir a continuidade dos serviços de telefonia". E qual seria esse outro método? Zerbone confessou que não sabe como algo assim poderia ser feito. "Teria que se rediscutir todo o modelo das telecomunicações", avaliou.

Os aspectos ponderados pelo novo conselheiro são muito importantes para a discussão dos bens reversíveis. E é positivo que Zerbone tenha uma visão mais tradicionalista ao avaliar o assunto. Nesse setor, nos acostumamos a achar que tudo que é moderno é bom, mas nem sempre é assim. A questão da garantia da continuidade é fundamental. É um dos pilares do modelo de telecomunicações. E é por isso que existe a figura da reversibilidade, como bem lembrou Zerbone.

Em tempos onde a "modernização" virou palavra de ordem dentro das telecomunicações, é sempre bom lembrar do que queríamos quando privatizamos a Telebrás: que a oferta de telefone fosse universal, contínua e com preço justo. Não me parece que permitir que as concessionárias assumissem milhares de bens comprados com dinheiro público e necessários para a oferta do serviço fizessem parte do plano. Quem sabe o mais jovem conselheiro da Anatel possa dar essa aulinha de história para a agência reguladora. (...) [Recorte Sangue novo, ideias tradicionais]

(...) Como a briga pelos bens reversíveis continua esquentando a cada dia, me sinto obrigada a voltar ao assunto. Hoje (26/10) circulou na imprensa a decisão do juiz João Luiz de Sousa, da seção judiciária do Distrito Federal, negando o pedido de liminar feito pela entidade de defesa do consumidor ProTeste que poderia impedir a Anatel de alterar as regras de alienação dos bens reversíveis. O indeferimento da liminar já tinha sido divulgado aqui na coluna na semana passada.

A ProTeste perdeu a primeira batalha, mas a decisão do juiz Sousa merece alguns destaques do ponto de vista do consumidor. Primeiro, a liminar foi negada não porque os argumentos da Anatel foram aceitos. O juiz resolveu dar à agência o benefício da dúvida. Como a alteração do regulamento ainda não foi feita, Sousa entendeu que uma eventual mudança pode servir para melhorar as regras e não necessariamente para tornar ainda mais frouxo o controle dos bens.

Mas ao que tudo indica, o juiz está preocupado com o mérito da ação. O magistrado destacou o fato de a própria Anatel ter feito fiscalizações que constataram evidências de alienação ilegal dos bens por parte das teles. Também frisou que as supostas ações tomadas pela área técnica da Anatel para a defesa dos direitos dos consumidores "não apresentaram resultados efetivos". E disse mais: que se as teles estão mesmo se apropriando dos bens públicos, os responsáveis podem responder civil e criminalmente pelo ato.

Mesmo não conseguindo a liminar, a ProTeste e o Ministério Público Federal podem comemorar um avanço na ação. Todas as tentativas da Anatel e da União para anular o processo foram rejeitadas integralmente pela Justiça. Ainda assim, tanto a entidade quanto o MPF pretendem insistir na necessidade da suspensão do projeto de mudança do regulamento de bens reversíveis. [Recorte de Caladão no horizonte]

04.
Análise de José Smolka registrada em seu website:

03/11/11
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [8] - Análise da petição inicial da ProTeste (Parte 3)
01/11/11
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [7] - Análise da petição inicial da ProTeste (Parte 2)
30/10/11
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [6] - Análise da petição inicial da ProTeste (Parte 1)
28/10/11
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [5] - Comentários sobre a decisão proferida pelo MM Juiz
23/10/11
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [4] - Comentários sobre a contestação da Anatel
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [3] - Primeiros comentários sobre o parecer do MPF
22/10/11
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [2] - Tramitação do processo
21/11/11
Sobre a ação da PROTESTE quanto aos bens reversíveis [1] - Dificuldade de obtenção das peças do processo

05.
No website da Flávia Lefèvre há um bom conteúdo sobre o tema - vale uma visita detalhada! - e destaco este último registro:
25/10/11
Bens reversíveis, Minicom e Anatel - Obscuridade e Contradição - por Flávia Lefèvre

Comentários?

Boa leitura!
Um abraço cordial
Helio Rosa
Portal WirelessBRASIL
BLOCOs Tecnologia e Cidadania

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Fonte: Portal da Band - Colunas
[27/09/11]   Quem é o dono? - por Mariana Mazza

O assunto é espinhoso. E nos últimos tempos tem feito tremer muita gente no governo. A expressão "bens reversíveis" parece grego para quem não está familiarizado com o mundo das telecomunicações. Mas a explicação é simples. Quando o governo decidiu privatizar a antiga Telebrás, não foi negociado apenas o direito a prestar o serviço de telefonia fixa. Junto com as concessões para a oferta do serviço aos consumidores, o governo vendeu uma enorme malha de fios da Telebrás, seus imóveis e outras propriedades necessárias para fazer o serviço de telefonia. Esses equipamentos e imóveis são os "bens reversíveis".

O nome vem do fato de que as companhias telefônicas têm de devolver esse patrimônio para o Estado brasileiro quando as concessões vencerem. Sim, porque as teles que hoje prestam o serviço de telefonia fixa não têm direito vitalício de comercializar esse serviço. Os contratos acabam em 2025, quando o governo voltará a assumir a oferta da telefonia ou fará um novo leilão de privatização.

À primeira vista parece muito tempo. O mundo continuará como está por mais 14 anos. Mas a verdade é que o enfrentamento dessa questão já vem tarde. E muita gente sequer tem noção do tamanho do rombo nos cofres públicos que vem sendo arquitetado pelas empresas em conivência com o Ministério das Comunicações e com a Anatel.

Estima-se que o patrimônio público em discussão vale, ao menos, R$ 80 bilhões. Isso mesmo, R$ 80 bilhões, sem correção. São centenas de imóveis e equipamentos de telefonia usados pelas teles, comprados com dinheiro do contribuinte quando a Telebrás ainda estava ativa. O mais estarrecedor é que boa parte desse patrimônio público foi vendido pelas empresas ao longo da última década, sem aprovação do governo ou qualquer fiscalização.

A própria Anatel constatou o problema há dois anos, quando, enfim, iniciou o processo de fiscalização dos bens. Relatórios tratados com sigilo pela Agência Nacional de Telecomunicações deixam claro que não há qualquer controle do patrimônio público e que as companhias telefônicas têm vendidos os imóveis e os equipamentos e embolsado o lucro,  Pela lei, isso é crime. Crime de lesa pátria, crime contra o patrimônio público. Mas, ao invés de agir para recuperar o patrimônio comprado com o dinheiro do cidadão, a Anatel resolveu colocar panos quentes sobre o assunto.

Acordo

Desde que descobriu o problema, a agência iniciou um processo de revisão das regras em vigor para legalizar a venda dos bens.  A última cartada está sendo lançada neste momento. Há dois meses, a Anatel ampliou os prazos para que as teles apresentem a lista do patrimônio que deve ser devolvido a União. O prazo foi ampliado até junho de 2013. Não bastasse a colher de chá para as empresas, a agência estuda fazer um acordo com as teles para perdoar as vendas ilegais já realizadas. O conselheiro João Rezende, que analisou o pedido de prorrogação de prazo, defende a ideia de fazer um Termo de Ajustamento de Conduta com as companhias telefônicas. O TAC, como é chamado, transformaria as multas em investimentos. Ou seja, a venda irregular dos bens públicos seria perdoada com a promessa de investimentos em novas redes de telefonia. A proposta de firmar um acordo já foi aprovada pelo Conselho Diretor da Anatel, que continua escondendo o assunto dos consumidores. A pergunta que fica é se é possível confiar em investimentos de empresas que não tiveram o menor pudor em vender o que não era delas, mas sim do povo brasileiro.

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Fonte: Portal da Band - Colunas
[20/10/11]   Problemas na telefonia? Procure o Papa - por Mariana Mazza

Se você pensa que a Anatel e as empresas de telefonia que atuam no Brasil abusam da nossa paciência simplesmente porque somos meros consumidores, saiba que a agência reguladora não pratica esse tipo de discriminação. Recentemente ela resolveu perturbar o Ministério Público Federal. É isso aí. Nem procurador da República está imune à capacidade da Anatel de tirar as pessoas do sério.

A briga tem a ver com os bens reversíveis da União, usados pelas teles para prestar o serviço de telefonia fixa. Escolhi este tema para inaugurar esta coluna no mês passado, exatamente pelo interesse coletivo que está por trás do assunto, talvez o mais espinhoso do setor. Esse conjunto de bens devem ser devolvidos ao Estado brasileiro em 2025. O problema é que a Anatel, que deveria fiscalizar e controlar o uso desses equipamentos, não faz ideia de onde eles estão e como estão sendo usados. Se nada for feito imediatamente, o Brasil corre o risco de tomar um calote bilionário.

A associação paulista de defesa do consumidor ProTeste resolveu comprar a briga e entrou com uma ação civil pública exigindo que a Anatel controle efetivamente esses bens e divulgue a lista para a sociedade. E o que a Anatel tem a dizer sobre isso? Que os bens reversíveis não são problema dela.

A agência reguladora mandou centenas de documentos para o Ministério Público Federal alegando, nada mais nada menos, não ter responsabilidade nesse assunto. Segundo a agência, quem sabe da lista é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que fez o leilão de privatização em 1997. E a União? A União também acha que não tem nada a ver com essa briga. Pasmem, mas o representante da União diz que todos os assuntos de telecomunicações estão nas mãos da Anatel e, por isso, a União não tem que se meter na história.

Transcrevo aqui um trecho do parecer do procurador da República Marcus Marcelus, responsável pelo caso no MPF, porque eu mesma não encontrei palavras melhores para descrever minha indignação. "Pergunta-se: quem deveria ser demandado para discutir eventual nulidade do procedimento relativo ao novo regulamento dos bens reversíveis? O Papa?"

Boa pergunta, procurador. Pelo visto, só o Papa para organizar o setor de telecomunicações no Brasil, já que nem a Anatel, nem a própria União tem nada a ver com esse negócio. A mesma Anatel que se omite em responder na Justiça sobre as suas responsabilidades têm trabalhado com afinco na flexibilização das regras para permitir que as teles vendam o patrimônio público sem que ninguém as perturbe. Mas, veja bem, ela não tem nada a ver com isso... O descaso chega a tal ponto que a agência acabou caindo em contradição na própria documentação enviada ao MPF. Apesar de dizer que não é obrigada a controlar os bens - que na visão da autarquia, são das empresas privadas apesar de terem sido comprados com dinheiro dos contribuintes e dos assinantes da telefonia fixa - diz que o assunto é problema só dela e das concessionárias. O consumidor não tem nada que se meter nessa história.

Mas, vejamos, a briga é sobre um patrimônio público comprado com dinheiro que veio do bolso do cidadão, usado por concessionárias públicas que prestam um serviço público. Ainda assim, a Anatel acha que os consumidores são muito enxeridos e devem ficar quietinhos, agradecendo o serviço (de má qualidade) que lhes é prestado. Por outro lado, não tem problema as teles ficarem com o que não é delas, mas sim da Nação.

É chocante a dificuldade da Anatel de se conectar com os interesses dos consumidores. E, mais uma vez, não sou eu quem diz. Repito as palavras do procurador da República: "a Anatel nunca enxerga o consumidor nas relações jurídicas que busca regular".

Em seu parecer, o procurador Marcus Marcelus sugere que não vai deixar barata essa história e, se for necessário, o próprio MPF entrará com uma ação para garantir que o patrimônio público não se perca. Infelizmente, as coisas não estão indo bem para os consumidores na Justiça. O juiz João Luiz de Sousa, da 15ª Vara Federal, responsável pelo caso negou o pedido de liminar feito pela ProTeste para impedir que a Anatel flexibilize as regras e permita que os bens reversíveis sejam vendidos pelas teles. Pelo visto, talvez tenhamos que comprar mesmo uma passagem para Roma e bater um papinho com o Papa.

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Fonte: Portal da Band - Colunas
[24/10/11]   Toma que o filho é teu - por Mariana Mazza

Imaginem que os pais de uma criança adotada são chamados pela diretora da escola porque o menino aprontou no colégio. E esses pais rebatem a diretora dizendo que o problema não é deles, mas sim dos pais biológicos. Situação absurda, não? Pois é mais ou menos o que a Anatel está tentando fazer o mundo acreditar sobre a briga dos bens reversíveis.

Os bens reversíveis são todos os equipamentos, imóveis e contratos necessários para prestar o serviço de telefonia fixa. A maior parte deles foi adquirida na época em que a Telebrás controlava a oferta, ou seja, com dinheiro público. A briga sobre o tema é que as concessionárias começaram a transferir esses bens, inclusive as redes usadas para transportar os serviços de telecomunicações, para outras empresas, às vezes do mesmo grupo econômico, sem qualquer aval ou controle por parte da Anatel. Isso coloca em risco o funcionamento dos serviços telefônicos quando as concessões terminarem, em 2025.

O assunto virou tema de uma ação na Justiça, movida pela entidade de defesa do consumidor ProTeste. E ganhou como aliado o Ministério Público Federal que, no início deste mês, produziu parecer criticando a postura da Anatel no caso.

Pela lei, a Anatel não só deve controlar os bens, como fiscalizar a gestão desse material pelas empresas. O motivo é muito simples: em 14 anos, esse patrimônio será devolvido à União, independente da propriedade ser das concessionárias. Em outras palavras, trata-se de um patrimônio público que, no momento, está sob a posse das empresas privadas. Mas a Anatel quer fazer crer que ela não tem nada a ver com isso. Por quê? Porque não foi ela quem fez a lista dos bens reversíveis.

Esses equipamentos teriam sido listados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no processo de preparação para o leilão de privatização. Daí o exemplo dos pais adotivos. A Anatel quer nos levar a crer que, como ela não deu a luz à criança, o problema não é dela. Mas é. A Lei Geral de Telecomunicações diz que é ela, sim, a responsável pelo controle dessa lista. E, se ela não tinha o documento, deveria ter providenciado um meio de consegui-lo. Afinal, foi ela quem assinou os contratos de concessão, em nome da União.

Passados 14 anos da privatização (pelo visto, sem a lista), a Anatel argumentou em sua defesa na Justiça que só o BNDES é responsável pela relação. À Anatel cabe apenas saber a categoria dos equipamentos. Mas quantos são, aonde estão e como estão sendo usados não é problema dela, mas da empresa. No fim, a impressão que a agência passa é que é impossível saber quais são estes bens de forma detalhada atualmente.

Pois eu tenho boas notícias para a Anatel. Se ela não sabe como reconstruir a lista, a ProTeste pode dar uma ajudinha. A entidade possui nada menos do que 669 documentos que reúnem escrituras de imóveis e bens adquiridos pela Telebrás e que foram transferidos para as empresas. O patrimônio retratado nos documentos é bilionário.

Há meses este material está sendo analisado e posso adiantar que as teles não pouparam imaginação para dar um jeitinho de ficar com os bens para sempre. Se a agência estiver curiosa, basta procurar o Arquivo Nacional, onde está registrado o patrimônio da finada Telebrás. Está tudo lá. 

Público X Privado  

Outra armadilha usada pela Anatel para tentar desqualificar a discussão é o debate sobre a propriedade desses bens. Hoje, esse patrimônio está sob a posse das teles. A Anatel gosta de tratar posse e propriedade como se fosse a mesma coisa. Não são.

Cito a própria Anatel. "O bem reversível integra o patrimônio da concessionária pertencente ao grupo econômico vencedor do leilão de desestatização. Resta sublinhar que o direito de propriedade desses bens indispensáveis à continuidade do serviço público, no entanto, é mitigado durante a vigência contratual, podendo ser resolúvel com a extinção da concessão". Traduzindo, os bens hoje estão sob a posse dessa empresas privadas (fazem parte do patrimônio do grupo), mas a propriedade pode ser retirada das empresas (e será) quando a concessão acabar.

Para conhecer a íntegra da ação movida pela ProTeste clique aqui 

O trecho citado é de uma nota técnica da Anatel de 26 de julho deste ano, mas a frase também foi reproduzida na defesa feita pela agência na Justiça para tentar argumentar que os bens reversíveis não são públicos, mas sim privados e, portanto, só interessam às teles. De fato, eles "estão" sob a posse das empresas privadas. Mas o assunto interessa a todos porque se esse patrimônio não for repassado à União, os telefones irão parar de funcionar em 2025. Simples assim.

Então, não importa de quem é a propriedade neste momento e nem é isso que está sendo discutido na Justiça pela ProTeste. O problema é o amanhã. É se os nossos telefones funcionarão ou não sem esses bens. E o que a entidade quer é que a Anatel cumpra a sua obrigação de zelar pela continuidade do serviço. A ação também procura esclarecer quais redes são públicas afinal e assegurar que exista o compartilhamento dessa infraestrutura, o que beneficia a sociedade brasileira. Não me parece pedir demais. Aliás, o maior interessado em defender as redes públicas deveria ser o Ministério das Comunicações, para garantir o sucesso do Plano Nacional de Banda Larga e, enfim, promovermos a inclusão digital no Brasil.

Agora, mesmo que a discussão aqui não seja quem comprou o bem, sabemos muito bem quem pagou por ele. Fomos nós, por meio de impostos e das tarifas telefônicas. Sendo assim, o mínimo que se espera é que a Anatel controle o patrimônio adquirido com dinheiro do cidadão e do consumidor dos serviços telefônicos. Não importa quem gerou a criança. Agora o filho é da Anatel.

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Fonte: Portal da Band - Colunas
[26/10/11]   Caladão no horizonte - por Mariana Mazza

Como a briga pelos bens reversíveis continua esquentando a cada dia, me sinto obrigada a voltar ao assunto. Hoje circulou na imprensa a decisão do juiz João Luiz de Sousa, da seção judiciária do Distrito Federal, negando o pedido de liminar feito pela entidade de defesa do consumidor ProTeste que poderia impedir a Anatel de alterar as regras de alienação dos bens reversíveis. O indeferimento da liminar já tinha sido divulgado aqui na coluna na semana passada.

A ProTeste perdeu a primeira batalha, mas a decisão do juiz Sousa merece alguns destaques do ponto de vista do consumidor. Primeiro, a liminar foi negada não porque os argumentos da Anatel foram aceitos. O juiz resolveu dar à agência o benefício da dúvida. Como a alteração do regulamento ainda não foi feita, Sousa entendeu que uma eventual mudança pode servir para melhorar as regras e não necessariamente para tornar ainda mais frouxo o controle dos bens.

Mas ao que tudo indica, o juiz está preocupado com o mérito da ação. O magistrado destacou o fato de a própria Anatel ter feito fiscalizações que constataram evidências de alienação ilegal dos bens por parte das teles. Também frisou que as supostas ações tomadas pela área técnica da Anatel para a defesa dos direitos dos consumidores "não apresentaram resultados efetivos". E disse mais: que se as teles estão mesmo se apropriando dos bens públicos, os responsáveis podem responder civil e criminalmente pelo ato.

Mesmo não conseguindo a liminar, a ProTeste e o Ministério Público Federal podem comemorar um avanço na ação. Todas as tentativas da Anatel e da União para anular o processo foram rejeitadas integralmente pela Justiça. Ainda assim, tanto a entidade quanto o MPF pretendem insistir na necessidade da suspensão do projeto de mudança do regulamento de bens reversíveis. 

Perigo à vista

O MPF está convicto de que a ação movida pela ProTeste terá um desfecho favorável à entidade. Caso isso não aconteça, o futuro é sinistro. Conversei hoje com o procurador da República Marcus Marcelus, responsável pelo caso no MPF. E ele não escondeu a preocupação de que o Brasil se encaminhe para um caladão caso o debate sobre os bens reversíveis não seja encarado com seriedade pelas autoridades públicas. Confira os principais trechos da entrevista. 

O senhor pareceu bastante irritado no seu parecer sobre o caso. O que a Anatel disse em sua defesa para incomodar tanto o Ministério Público?

Primeiro, gostaria de esclarecer que não há irritação da minha parte. Posso ter usado algumas palavras mais fortes, mas não é irritação. Até porque, se a gente for se irritar com os absurdos que vemos todos os dias nessas ações, não conseguiria trabalhar.

O que há é um patrimônio público inestimável que está sendo colocado em risco pelos atos da Anatel. E isso é muito preocupante. 

A Anatel costuma defender que esse patrimônio não é público, mas sim das empresas privadas. Por isso, as teles poderiam fazer o que quiser com eles. Essa visão está correta?

Esses bens servem a um serviço público que pela lei tem que ser prestado com continuidade. Os bens reversíveis servem para garantir essa continuidade do serviço. Dizer que as teles podem vender esses bens é o mesmo que falar que a Via Dutra pode ser vendida pela concessionária. É um absurdo. 

Nas declarações preliminares, a própria União disse não ser responsável por esses bens. Não é estranha essa postura, já que os bens devem ser devolvidos à União em 2025?

Infelizmente, nesses casos envolvendo o setor de telecomunicações, a gente tem percebido que a Anatel e a União têm sempre agido juntas, se defendendo mutuamente. Causa realmente estranheza a posição adotada pela União. Até porque há um grave risco de termos um apagão das telecomunicações se a reversibilidade não for assegurada. Chama atenção o desinteresse da União em um assunto tão sério. Outra coisa estranha é como as empresas desse setor se comportam. Elas agem como se fossem donas da concessão. 

Outros setores também possuem bens reversíveis. Existe alguma controvérsia parecida em outros serviços públicos?

Não conheço nenhum caso em outros setores. Acredito inclusive que esse caso é o que envolve o maior patrimônio da União. É o mais vultoso envolvendo patrimônio público. Agora, se esses bens estão sendo mesmo afanados pelas empresas telefônicas, isso é um precedente muito perigoso para o país. Amanhã, uma distribuidora de energia pode se achar no direito de ficar com os cabos que usa para prestar o serviço, uma geradora pode dizer que a usina é dela... Isso é preocupante. 

A Anatel tem tentado desqualificar a ação afirmando que o assunto não é do interesse do consumidor. O que o senhor acha disso?

Os maiores obstáculos para a defesa do consumidor hoje no Brasil são a Anatel e a ANTT (agência responsável pelos transportes). É irônico porque são duas agência reguladoras, mas hoje elas são as maiores inimigas da defesa do consumidor em ação no país. 

A agência também tenta colocar o processo em segredo de Justiça. Há alguma chance desse pedido ser aceito?

A Anatel tem um gosto um tanto quanto exacerbado em favor do sigilo das ações. Mas a nossa legislação e extraordinárias e a regra é a publicidade. Sigilo, não.

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Fonte: Portal da Band - Colunas
[17/11/11]   Sangue novo, ideias tradicionais - por Mariana Mazza

Depois de um ano com sua composição desfalcada, o Conselho Diretor da Anatel voltou hoje a ter cinco conselheiros com a posse de Marcelo Bechara e Rodrigo Zerbone. A dupla posse foi realizada na sede da Anatel e atraiu mais gente do que o evento que selou a promoção de João Rezende à presidência da agência. Além da presença de executivos das empresas de telecomunicações e ex-conselheiros da Anatel, o evento contou com a participação de muitos representantes de empresas de radiodifusão e do sistema de defesa da concorrência.

A carreira dos dois novos conselheiros explica as aparições fora do tradicional. Bechara tem grande proximidade com as empresas de radiodifusão, relação cultivada na época em que ficou à frente da área jurídica do Ministério das Comunicações e da organização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Zerbone trabalhou no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) antes de entrar na Anatel. O presidente do Cade, Fernando Furlan, fez questão de comparecer na posse do ex=pupilo.

Os discursos de ambos foram focados em agradecimentos aos colegas e amigos. Nada de promessas de atuação em questões específicas do setor durante a cerimônia. Após a posse, o foco das entrevistas foi a reforma, defendida pelos dois novos conselheiros, do sistema de fiscalização e sanção da Anatel.

Mas vendo dois jovens ascenderem ao comando da Anatel - Bechara tem 32 anos e Zerbone, 30 anos = é inevitável a expectativa de que visões novas sejam trazidas para o setor de telecomunicações. Se bem que, às vezes, a defesa da tradição do modelo de telecomunicações acaba sendo melhor do que algumas ideias inovadoras que circulam por ai.

Em uma conversa com Zerbone após sua sabatina no Senado Federal, realizada no início do mês, fiquei surpresa com as posições do novo conselheiro sobre o espinhoso assunto dos bens reversíveis. Ao contrário do que eu imaginava,Zerbone não parece concordar com a "modernização" do controle dos bens, defendida por quase todos dentro da Anatel, especialmente pelo novo presidente da autarquia. O conselheiro defendeu que a Anatel enfrente a questão, ao invés de procurar subterfúgios para não controlar esse patrimônio e, em suas palavras, a "função pública" desses bens. "É fundamental que a Anatel não fuja do tema por medo de enfrentá-lo", resumiu.

Zerbone defendeu que, independentemente da visão escolhida pela agência - se patrimonialista ou estratégica - é preciso se debruçar na criação de um sistema que garanta um controle ágil dos bens. "Se houve alguma irregularidade e, pelo visto, houve, isso vai ter que ser regularizado. Não dá para fugir do que se fez", afirmou, fazendo referência aos relatórios de fiscalização produzidos pela própria Anatel que mostram a venda dos bens pelas teles sem o aval da agência.

O novo conselheiro não se declarou nem pró nem contra o controle patrimonialista dos bens - "Particularmente, não gosto dessas classificações" -, mas demonstrou um certo receio com as iniciativas de exterminar o conceito de bens reversíveis, defendido por várias pessoas do setor e que já até foi materializado em um projeto de lei de autoria do senador Flexa Ribeiro (PSDB/PA). Para ele, só seria possível acabar com esse conceito "se for criado outro método para garantir a continuidade dos serviços de telefonia". E qual seria esse outro método? Zerbone confessou que não sabe como algo assim poderia ser feito. "Teria que se rediscutir todo o modelo das telecomunicações", avaliou.

Os aspectos ponderados pelo novo conselheiro são muito importantes para a discussão dos bens reversíveis. E é positivo que Zerbone tenha uma visão mais tradicionalista ao avaliar o assunto. Nesse setor, nos acostumamos a achar que tudo que é moderno é bom, mas nem sempre é assim. A questão da garantia da continuidade é fundamental. É um dos pilares do modelo de telecomunicações. E é por isso que existe a figura da reversibilidade, como bem lembrou Zerbone.

Em tempos onde a "modernização" virou palavra de ordem dentro das telecomunicações, é sempre bom lembrar do que queríamos quando privatizamos a Telebrás: que a oferta de telefone fosse universal, contínua e com preço justo. Não me parece que permitir que as concessionárias assumissem milhares de bens comprados com dinheiro público e necessários para a oferta do serviço fizessem parte do plano. Quem sabe o mais jovem conselheiro da Anatel possa dar essa aulinha de história para a agência reguladora.


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